Quinta-feira, 18 de março de 2021 - 06h02
Bagé, 18.03.2021
Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte LI
Juruá, AM – Tefé, AM II
17.02.2013 – Estirão das Gaivotas – Tamaniquá
Dormi
mal, a expectativa era muito grande. Estava prestes a me despedir
definitivamente do Juruá, este belo, tumultuário e sinuoso amigo, encantador,
pleno de surpresas, por certo, mas que exigira de cada membro da Expedição o
limite de sua força, tenacidade, capacidade de vencer o cansaço, o calor
insuportável, o assédio constante dos insetos, o desconforto muscular e a
inalterável incerteza de encontrar um abrigo seguro e salubre ao final de cada
jornada. Para conseguirmos completar nossa próxima meta de 135 km,
precisaríamos contar com a boa vontade de São Pedro, uma determinação férrea e
torcer para que nossos músculos cansados e maltratados aguentassem mais este
supremo esforço.
Partimos
às 05h30 da manhã, imprimindo inicialmente um ritmo lento para aquecer
progressivamente nossas fibras musculares. Uma agradável garoa acariciava-nos
como querendo mostrar que São Pedro, o Santo Padroeiro do meu pago, Mestre dos
ventos e das chuvas nos prometia uma trégua neste derradeiro dia vagando pelo
Juruá. Curiosamente confirmava-se a previsão, feita na noite anterior por um dos
moradores da Comunidade que, apesar da noite muito clara e sem nuvens, afirmara
categoricamente que iria chover a manhã inteira.
Confirmamos
igualmente, no terreno, o que nos informara o Secretário Extraordinário do
Município de Juruá, José de Arribamar, o grande vazio demográfico que existia
desde o Estirão até a próxima Comunidade em condições de se buscar abrigo,
exatos 60 quilômetros. A chuva só parou por volta das 13h00 e o calor amazônico
começou a minar nossas forças. Por volta das 15h00, o Arribamar passou por nós
numa embarcação escolar e, daí em diante, fomos costurando nossas rotas já que
o dinâmico Secretário estava realizando a matrícula escolar das crianças
ribeirinhas e, para isso, precisava aportar em cada Comunidade.
Chegamos
à Foz do Juruá às 17h30 e me surpreendi com a mudança processada nos últimos 4
anos, a Com. Nova Matusalém (antiga Porto Columbiano) que ficava à margem
direita da Boca do Juruá simplesmente sumira. O Rio, que antes apontava para
Leste num percurso de 5 km até encontrar o Solimões, retificara sua rota final
rumo Norte e assoreara o antigo braço aterrando-o. Encontramos, depois,
reedificada, Nova Matusalém a cinco quilômetros à jusante da Foz.
Lazareto de Almas
É o mais original dos lazaretos – um lazareto de
almas! Ali, dizem, o recém-vindo deixa a consciência... A Ilha que existe à
Boca do Purus, perdeu o antigo nome geográfico e chama-se “Ilha da Consciência”; e
o mesmo acontece a uma outra, semelhante, na Foz do Juruá. É uma preocupação: o
homem, ao penetrar as duas portas que levam ao paraíso diabólico dos seringais,
abdica às melhores qualidades nativas e fulmina-se a si próprio, a rir, com
aquela ironia formidável. (Euclides da Cunha)
Quando
desci o Solimões, em dezembro de 2008, ainda se podia vislumbrar o que restara
da abalada Ilha da Consciência. Naquela época, ela já era uma mera sombra do
que fora no passado. Parece que a natureza resolvera definitivamente exterminar
este “lazareto de almas”, como se quisesse
varrer da memória ancestral as sandices outrora praticadas.
A
Expedição General Bellarmino Mendonça cumpriu sua missão e comemoramos, à nossa
maneira, na Foz do Juruá, a conclusão desta difícil jornada. Chegamos a
Tamaniquá, às 18h30, exaustos. O Mário já tinha feito os contatos necessários e
fomos alojados na escolinha com acesso à cozinha e ao banheiro. Os 870 km que
nos separavam de Manaus seriam percorridos com muita tranquilidade, um passeio
por águas conhecidas.
²Total Parcial: Juruá ‒ Foz no Solimões = 219,0 km
²Total Geral: Foz do Breu ‒ Foz no Solimões = 2.957,5km
18 e 19.02.2013 – Tamaniquá – RDS Mamirauá
Graças
ao Coordenador de Operações do Instituto Mamirauá, Sr. Armando Athos Rebelo de
Medeiros Filho, conseguimos autorização para pernoitar nos confortáveis Flutuantes
Novo Horizonte e Cauaçu.
