Quarta-feira, 10 de março de 2021 - 06h00
Bagé, 10.03.2021
Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte XLV
Eirunepé, AM –
Itamarati, AM II
24.01.2013 – Com. Praia Alta – Gaviãozinho
Mantivemos
nossa rotina, o dia transcorreu agradável e sem novidades. Quando nos
aproximamos do Arrombado da Volta do Coringa ([1])
a correnteza nos arrastou violentamente, forçando-nos a usar de toda perícia
para manter o controle das embarcações.
O
Arrombado diminuía em sete quilômetros nosso trajeto. Quando nos aproximamos do
Arrombado Altamira ([2]),
informei ao Marçal que era preciso ter cautela, afinal agora o atalho era de 14
km e se a declividade continuasse a mesma desde a Volta do Coringa, a
correnteza seria bem maior. Para nossa surpresa a transição foi bastante
tranquila. Aportamos na Comunidade Gaviãozinho ([3]),
por volta da 15h20, depois de remar 100 km, e acantonamos na escolinha da
Comunidade.
25.01.2013 – Com. Gaviãozinho – Cantagalo
O
dia amanheceu claro e sem nuvens, prenunciando uma canícula que incrementaria
uma maior dificuldade a um trajeto bastante longo (120 km).
Os
moradores de Gaviãozinho haviam nos informado da existência de um Furo a
pequena distância da Comunidade. Resolvemos aproveitar o atalho enquanto o
Mário percorreria o caminho normal para georeferenciar a Comunidade ali existente.
Percorremos com cautela a margem direita tentando vislumbrar o Furo do
Gaviãozinho. Embora tivéssemos confirmado com um ribeirinho, que navegava nas
proximidades, a localização do Furo, mesmo assim passamos por ele sem notá-lo.
O amável ribeirinho, verificando que ultrapassáramos a entrada do Furo, foi
até nós e nos rebocou com sua canoa até a boca do atalho. Uma grande quantidade
de toras de madeira bloqueava e camuflava seu acesso, por isso passara
despercebido. Piquei a voga e investi sobre a entrada, acabei ficando preso
sobre as toras, mas com algum esforço me liberei e adentrei no furo, o Marçal
procedeu de idêntica maneira.
As
Comunidades de Veneza e Gaviãozinho fazem a manutenção do furo que mais parece
um jardim de tão bem cuidado, livre de qualquer tipo de entulho e roçado em
ambas as margens, dentro em breve será mais um Arrombado a encurtar distâncias
para todo tipo de embarcação neste tumultuário Juruá, que se modifica
constantemente pela ação de suas próprias águas, mas que tem, sem sombra de
dúvida, como agente catalisador os ribeirinhos. Mais adiante encontramos o
Arrombado Cubiu ([4]),
moldado pela cheia de 2005, e o Arrombado Valter Buri ([5]),
criado na cheia de 2009. Graças a esses providenciais atalhos, conseguimos
chegar, com tranquilidade, à Comunidade Cantagalo ([6]),
muito bem instalada na Terra-firme.
O
Mário estava realizando os devidos contatos quando lá chegamos de maneira que Estacionamos
os caiaques junto a uma embarcação da Fundação Nacional da Saúde (FNS) depois
de remar 120 km. Após o Mário ter confirmado onde ficaríamos acantonados,
puxamos os caiaques para terra. Como de rotina cuidamos, antes de tudo, de
nossos caiaques, limpando e retirando a água e depois começamos a levar a
tralha para a casa dos professores. Entrei na casa, coloquei o material em um
dos quartos e, quando voltei para ajudar a carregar o resto do material,
verifiquei, surpreso, que o Sr. Antônio Cavalcanti de Souza e seus filhos
Elisson, Dione, Nunes e Cláudio já o haviam trazido, inclusive os pesados
corotes ([7])
de 50 litros de combustível. Desde que iniciei minhas descidas pelos imensos
caudais amazônicos, eu só presenciara tamanha solicitude em uma Comunidade
indígena chamada Prosperidade, da etnia Cocama, quando lá aportei em
14.12.2008. O pessoal da FNS estava presente na Comunidade coletando sangue e
fazendo sua análise já que três membros da Comunidade tinham sido contaminados
com o vírus da malária. À noite, toda a área foi pulverizada com o conhecido “fumacê” para combater o transmissor da
doença, o mosquito anófeles. Um dos membros da equipe da FNS apontou a falta de
equipamentos e pessoal como um dos grandes empecilhos para que se combata com mais
efetividade as endemias. Nas áreas indígenas, este combate se torna ainda mais
difícil, pois os mesmos raramente seguem o tratamento até o fim, além do que
sua alta mobilidade dificulta ou até mesmo impossibilita o acompanhamento dos
nativos infectados pelos vírus que acabam servindo de vetores da doença
transportando-a para outras Aldeias.
A
região do Cantagalo é bem agradável e se pode percorrer a Comunidade sem ficar
pisando na mistura de lama e dejetos como nas Comunidades dos Municípios de
Guajará, Ipixuna e Eirunepé. A maioria das Comunidades do Município de
Itamarati está assentada em terra firme o que contribui para uma maior
salubridade e consequentemente melhor estado de saúde e humor de seus
concidadãos. Esperando um sono reparador, deitei-me cedo. Na noite anterior, os
porcos não permitiram isso, desta feita foram os galos, talvez venha daí o nome
da Comunidade Cantagalo. Os galináceos assíncronos passaram a noite inteira
cantando como se o dia já estivesse raiando. Foi mais uma noite difícil e nada
reparadora.
26.01.2013 – Com. Cantagalo – Itamarati
Acordamos
mais tarde (06h30), o curto percurso de sessenta e poucos quilômetros poderia
ser vencido em seis horas sem grande esforço e precisávamos descansar. O dia
amanheceu claro e com muitas nuvens, marcamos as poucas Comunidades que nos
separavam de Itamarati, todas em terra firme.
Nas
proximidades de Itamarati ([8]),
avistamos os grandes morros que a caracterizam e aportamos nas instalações
portuárias construídas pelo DNIT, por volta das 13h00, depois de navegar por 63
km. Contatamos o Sgt PM Barbosa e este com a cortesia que caracteriza nossos
amigos Policiais Militares encaminhou-nos até a Pousada Itamarati, de
propriedade da Sra. Francisca Cristina Pinheiro de França e do Sr. Manuel Raimundo
Medeiros Campelo, irmão do Prefeito da Cidade.
²Total Parcial: Eirunepé ‒
Itamarati = 494,0
km
²Total Geral: Foz do Breu
‒ Itamarati = 1.777,5 km
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas,
Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] Arrombado da Volta do Coringa: 06°34’54,7” S
/ 69°00’08,0” O.
[2] Arrombado Altamira: 06°33’00,8” S /
68°54’01,0” O.
[3] Comunidade Gaviãozinho: 06°31’22,7” S /
68°48’13,3” O.
[4] Arrombado Cubiu: 06°27’31,0” S / 68°34’54,9” O.
[5] Arrombado Valter Buri: 06°28’06,5” S /
68°28’34,3” O.
[6] Comunidade Cantagalo: 06°32’10,4” S /
68°24’42,6” O.
[7] Corotes: recipientes de plástico.
[8] Itamarati: 06°26’27,5” S / 68°14’43,5” O.
Galeria de Imagens
* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
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