Quarta-feira, 13 de julho de 2022 - 10h58
Bagé, 13.07.2022
Capítulo III
O Sr. Robert Hermann Schomburgk
Vejamos agora porque alguns políticos ingleses arrogaram-se
o direito de querer usurpar-nos tamanha superfície de terra.
Um Sr. Robert Schomburgk, a quem se atribuíam muitos
conhecimentos naturalistas, talvez mesmo confundindo-o com o irmão Richard
Schomburgk, de méritos incontestáveis, desejando fazer explorações à custa de
alguém, pois, para quem não é verdadeiramente competente, essas viagens
constituem excelente emprego, repetimos, esse Sr. Robert Schomburgk, conseguiu
ser comissionado em 1834 pela “Geographical
Society of London” para que explorasse a Guiana Inglesa no alto Orinoco, o
que fez, de 1836 a 1839, publicando um folheto de sua viagem em 1840.
Entusiasmado pela beleza e pujança da natureza das regiões que atravessara e
desejando continuar tão encantador emprego, e por instigações do célebre Lord
Palmerston, engendrou um meio de, excitando o apetite inglês, aconselhá-lo a
demarcar os seus limites por Territórios riquíssimos e que deviam
pertencer-lhe.
Mr. Berthelot em um relatório que publicou sobre os
trabalhos das sociedades geográficas no ano de 1840, refere o seguinte sobre a
comissão dada a Schomburgk:
A
“Geographical Society of London” comissionou, em 1834, a Mr. R. Schomburgk para
que explorasse a Guiana Inglesa e o alto Orenoco; e o Governo Britânico,
querendo dar-lhe uma prova manifesta da confiança e estimação que inspiravam
seus trabalhos, o encarregara de fixar os limites, até hoje indecisos, entre a
Guiana Inglesa e as regiões vizinhas, afim de pôr os débeis restos da população
indígena a coberto dos ataques dos brasileiros, que não respeitando nem as leis
humanas; nem os direitos políticos das nações, não cessam de dar caça aos
infelizes para reduzi-los à escravidão.
Esse tal Mr. Berthelot fez-se eco das amabilidades com que
os ingleses costumam mimosear a todos os povos de quem pretendem usurpar
qualquer porção de terra. Só eles têm sentimentos bons!
A Grécia entretanto é o exemplo mais recente da “humanidade” inglesa, e o Sr. Gladstone ([1]) que o
diga.
O tal Schomburgk foi feliz porque conseguiu ser encarregado
pelo Governo Britânico de fixar os ditos limites em 1841. Desta vez, porém,
como a exploração era mais séria, resolveu seu irmão Richard a acompanhá-lo.
Este, também decidido amigo de explorações por estes países, vasto campo para
as suas pesquisas de hábil naturalista, por seu turno arranjou do bolso do Rei
da Prússia, os fundos necessários para acompanhar o irmão e prestar-lhe os
serviços que os seus conhecimentos deviam fornecer para o bom desempenho da
comissão do irmão Robert, que os não tinha.
De fato assim foi, e ambos sempre juntos atravessaram toda
a Guiana, Richard fazendo úteis e competentes estudos de naturalista, que
constam da sua bela obra impressa em Leipzig e Robert como um novo Jeová a
distribuir a seu talante ([2]) a Terra
de Promissão.
As linhas divisórias que traçou deslumbraram a Inglaterra,
que passou logo a adotá-las, não aceitando outra competência que a do sábio
Schomburgk, cujos “divinos” poderes
iam ao ponto de anular tratados e romper convênios sagrados e dar e tomar
Territórios a quem lhe aprouvesse. E é unicamente na opinião desse senhor, a
quem arvorou em “sábio historiador,
geógrafo e naturalista”, que se fundam as pretensões da Grã-Bretanha, e é
unicamente dele que tira o que julga argumentos justificativos de suas linhas
divisórias.
