Segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021 - 11h12
Bagé, 15.02.2021
Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte XXVIII
O engenheiro brasileiro J. M. da Silva Coutinho, o norte-americano A. D.
Piper, o Presidente M. C. Carneiro da Cunha, o escritor Tavares Bastos, o
geógrafo peruano M. F. Paz Soldan, o Coronel A. R. Pereira Labre, todos
anteriormente à carta de João Gabriel, assim grafaram-no, sendo que Piper e
Labre, exploradores da região ouviram-no da própria boca dos lpurinãs, nação
indígena ali residente, cujos domínios abarcavam cerca de trezentas milhas, a
montante e a jusante da barra do Acre e penetrava por este uns dez dias de
viagem em canoa.
O nome ajuntava eu, provinha do dialeto desses silvícolas que, aliás,
pronunciavam Uwákũrũ ou Uakiry, segundo o referido Labre, grande conhecedor das
gentes ameríndias do vale puruense.
E concluía eu que, não sendo Gabriel um quase analfabeto como dizia José
Carvalho, nem um meio letrado como pensava Soares Bulcão, escrevinhou Acri,
segundo explicou-me Newtel Maia, fundador do Seringal Empresa, em 1882, por ter
visto a aludida carta: ou Aqri, conforme o Dr. Francisco de Paula de Assis e
Vasconcelos, ex-interventor no Território do Acre, filho de Francisco Assis
Vasconcelos, explorador e proprietário de seringais na alta Bacia puruense,
amigo do autor da missiva ao dito Visconde de Santo Elias, o qual afirmava
haver grafado João Gabriel desta maneira, por julgá-la acertada, pois, este
velho explorador pronunciava Aquiri.
Certamente, devido a este fato, a palavra propagou-se facilmente, no
comércio e foi mais tarde aproveitada pelo governo, mas, segundo pesquisas
posteriores, apurei que o mesmo Coronel Labre, num folheto publicado, na
Província do Maranhão e datado de “Labria,
01.01.1872”, já empregava o nome “Acre”
para o Rio “Uaquiry” ou “Aquiry” dos Ipurinãs, em diversas
ocasiões, ao citá-lo como afluente do Purus, como possuidor de salitre em suas
margens, no mapa das distâncias e na Nota 2 desta mesma página, isto é, mais de
um lustro ([1]) antes da
viagem de João Gabriel de Carvalho Melo.
Destarte, base tem Moreira Pinto quando afirma,
tratando do Rio “Aquiry”, tributário
do Rio Purus – “O Tenente-Coronel Labre
deu a esse Rio o nome de Acre”. Assim, já ele existia anteriormente à
chegada de João Gabriel, reinando, apenas, confusão na maneira de grafá-lo.
Quanto ao aportamento do vapor Anajás, conduzindo João Gabriel de Carvalho
Melo, vários parentes, amigos e grande carregamento de mercadorias para povoar
o Rio Aquiri ou Acre, reinava certa confusão no tocante ao ano, assegurando
alguns, como Emílio Falcão, Avelino de Medeiros Chaves, Hugo Ribeiro Carneiro,
Soares Bulcão, A. C. Ferreira Reis e Joaquim Camelo que havia sido a
03.04.1877, e outros, como Euclides da Cunha, Aníbal Amorim, J. A. Masô,
Napoleão Ribeiro e Custódio Miguel dos Anjos que fora em 1878. Manifestei-me ao
lado dos últimos, apesar da assertiva de velhos acreanos como E. Falcão,
Avelino Chaves e Joaquim Camelo que a ouviram do próprio Alexandre de Oliveira
Lima, passageiro do Anajás, nessa viagem, parente da esposa de João Gabriel e
que ficara de posse do Seringal Boca do Acre; porque, além da responsabilidade
que tinha Euclides da Cunha, ele, como os autores, que lhe acompanharam, com
certeza também ouviram o referido Oliveira Lima, ainda existente na época em
que por ali passaram, afora outros desbravadores dos primeiros tempos.
