Quarta-feira, 2 de março de 2022 - 07h00
Bagé, 02.03.2022
Assassinato de
Plácido de Castro - IV
Jornal Comércio
do Amazonas, n° 1.612
Manaus, AM – Quinta-feira, 17.09.1908
Plácido
de Castro ‒ Novas Informações
‒ A Chegada do Juiz de Direito e
do Promotor Público a esta Cidade ‒ O que narram ‒ Depoimento do Irmão da
Vítima ‒ O que Dizem Cinco Testemunhas ‒
A Atitude do Juiz de Direito do Acre
A bordo da lancha “Rápido”,
chegaram ontem do Acre os Dr. João Rodrigues do Lago, Juiz de Direito da
Comarca e Barros Campello, promotor daquele Distrito Judiciário. Ambos
hospedaram-se no “Grande Hotel” onde
fomos procurá-los e pedir notícias sobre o assassinato do Coronel Plácido de
Castro. Gentilmente recebido o nosso colega entreteve com os dois magistrados
amistosa e longa palestra narrando eles em seus mínimos detalhes os
acontecimentos, de que aliás fora testemunha de vista o Dr. Campello. Disse-nos
esse cavalheiro que o Coronel Plácido, depois de ferido, não se mostrou
desanimado, pedindo instantemente ([1]) ao Dr. Caribé da
Rocha que o salvasse porque ele precisava fazer uma hecatombe no Acre, a vista
do ato covarde de que acabava de ser vítima.
Que, lamentando o fato, chamou, minutos antes de morrer, o seu irmão
Genesco e disse-lhe que antes de dar a sepultura o seu cadáver, mandasse
extrair o coração, cortasse-o em dois pedaços iguais e mandasse-os, um à sua
mãe e o outro à sua noiva residente na cidade de Petrópolis; que finalmente
liquidasse todos os seus negócios e se retirasse do Acre, fazendo, porém,
antes, todo o possível para vingar a sua morte. O Dr. Campello disse ao nosso
companheiro que, Plácido fora ferido por uma bala de Mauser, a qual penetrara
na região lombar transpassando a pleura e alojando-se no estômago, e
esvaindo-se em sangue vendo seu irmão saltar do animal, gritara: não, Genesco!
Monte de novo. Vamos no encalço do inimigo! E saíram, sem nada conseguir.
Estando, porém, Plácido muito fraco, saltou do animal, sentou-se em um pau e
juntou a cabeça sobre uma das pernas do Dr. Campello e assim se conservou até o
regresso do pajem que fora ao Seringal do Coronel Rôla buscar uma rede para
conduzi-lo. O Dr. Campello, que se acha seriamente enfermo, segue com o Dr.
Lago, no “S. Salvador” para o Rio de
Janeiro e ali entregará ao Dr. Afonso Pena uma cópia depoimento de Genesco de
Castro, bem como, em original, uma justificação processada perante o Dr. Souza
Leão, Juiz preparador, em que depuseram cinco testemunhas. Desses documentos
extraímos o que se segue:
Depoimento
de Genesco
Disse: que está convencido de que o autor da tentativa de assassinato de
seu irmão, Cel Plácido de Castro é o indivíduo Alexandrino José da Silva, atual
subdelegado de polícia do Sr. Gabino Besouro, Prefeito deste Departamento,
auxiliado pelos inúmeros bandidos que tem a seu dispor e que com eles tem
servido em todas as diligências “perigosas”,
que os últimos Prefeitos de Departamento têm entendido fazer.