Capítulo
IV
Ainda Documentos. Autores Insuspeitos
Resumindo tudo quanto havemos dito no sentido de provar que
o Território que reclamamos jamais pertenceu aos holandeses e sim à Espanha,
que o cedeu a Portugal, de quem o herdamos, pelos Tratados já referidos de 1750
e 1777, citaremos os mais notáveis autores e documentos que à saciedade
confirmam as nossas alegações:
– Sir
Walter Raleigh assegura que os espanhóis já possuíam e ocupavam em seu tempo os rios de Barima,
Morocó e Pumaron, que seu domínio se estendia até o rio Essequibo, e que
segundo documento que encontrou em poder do Governador Don Joseph Antonio
Berrio, se havia tornado a tomar solene posse daquelas terras em nome do rei de
Espanha no dia 23 de abril de 1593;
– Juan
de Laet,·ilustre holandês, confirma as opiniões de Raleigh;.
– John
William Norie, geógrafo inglês, em sua descrição da costa da Guiana, em 1828,
diz:
A Guiana
Britânica se estende “desde o Carawine até o Essequibo”. Esta era a verdadeira
extensão da colônia ajustada entre os espanhóis e holandeses pelo Tratado de
Münster em 1648, e que “nunca, desde então, foi revogada” ([3]).
– Florentino Grillet, governador de Guiana em sua nota ao
governo, 23 de agosto de 1841, também o diz;
– La Condamine, 1743, diz:
Que a
Guiana Holandesa começa no rio Marawine “e
termina no Essequibo; ficando para a Guiana Espanhola” o país compreendido
entre o Essequibo, “onde termina a
Colônia Holandesa, e o Orenoco”.
– O “Colombian
Navigator”, em 1822, fixa esses limites no rio Essequibo;
– Rafael
María Baralt, também assim os fixa em suas obras “Resumen de la Historia de Venezuela desde el año de 1797 hasta el de
1850” e “Memoria sobre límites de
Guayana”;
– Depons,
na sua “Viagem à terra firme” ([4]),
Tomo 3°, pág. 333, designa também os limites entre as Guianas Inglesa e
Espanhola, dando-os pela costa, o cabo Nassau e pelo interior o rio Essequibo;
– O
Barão Alexander Von Humboldt em sua “Voyage
aux régions équinoxiales du Nouveau Continent: fait en 1799, 1800, 1801, 1803
et 1804”, apoiando os seus conceitos nos mapas do Essequibo e Demerara
publicados em 1798 pelo Major Buchenroeder, em seu Livro 9, cap. 26, igualmente
fixa os limites pelo Cabo Nassau pela costa e “rio Essequibo pelo interior”;
– A “Memoria” do mesmo Humboldt, sobre os
limites da Guiana Portuguesa, publicada na coleção diplomática de Schoel, é
outra afirmação;
– Nicolas
María Serrano em seu “Diccionario Universal
de la lingua castellana, sciencias y artes”, já citado, é de extrema
clareza (1756);
– Spix
e Martius, 1820, e Castelneau, em 1838, também exploraram a Guiana e seus livros
são dignos de serem lidos;
– Malte-Brun em vários pontos de
sua obra robustece as alegações brasileiras de modo irrefutável;
– O
Mapa de F. Bianconi dá como venezuelana a linha que os ingleses nos querem
tirar;
– O
Coronel Codazzi, notável geógrafo, e o próprio Michelena y Rojas, o nosso
gratuito inimigo, confirmam de modo evidente os nossos direitos;
– Dr.
R. F. Seijas, notável historiador e jurisconsulto, na sua importante obra sob
o título de “Limites Britânicos de Guiana”,
fornece larga cópia de documentos irrefutáveis a nosso favor;
– Antes destes temos os testemunhos do Padre
Antonio Caulin, “Historia Coro-graphica
Natural y Evangélica de la Nueva Andalucía Provincias de Cumaná, Guayana y
Vertientes del Orinoco”, em 1779, J. de Alcalá “Manual de Geographia”, J. M. Restrepo, mapa e “Historia da revolução de Colombia”, La Fiteau, “Conquista dos portugueses”, Padre
Gumilla e tantos outros autores, alguns dos quase já citados no correr destas
linhas, são todos unânimes em fornecer-nos força, lógica e razão às nossas
justas reclamações;
Poderá a Inglaterra contrariá-los? Poderá exibir qualquer
documento autêntico para destruir o que aqui se afirma? Não, de certo. O
próprio Governo de Demerara em seu ofício de 15 de julho de 1839, como já
vimos, confessa não existir nenhum documento que prove os limites da Guiana
Inglesa quer ao Sul, quer a Oeste.