Sendo que N. Ribeiro era o mais minucioso de todos; e Custódio, morador,
em 1877, nas proximidades de Yutanahã, adiantava que, tendo o governo
facilitado passagens grátis aos retirantes, o que se deu pelo meado do ano,
somente depois disto foi que João Gabriel mandou buscar seus parentes no Ceará,
os quais só poderiam ter chegado na barra do Acre, em princípios de 1878 e não
em abril do ano anterior quando, apenas, por esse tempo, a imprensa de
Fortaleza sugeria isso ao governo. E estava com a razão quando assim me
inclinei, tanto que lendo mais tarde periódicos e outros documentos referentes
à época, encontrei uma correspondência intitulada “Carta do Rio Purus” publicada num jornal de Manaus, na qual, entre
outras notícias, via-se a seguinte:
Os vapores João Augusto e Anajás só navegam até as cachoeiras, dez horas
de navegação acima do último ponto da escala: não indo os Comandantes adiante
por não terem autorização da Companhia: transportadas as mercadorias daí em
diante em canoa ou navios particulares sendo o último ponto povoado “São Miguel
de Anury”, distante do Acre 60 milhas, ou 12 horas de navegação, onde acaba
de chegar o vapor Teixeira Ruiz, que não seguiu até o Rio Acre, por não haver
morador algum para cima; o que, no entanto, deve acontecer em outubro, porque
para lá seguirão na lancha Colibri, diversos comerciantes.
Coube, assim, ao Teixeira Ruiz a glória de mostrar que a navegação até 60
milhas do Rio Acre era franca e sem perigo; tendo sido prático do navio Braz
Gil da Encarnação, espontânea e gratuitamente. O Teixeira Ruiz gastou 34 dias
de viagem, de 4 de abril a 08.05.1877, atracando em 82 portos.
O Rio Acre é famoso pelas suas riquezas imensas, as quais só agora estão
sendo exploradas. [Jornal do Amazonas, maio e junho de 1877] Durante este ano
tem aumentado muito a população neste Rio, conduzindo os vapores cerca de 1.200
passageiros; e o Anajás, entrado ontem do Purus, foi até o lugar S. José da
Cachoeira, onde descarregou seu importante carregamento no dia três. [Jornal do
Amazonas, julho de 1877]
Na madrugada de 12 de janeiro de 1878 ancorou, no porto de Manaus, o
vapor Anajás da Companhia do Amazonas Limitada, que subiu acima de Hyutanahã
[último ponto da linha] e foi até as barracas mais próximas ao Rio Acre;
prestando, assim, o Comandante Carepa um relevante serviço ao comércio do Alto
Purus. [Jornal do Amazonas, janeiro de 1878]
O vapor Anajás saíra de Belém do Pará, na madrugada de 06.02.1878, sob o
comando do Capitão Carepa. [Jornal do Pará, janeiro e fevereiro de 1878]
Deve ter chegado a Manaus cerca do dia 14, ou ido diretamente ao Rio
Purus, pois segundo Napoleão Ribeiro fora fretado pela firma comercial E. J.
Nunes da Silva e Cia, para levar João Gabriel com o seu pessoal e mercadorias
ao alto Purus, devendo ter chegado à Boca do Acre no fim de fevereiro ou
princípio de março, tanto que no dia 2 de março, João Gabriel já agradecia ao
Comandante Júlio Marques Carepa e aos seus distintos oficiais e ao Sr. Manuel
Gonçalves Tourinho do Pinho, delegado da casa Elias José Nunes da Silva Cia,
do Pará, a atenção e obséquios que lhe dispensaram, bem como à sua família,
durante a sua viagem ao Acre, em duas cartas publicadas no Jornal do Amazonas,
dirigida uma ao referido Comandante Carepa e a outra ao Sr. Tourinho do Pinho,
ambas datadas de “Rio Purus, 02.03.1878”,
e assinadas por João Gabriel de Carvalho Melo.
Pelo exposto, ficou demonstrado que a denominação de “Acre” para o Rio que serviu de epígrafe
a essas linhas, já existia antes da viagem de João Gabriel, em 1878, nem foi
uma consequência dessa jornada, como se pensava, a qual, indubitavelmente,
concorreu para que, bem ou mal interpretado o conteúdo da carta comunicando os
acontecimentos se o divulgasse mais rapidamente, em vista do povoamento daquela
ribeira, e do intenso comércio que se estabeleceu com as praças do Pará e
Manaus.
Pela própria correspondência trasladada acima e datada do “Rio Purus”, desde 1877, o seu autor não
fala em Rio Aquiri, e somente em Acre, e, como era regularmente redigida e
anônima, não é incabível que se atribua ao referido Antônio Rodrigues Pereira
Labre, o explorador mais inteligente, mais expedito e mais letrado da Bacia
puruense, ali residente, e o maior interessado no seu progresso, como se
depreende da sua constante atividade. (SOBRINHO, 1954)
Bibliografia
SOBRINHO, Dr. José Moreira Brandão Castello Branco. O Rio Acre –
Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Revista do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro – Volume 225 – Departamento de Imprensa Nacional, 1954.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
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