Que desde a administração Jesuíno, Alexandrino declara publicamente as
suas tenções homicidas contra a pessoa ora vitimada e que todos os moradores
deste Departamento têm conhecimento deste fato. Que nos primeiros dias do mês
passado tanto o depoente como o seu irmão foram avisados que em reunião
realizada na “Empresa”, com a
presença do Sr. Prefeito fora resolvido o assassinato de Plácido de Castro para
se apoderarem de uma precatória que estava em seu poder expedida contra o
indivíduo de nome Manoel Leopoldino Pereira Leitão Cacella e para “tranquilizar a administração deste Departamento”;
– e que na mesma reunião fora resolvido o assassinato do Comerciante José Maria
Dias Pereira, contra quem o Delegado Josias Lima já praticou um atentado de
homicídio, e ainda o Dr. Juiz de Direito deste Departamento. Que a resolução
deste tríplice assassinato, com ou sem o consentimento ou a cumplicidade do
Coronel Besouro, é desde há muitos dias a convicção do depoente, tanto assim
que ousou externar ao Sr. Presidente da República em carta aberta, que lhe
dirigiu por intermédio do “Correio da
Noite”, pedindo providências, que pusesse o seu irmão a salvo do punhal dos
seus representantes aqui. Que a sua convicção se firmou com o atentado
praticado em Xapuri contra a pessoa do Dr. Sylvio Gentio de Lima, pelo
subprefeito chefiando três ou quatro gatos pingados, na noite de dezesseis de
julho findo, julgando que assaltava a pessoa de Plácido como declarou, pedindo
desculpas quando reconheceu haver se enganado.
Que ainda pelo fato de haver o indivíduo Alexandrino José da Silva, num
encontro que teve com Octávio Fontoura, no varadouro que vem da “Empresa” a “Benfica”, ao enxergar aquele senhor, puxado bala para a agulha de
uma Winchester [rifle], declarando ao reconhecer-lhe que tinha feito aquilo
porque supunha fosse o Coronel Plácido a quem pretendia matar, porque o “Coronel Gabino Besouro lhe declarara que o
Coronel Plácido pretendia assassiná-lo, bem como ao Coronel Simplício Costa,
para tomar conta do Acre”. E como nada mais disse nem lhe foi perguntado
mandou a dita autoridade encerrar este auto depois de lido e achado conforme,
que assina com o respondente. E eu, Antônio Rebello, Escrivão “ad hoc” ([2]),
o escrevi. Em tempo. Disse mais, que interrompeu o seu depoimento para
assistir o passamento do seu irmão, mas continua agora dizendo que a última
tentativa de assassinato do comerciante José Maria Dias Pereira, praticada por
força do Exército sob as ordens do Delegado Josias Lima, que uma vez já tentara
assassiná-lo; que essa hedionda tentativa, onde sucumbiu uma criança e ficou
gravemente ferido um empregado, impune como ficou, é mais uma prova da
cumplicidade do Sr. Prefeito nesta tragédia que o macula.
Que o fato do Sr. Prefeito haver negado força a este Juiz de Paz para
efetuar a prisão dos criminosos e colocar os seus soldados de prontidão e de
piquete assim que soube do assassinato de Plácido de Castro, é mais um fato que
muito depõe contra a sua pessoa e muito reforça a suposição da sua
culpabilidade; que o fato do Ten Luiz Sombra, empregado da Prefeitura, haver
dito aos Srs. Manoel Henrique de Lima e José Martins Ferreira que o Cel Plácido
não tinha sido vítima de uma emboscada, como se dizia, mas sim de “uma armadilha para anta e com uma bala podre
tão safada que nem deu para matar” é a prova mais evidente da revoltante culpabilidade
dos representantes do Poder Público deste Departamento. Que na antevéspera da
prática do crime de que se ocupa ainda o respondente levou ao conhecimento do
Prefeito uma série de fatos, que fazem crer a premeditação desse crime
conhecido e oficial, e a iminência em que estava de realizar-se e que o
Prefeito ao invés de tomar medidas para evitá-lo, parece haver acelerado a sua
execução, porque assim que seu irmão Plácido chegou à Vila Rio Branco o Sr.
Gabino Besouro mandou chamar o seu Sub-delegado Alexandrino que foi a sua
presença, mesmo bêbado, como costuma andar, e saiu dizendo que ia para fora da
Vila, onde o Prefeito lhe disse que ficaria com toda liberdade.