Nossos documentos são irrefutáveis, verdadeiros, antigos,
autênticos, claros, e como tais não sujeitos a “torcedelas” ([5])
diplomáticas, hoje ridículas ante a civilização e o direito internacional
hodierno. Passando aos documentos comprobatórios das nossas reclamações, vamos
citar, em resumo, alguns deles desde os mais remotos tempos, os quais deverão
ser estudados por quem tiver que advogar os direitos do Brasil, perante o
tribunal a que for incumbido o julgamento de tão magno assunto.
1493 – (04 de maio). Bula do·Papa
Alexandre VI, em que especifica os domínios das duas Coroas, de Espanha e de
Portugal;
1494 – (07 de junho). Tratado de
Tordesilhas;
1648 – (30 de janeiro). Tratado de
Münster entre a Holanda e Espanha, referendado pelo rei Felipe IV, em Madri,
aos 3 de março desse mesmo ano;
1713 – (13 de julho). Tratado de
Utrecht, entre Felipe V de Espanha e a rainha Ana da Inglaterra;
1750 – (13 de janeiro). Tratado
entre portugueses e espanhóis;
1768 – (05 de março). Real Cédula
na qual se fixam os limites da Guiana, de acordo com as nossas alegações;
1777 – (1° de outubro). Tratado
entre Portugal e Espanha.
1778 – (11 de Março). Idem idem;
1779 – (04 de fevereiro). Instruções
da intendência de Caracas para povoar certa parte da Guiana, das quais se deduz
que o seu domínio ia só até o Essequibo. Em 1° de novembro desse mesmo ano um
comunicado de D. Felipe lnciarte confirma o que referiram as instruções acima;
1780 – Comunicados do mesmo
Inciarte, importantíssimos documentos comprobatórios do limite da Guiana pela
parte do Sul da Venezuela;
1791 – (23 de junho). Tratado entre Espanha e a Holanda
sobre desertores, chamado Tratado de Aranjuez;
1796 – Mapas e relatório enviados por D. Francisco
Requeña ao Príncipe de La Paz, nos quais reconhece o Território descoberto e
conquistado pelos portugueses;
1801 – (1° de outubro). Tratado entre França e
Inglaterra;
1814 – (13 de agosto). O Tratado pelo qual a
Inglaterra houve uma parte da Guiana holandesa;
1888 – “História
das Colônias de Essequibo, Demerara e Berbice” do holandês General P. M.
Netscher; obra de grande valor histórico e da maior insuspeição.
Além de outros inúmeros documentos que existem em nosso
favor não deixaremos de mencionar como dignos de estudo alguns mapas
manuscritos que o Barão de Humboldt assevera tê-los visto e consultado na
Biblioteca Pública de Madri. (MATTOSO, 1898)
Bibliografia:
MATTOSO,
Ernesto. Limites da República com a
Guiana Inglesa – Memória Justificativa do Direitos do Brasil – Brasil –
Manaus – Tipografia Leuzinger, 1898.
(*)
Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas,
Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira
(SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] William Ewart
Gladstone (ô 29.12.1809 / U 19.05.1898): estadista
inglês, quatro vezes Primeiro-Ministro da Grã-Bretanha, 1° de 1868 a 1874, 2°
de 1880 a 1885, 3° de 1886 a 1892 e o 3° em 1894. (Hiram Reis)
[2] Talante ou
Talante, a. m. Termo antiquado. Gosto; desejo; prazer; vontade. (DOMINGOS
VIEIRA)
[3] Estas palavras
são do erudito Dr. Seijas em sua grande obra sobre limites, ao terminar a
citação igual a que fazemos de J. W. Norie. (MATTOSO)
[4] François
Raymond Joseph de Pons: “Voyage à la partie
Orientale de la Terre-Ferme: fait Pendant Les Années 1801, 1802, 1803 et 1804” (3 Tomos, Paris, 1806), traduzido por Washington
Irving e publicado em Nova York em 1806. (Hiram Reis)
[5] Torcedelas:
sofismas; falácias; Chicanas. (Hiram Reis)
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
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Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H