Em vista do exposto e de muitos outros fatos está convencido de que o
principal assassino de seu irmão é o Subdelegado Alexandrino José da Silva, com
a cumplicidade do atual Prefeito que nem ao menos se dignou disfarçar o seu
crime, tomando as cenográficas providências, que outros menos confiantes da
sua impunidade praticariam em igual circunstância. Que agora no modo de ver do
respondente resta ao Sr. Prefeito mandar quanto antes executar o assassinato
do Sr. Dr. Juiz de Direito, do comerciante Dias e do respondente, que
certamente já entrou para o rol dos que embaraçam com o trabalho “honrado” a sua nefasta administração. E
como mais não disse nem lhe foi perguntado mandou a dita autoridade encerrar
este auto, que depois de lido e achado conforme assina com o respondente. E eu,
Antônio Rebello. Escrivão “ad hoc”, o
escrevi.
Primeira
Testemunha
Antônio
da Silva Rebello
Disse: Que mais de uma vez no seu hotel 24 de janeiro, na Vila do Rio
Branco, viu e ouviu Alexandrino José da Silva declarar publicamente que mataria
o Cel Plácido de Castro, que quase sempre Alexandrino apareceria na Vila com
uns cabras reconhecidamente criminosos, entre os quais a testemunha conhece os
de nome Francisco França, apontado como assassino, Porfírio de tal, Antônio de
tal e Luiz Paula, aquele seringueiro de J. Dias e um parecido com João da Matta,
uma das pessoas que o falecido Cel Plácido pensou ser um dos que se achavam em
emboscada e os dois últimos que falqueando uma mesa do hotel da testemunha no
dia 23 de julho passado, declararam em estado de embriaguez que matariam o Cel
Plácido de Castro e qualquer “Placista”
que ali aparecesse, isto dizendo um deles, o de nome Antônio puxava a bala para
a agulha de uma carabina com a qual se achava munido; que conhece também o
sicário de nome Eugênio, tirado da cadeia por Alexandrino de quem raramente se
separava, criminoso esse de toda a confiança de Alexandrino. Que Renato de
Souza, escrivão de Alexandrino também fez muitos distúrbios no hotel da
testemunha e, em uma das vezes declarou que vendia a vida do Coronel Plácido de
Castro a quem a quisesse comprar, asserção essa que foi presenciada pelo
Tenente do Exército Nilo Guerra, que sabe, por ter ouvido em seu hotel, do
próprio Alexandrino que ele ou Plácido tinha de morrer. Que soube do Advogado
José Maria que Francisco Corrêa havia dito a este ter de morrer ou o Coronel
Plácido ou o Coronel Alexandrino. Que sabe ter o Dr. Genesco de Castro estado
com o Prefeito e feito queixa a este de Alexandrino que o andava a provocar por
diversos modos; que no dia 8 de agosto corrente o Coronel Plácido esteve a
negócio na Vila do Rio Branco onde se achava Alexandrino que se retirou poucas
horas depois da chegada do Coronel Plácido; que nesse mesmo dia à noite o
Coronel Plácido se retirava da Vila do Rio Branco para regressar a seu Seringal
“Capatará” em companhia do Promotor
Público Dr. Barros Campello, do Dr. Genesco de Castro e do Advogado José Maia.
Que no dia seguinte, às 13h00, soube em seu hotel que o Coronel Plácido
havia sido atirado de emboscada na altura do Seringal “Flor de Ouro”, onde negocia o Coronel Alexandrino; que como todos
na Vila, já esperava a emboscada de Alexandrino José da Silva e tanto assim é
que a testemunha verificou no local do crime o esconderijo onde se achavam os
assassinos, que é atrás de um grosso pau do qual sai uma pequena vereda que,
seguindo a praia do Rio, vai ter até em frente ao porto do Seringal “Flor de Ouro” onde reside Alexandrino.
Que há uns dez dias se acha Alexandrino na casa do Prefeito; que sempre que sai
à rua é disfarçadamente acompanhado de seus sequazes, atrás referidos; que não
há nenhuma dúvida na impunidade dos assassinos do Cel Plácido de Castro,
falecido a 11 do corrente e se fosse na sede da Prefeitura a testemunha não se
atreveria a depor por temer ser pelos mesmos espancado, pois o Coronel Roberto
Moraes que depôs no inquérito aberto pelo Juiz de Paz Manoel de Albuquerque
Saldon fugiu da Vila do Rio Branco onde até anteontem era procurado a fim de
levar uma surra.
Que o justificante Genesco de Castro está bem arriscado de ser
assassinado pelo mesmo Alexandrino, que gozando da proteção do Prefeito conta
com a impunidade dos crimes que tem feito. Que a testemunha serviu de escrivão
num inquérito aberto pelo Juiz de Paz referido e por isso sabe de ciência
própria que o Prefeito em ofício dirigido àquele negou força para prender os
criminosos. Que até a presente data o Dr. Gabino Besouro conserva seus soldados
armados e paisanos de piquete nos varadouros, tendo assim transformado a Vila
do Rio Branco numa Praça de Guerra.
Segunda
Testemunha
José
Alves Maia
Disse: que por mais de uma vez viu o subdelegado Alexandrino José da
Silva, conhecido da testemunha como assassino, que no ano de mil e novecentos
matou um trabalhador do Seringal “Humaitá”,
cortando o cadáver em pedaços, dizer publicamente que assassinaria o Coronel
Plácido de Castro. Que diversas vezes aparecia Alexandrino na Vila Rio Branco,
sempre acompanhado de uns cinco ou seis desordeiros, dentre os quais a
testemunha ouviu dizer haver um por nome Eugênio, que fora arrancado da cadeia
pelo subdelegado Alexandrino, e uma vez absolvido pelo júri. Que de seu primo
José Augusto Maia, coproprietário do Hotel Vinte e Quatro de Janeiro, ouviu que
Luiz de Paula e Antônio de tal, capangas do referido subdelegado, entraram em
um dos dias do mês de julho findo, no aludido hotel, e ali fizeram toda a sorte
de desordens, ficando ambos tão enfurecidos por não aparecer uma pessoa que se
dissesse amiga do Coronel Plácido, a ponto de crivar de faca uma das mesas do
estabelecimento, gritando ambos que matariam o Coronel José Plácido de Castro;
que rara vez vira Alexandrino sem ser embriagado, e assim, nesse estado, em
todas as tabernas onde entrava na Vila do Rio Branco, dizia em alto e bom tom,
que mataria o irmão do Dr. Genesco. Que na véspera da emboscada, que sofreu o
Coronel Plácido, Francisco Corrêa, casado com uma sobrinha de Alexandrino disse
a testemunha que, ou o Coronel Plácido ou Alexandrino tinha de morrer.
Que viu quando o Dr. Genesco de Castro foi se queixar ao Prefeito Gabino
Besouro, de diversas provocações feitas pelo subdelegado Alexandrino, que a
testemunha assistiu a uma dessas provocações de Alexandrino ao Dr. Genesco. Que
no dia 8 de agosto corrente chegaram a Vila do Rio Branco o Cel Plácido, onde
também se achava Alexandrino, que logo esbravejou por toda a parte matar o Cel
Plácido; que nesse mesmo dia a testemunha viu o cavalo de sela de Alexandrino
ensanguentado e soube que ele havia dado uma facada naquele animal, dizendo não
pode-lo fazer na mesma hora ao Cel Plácido. Que nesse mesmo dia 8, Alexandrino
retirou-se da Vila, declarando a todo mundo que mataria o Cel Plácido.
Que a testemunha doente, foi convidado pelo Cel Plácido a ir se
restabelecer nos seus campos denominados “Esperança”,
convite este que a testemunha aceitou, mas com a condição de não ir com o dito
Coronel, que saia da Vila na noite do mesmo dia 8, por temer assistir a uma
descarga de bala no caminho; que o Cel Plácido insistia com a testemunha para
irem juntos, alegando que o Promotor Dr. Barros Campello, também ia se tratar,
e, em face disso, a testemunha resolveu fazer a viagem juntos e partiu na noite
do aludido dia 8 de agosto indo pernoitar na Foz do “Riozinho”, onde dormiram.
Que ao amanhecer do dia 9, partiu com seus companheiros com destino ao
Capatará, para daí seguir para os Campos, seguindo na frente o Dr. Genesco, em
seguida o Coronel Plácido, logo após o Promotor, Dr. Barros Campello, e, por
último a testemunha. Que durante a viagem não se cansou de falar sobre
emboscadas, temendo a cada instante, uma descarga de balas detonadas de dentro
do mato por Alexandrino e seus sequazes; que ao passar com seus companheiros de
viagem o Igarapé “Distração”, um
pouco adiante, uma descarga de balas partiu de dentro do mato, indo dois dos
projéteis ferir mortalmente o Coronel Plácido de Castro; que nessa ocasião a
testemunha apeou do animal em que ia montado e internou-se no mato, onde se
perdeu, conseguindo somente chegar a “Benfica”,
onde se achava o ferido, uma hora depois.
Que em “Benfica” esteve até o
dia 11 de agosto, data em que faleceu o referido Coronel Plácido; que passados
sete dias da emboscada, Alexandrino e seus sequazes, com assombro do povo da
Vila, entrou cinicamente pelas ruas, indo hospedar-se no mesmo prédio onde
habita o Prefeito Dr. Gabino Besouro, que, segundo dizem é cúmplice no
assassinato do referido Coronel Plácido; e tanto isso parece ser verdade quanto
é certo que até agora não houve providência alguma para capturar os criminosos
e mais negou força ao Juiz de Paz, Manoel de Albuquerque Soldon, para prender
os delinquentes. Que desde o atentado contra o Cel Plácido, o Prefeito pôs a
Vila do Rio Branco em pé de guerra; que absolutamente não fazia o presente
depoimento na Vila do Rio Branco, pois arriscar-se-ia pelo menos a ser agredido
a golpes de espada pelos oficiais do aludido Prefeito.
Terceira
Testemunha
Tenente
do Exército, Agrimensor de Terras Públicas e Advogado, Nilo Guerra
Disse: que Alexandrino José da Silva, que tempos atrás cometera um
assassinato em Humaitá, manifestara desejos de assassinar o Cel José Plácido
de Castro, como ele próprio declarou no Hotel Vinte e Quatro de Janeiro, na
manhã de um dos últimos dias do mês passado, na presença do Capitão Antônio da
Silva Rebello, do Cel José Augusto Maia, proprietários do mesmo hotel, e da
testemunha. Que Alexandrino José da Silva andava acompanhado de indivíduos de
má nota ([3]),
dentre os quais o indivíduo Eugênio de tal, que no ano passado fora submetido a
júri, por crime de homicídio.
Que esses indivíduos, pública e notoriamente sabido, de maus costumes,
tinham como mais salientes, no desejo de assassinar o Coronel Plácido de
Castro, o de nome Renato de Souza, Escrivão do subdelegado de Polícia,
Alexandrino José da Silva, Luiz Paulo e Antônio de tal, os mesmos que no dia 23
de julho passado, em almoço no Hotel Vinte e Quatro de Janeiro, armados de faca
e rifle, desafiavam com impropérios a quem quer que se manifestasse amigo ou
partidário do Cel Plácido, sendo que o mais audacioso dos facínoras era o
referido escrivão do subdelegado, que não obstante amigo do conhecido
desordeiro Bruno Barbosa, mereceu ser este advertido.
Que ouviu dizer do Advogado José Alves Maia haver-lhe declarado Francisco
Corrêa, empregado na Prefeitura e aparentado do aludido Alexandrino, que o Cel
Plácido ou Alexandrino tinha que morrer, isso na véspera da conhecida emboscada
de “Benfica”, de que foi vítima o
mesmo Cel Plácido. Que em um dos primeiros dias do corrente mês viu o Ten
Genesco de Oliveira Castro comunicar ao Prefeito Gabino Besouro que Alexandrino
José da Silva insultara seu empregado Francisco em casa do Dr. Leorne Menescal
ameaçando-o para brigar. Que no dia 8 do corrente, estando em companhia do Cel
Plácido, viu passar Alexandrino a cavalo, alcoolizado, que vinha de conversar
com Francisco Simplício F. Costa, subprefeito do Acre e Delegado de Polícia no
Xapuri, que se achava hospedado em casa do Prefeito devendo nesse mesmo dia 8,
à tarde, partir com rumo pelo local da emboscada, que é perto de sua residência
em “Flor de Ouro”. Que o referido
Simplício é o mesmo que pretendeu assassinar, a tiros de rifle, no porto do
Xapuri, em um dos últimos dias do mês de julho, ao Cel Plácido, segundo
publicou e ficou sem contestação o n° 1 do jornal “O Estado do Acre”.
Que se publica na Vila Rio Branco; que no dia 9 de agosto, pela manhã,
foi vítima dos tiros partidos da emboscada de “Benfica”, de que faleceu no dia 11 do corrente; que dentro da lei
os indícios de que Alexandrino é o assassino de Plácido de Castro, são mais que
veementes, como poderá averiguar a polícia, no inquérito que lhe cumpre fazer,
que o indigitado ([4]) assassino
Alexandrino, com seus comparsas criminosos continuam como anteriormente, em
plena liberdade, a receber especiais considerações do Cel Gabino, Prefeito do
Departamento e do Delegado Auxiliar de Polícia Antônio João de Barros Alencar,
o mesmo que, sob o protetorado do Governo do Amazonas, cometeu um infame
assassinato de um seu companheiro de casa na Vila Floriano Peixoto, de onde
fora, pouco antes do assassinato do Coronel Plácido, chamado pelo Prefeito
Coronel Gabino para exercer a atual função de Delegado.
Que o conhecido assassino Alexandrino continua a exercer a função de
Delegado de polícia do “Riozinho” e
campeia ostensivamente pelas ruas da sede da Prefeitura, acompanhado de
conhecidos criminosos, dentre os quais o já referido Eugênio; que até o
presente a ação da polícia, só tem sido benéfica aos assassinos do Coronel
Plácido e muito perseguidora não só das testemunhas que depuseram no inquérito
feito perante o Juiz de Paz da localidade da emboscada, como dos amigos e
admiradores do Coronel Plácido, sendo que a testemunha Tenente-Coronel Roberto
Severiano de Moraes sofreu ameaças de morte, sendo obrigado, para conservação
de sua vida, a fugir da Vila Rio Branco.
Que evidentemente, com maus intuitos, está o Prefeito Coronel Gabino
Besouro, porquanto desde o meado do mês passado até o presente, tem mobilizado
Força Armada, mantida com dinheiro que lhe fora confiado para o melhoramento do
Acre, não só em desperdícios com as compras de armas e munições como com a
alimentação e pagamento exagerado de diárias para os civis desencaminhados de
seus empregos, que se acham ao seu serviço e que se com maus intuitos, é ou
não, a prova está em tudo quanto aí fica referido, prova mais que clara e
indícios mais que veementes de que o aludido Coronel Gabino, o mesmo que já se
levantara contra o poder constituído do país, o mesmo ainda que fora recusado
por sua terra natal, é o insuflador e conivente em todos os distúrbios que ora
fazem paralisar o comércio do Acre e levantar pânico em sua população. Em
aditamento, disse mais: que nos primeiros dias do corrente mês levara ao
conhecimento do Coronel Gabino Besouro, que no Hotel Vinte Quatro de Janeiro,
onde mora a testemunha, estava ele, testemunha, constantemente provocado de
morte por assassinos, companheiros de Alexandrino José da Silva, pelo simples
fato de não acompanhar nem aprovar as violências que contra o Coronel Plácido
pretendia o referido Prefeito praticar, fazendo-lhe mesmo ver que algumas
dessas provocações publicamente feitas no hotel eram presenciadas pelo Delegado
de Polícia; e que o Coronel Gabino nenhuma providência deu para cessar essas
ameaças que dia a dia mais avultaram e como ele, testemunha se sentisse sem
garantias legais retirou-se da sede da Prefeitura para se pôr a salvo aqui onde
faz este depoimento.
Quarta
Testemunha
João
Damasceno Cavalcante
Disse: que é público e notório na Villa Rio Branco, que foi o autor da
emboscada que vitimou o Cel Plácido de Castro, o cearense Alexandrino José da
Silva e seus capangas; que logo que a testemunha soube da emboscada não teve
dúvida alguma de atribuir a Alexandrino, porquanto este quando embriagado,
nunca deixou de dizer horrores do Coronel Plácido em sua ausência, jurando de,
um dia com ele, Coronel Plácido, se encontrar. Que no penúltimo domingo
Alexandrino entrou na Vila Rio Branco com seus capangas e se hospedou no mesmo
prédio onde habita o Prefeito; que a testemunha tendo de voltar para a Vila Rio
Branco, de onde se ausentou para prestar este depoimento, teme ser agredido por
ter narrado a verdade dos fatos, e por isso nada mais adianta.
Quinta
Testemunha
Bemvindo
Soares de Oliveira
Disse: que é público e notório na Vila do Rio Branco o fato de
Alexandrino José da Silva declarar que no Acre haveria de habitar ou ele ou o
Coronel Plácido. Que todas as vezes em que aparecia na Vila era sempre
acompanhado de seus capangas, entre os quais o de nome Eugênio Francisco da França
que respondeu ao júri no ano passado. Que no dia nove de julho passado, fora ao
Purus e por isso não sabe de ciência própria das desordens feitas no Hotel 24
de Janeiro, mas em chegando no dia 19 do corrente à Vila do Rio Branco; soube
que Luiz Paulo e Antônio de tal bem como Renato de Souza fizeram distúrbios
naquele estabelecimento onde gritavam que se aparecesse um amigo do Coronel
Plácido, que o matariam. Que soube do Advogado José Maia, que Francisco Corrêa,
casado com uma sobrinha de Alexandrino dissera que o Coronel Plácido ou
Alexandrino desapareceria; que em caminho de Senna Madureira para cá, soube do
assassinato do Coronel Plácido, e a propósito tem importantes revelações a
fazer.
Que João Dantas, irmão de Raymundo Dantas, arrendatário do Seringal “Bagé”, e Ângelo Dumont, ambos
encarregados das estradas de seringueiras do mesmo Seringal, encontraram-se com
a testemunha e confidencialmente narraram que Alexandrino José da Silva tinha
entregue uma carta a um preto de nome Victal, morador no Seringal “Amapá” a fim deste levá-la a Maurillo de
tal, seringueiro do “Bagé” a Raymundo
Dantas, vendo aquele preto no centro do Seringal foi ao seu encontro e fê-lo
voltar, sendo-lhe pedido pelo mesmo preto que ao menos dissesse que Alexandrino
mandara chamar Maurillo. Que este ao saber do recado disse que já sabia para
que era o recado; que ele, Alexandrino, mandara chamá-lo para perseguir o Cel
Plácido de Castro até tirar-lhe a cabeça. Que isto contando a testemunha a João
Dantas e a Ângelo, acrescentara mais que antes de qualquer pessoa saber do
assassinato do Coronel Plácido, já Maurillo narrava o acontecimento, sendo de
notar que no domingo, nove de agosto corrente, dia em que se deu a emboscada,
Maurillo não se achava em casa, e tendo dela saído montado em burro, voltou a
pé, segunda-feira, dez do corrente, indo pelo centro do Seringal “Bagé”, narrando que havia sido
assassinado o Coronel Plácido. Que João Dantas e Ângelo findaram a sua narração
dizendo que não havia dúvida de Maurillo ter tomado parte no crime, tanto mais
quanto este indivíduo vivia aos serviços infamantes de Alexandrino José da
Silva.
Que atualmente se acham morando na Vila do Rio Branco Alexandrino José da
Silva e seus sequazes; que há muito a testemunha sabia da emboscada que Alexandrino
preparava pois, tendo mandado a Manoel Nobre de Lima e Antônio Nunes seus empregados,
buscarem umas reses nos campos de “Capatará”,
em caminho, no varadouro do “Riozinho”
para “Benfica”, no Igarapé Distração,
quando aqueles seus empregados tratavam de estivar a ponte do mesmo, para dar
passagem ao gado, viram dentro do mato passarem dois homens armados que
atribuíram ser caçadores mas depois, quando procuravam paus bons de cortar,
para fazer a estiva da ponte viram Francisco França e Eugênio Francisco da
França armados de Mannlicher e um outro que não conheceram, armado de rifle. Que
os dois primeiros conversavam com Manoel Nobre e Antônio Nunes, dizendo muito
desconfiadamente que andavam a procura do varadouro que ia para a “Flor do Ouro”.
Que os empregados da testemunha acrescentaram quando narraram o fato
acima que aqueles conhecidos criminosos estavam ali de emboscada para alguém,
pois, conhecedores como eles são de todos esses varadouros era aquela história
muito mal contada. Que em face do exposto, a testemunha esteve no dia trinta
de julho passado, três dias ou quatro depois do encontro a que já se referiu,
com o Cel Plácido de Castro, em Capatará e fez-lhe ver o perigo que corria sua
vida nas emboscadas preparadas nas matas que ficam fronteiras ao Seringal “Flor de Ouro”, onde se achava
Alexandrino José da Silva. Que a autoria do crime perpetrado contra o Coronel
Plácido, não há dúvida alguma que recai na pessoa de Alexandrino, Francisco
França, Eugênio Francisco da Franca, Maurillo de tal e outros sicários às
ordens do primeiro: que a vista da impunidade dos delinquentes, que estão
descobertos, a testemunha presume ser conivente no crime o Prefeito do Departamento,
Cel Gabino Besouro. Que sabe de ciência própria que Alexandrino goza da
proteção do Prefeito, tanto assim é que não sabendo Alexandrino ler nem
escrever foi nomeado subdelegado de Polícia do “Riozinho”, cargo que ainda continua a exercer.
Quatro
Ofícios
Damos a seguir a cópia de um ofício do Juiz de Direito Dr. João Rodrigues
do Lago:
Exm°.
Sr. Cel Dr. Gabino Besouro, Digníssimo Prefeito do Alto Acre. – Levo ao
conhecimento de V. Exª que nesta data passo o exercício do cargo que ocupo ao
Dr. Procurador do 1° Termo e que me retiro da Comarca.
Assim procedo não só pela absoluta falta de garantia que existe em todo
Departamento, mas também pelas ameaças que pesam sobre a minha cabeça, ameaças
de que se fazem eco auxiliares de V. Exª, sem que encontrem da parte da polícia
repressão alguma. Não é mistério para ninguém que pessoas da intimidade de V.
Exª declaram em toda parte que do Coronel José Plácido de Castro já estavam
livres, e que agora se fazia mister o meu desaparecimento.
Diante da inércia de V. Exª eu não podia nem devia confiar em promessas
de garantias, que costuma fazer, quando vi a propriedade alheia assaltada à mão
armada, assassinadas crianças, proibido o direito de locomoção, eliminados de
emboscada cidadãos prestigiosos e tantos outros fatos que bem caracterizam a
administração de V. Exª. Sirva, pois, este meu ofício de protesto contra a
pressão que V. Exª quer exercer sobre o Poder Judiciário, não escolhendo os
meios para atingir o fins.
Saudações. – João Rodrigues do Lago. [...] (JCA, n° 1.612)
Bibliografia
JCA, N° 1.612. Plácido de Castro ‒ Novas Informações...
– Brasil – Manaus, AM – Jornal do Comércio do Amazonas – n° 1612, 17.09.1908.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
Galeria de Imagens
* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H