Nosso
caro amigo Josivaldo Ferreira Modesto, mais conhecido como César Modesto é
agora Coordenador do Núcleo de Inovações Tecnológicas Sustentáveis. O César
havia nos apoiado incondicionalmente por ocasião de nossa Descida pelo
Solimões.
20.02.2013 – Flutuante Cauaçu – Tefé
O
General PAULO SÉRGIO Nogueira de Oliveira, Comandante da 16° Brigada de
Infantaria de Selva, Tefé, AM, montou um aparato fantástico para nossa chegada
em Tefé. Pela primeira vez desde que iniciei minhas descidas pelos amazônicos
caudais, tive uma recepção desta magnitude. Fomos acompanhados, desde a Boca do
Lago de Tefé no Solimões até o porto de Tefé, por uma escolta fluvial e, na
chegada, além dos sons marciais proporcionados pela excelente Banda de Música
da 16ª Bda Inf Sl e dos fogos de artifício, fomos recepcionados pelo Chefe do
EM Coronel Dougmar Nascimento das MERCÊS, TCel Marcelo ROJO, Comandante da 16ª
Base Logística de Selva e diversos oficiais do alto comando da 16ª Bda. Chorei
de pura emoção!
O
E/5 da Bda, Capitão Diógenes PINHEIRO Pimentel, havia agendado diversas
entrevistas na Cidade e, além delas, à noite, fui entrevistado, às 21 horas,
via celular pelos nossos fiéis amigos da AmazonSat que nos acompanham a par e
passo desde o início de nossa jornada no Acre.
O
caro Ir:. Carlos Athanásio também havia agendado uma entrevista na Rádio Luz e
Alegria de Frederico Westphalen (FW), RS, para as 19h00 (hora do Amazonas).
Nessa entrevista, lembrei que, desde que iniciei, há 13 anos uma série de
palestras sobre a Amazônia Brasileira, hoje ultrapassam a 400, esta foi a
terceira vez que não consegui segurar a emoção e as lágrimas escorreram sobre a
face enrugada deste velho guerreiro.
A
primeira foi em FW, RS, quando o Ir:. Carlos convidou-me a realizar uma
palestra para estudantes do ensino fundamental do Colégio Nossa Senhora da
Auxiliadora. Ao final do evento, as crianças vieram me abraçar, beijar e pedir
autógrafos, chorei e, ao olhar para meus irmãos maçons, que me acompanhavam,
Carlos, Deoclécio e Teixeira, vi que eles também não tinham conseguido conter
as lágrimas. Quando me perguntam por que não cobro pelas palestras, eu digo que
este é o meu pagamento – a emoção de ter transmitido algo que tenha, de alguma
forma, repercutido no coração e nas mentes das criaturas.
A
segunda foi a recepção, em Santarém, na minha descida pelo Amazonas. Meu
ex-Cadete e na época Comandante do 8° Batalhão de Engenharia de Construção
acompanhou-nos na chegada com a Balsa Rondon. Na Rondon, além dos repórteres
das diversas emissoras e jornalistas, estavam a bordo os militares do Batalhão
e seus familiares. Depois da recepção pela imprensa de Santarém no Porto
Hidroviário, fomos homenageados pelo Comandante e seus oficiais no Clube
Militar, onde recebemos uma série de brindes.
Adeus, Irmão Juruá
Concluindo
agora minha saga pelo Rio mais sinuoso do mundo, só tenho a agradecer a todos
que, de uma maneira ou outra, colaboraram para que atingíssemos nosso objetivo.
Tivemos, desde o início, o apoio fundamental do Exército Brasileiro através da
16ª Brigada de Infantaria de Selva, sediada em Tefé, AM, e seu 61° Batalhão de
Infantaria de Selva, Cruzeiro do Sul, AC; do 2° Grupamento de Engenharia,
Manaus, AM, representado pelo 5° Batalhão de Engenharia de Construção; Porto
Velho, RO, 7° Batalhão de Engenharia de Construção; Rio Branco, AC e 8°
Batalhão de Engenharia de Construção, Santarém, PA.
No
Acre e no Amazonas, fomos apoiados pelas Polícias Militares desses Estados.
Gostaríamos de agradecer particularmente ao Capitão PM Moura e Sgt PM Antônio
que nos apoiaram em Cruzeiro do Sul, AC, e Porto Valter, AC, ao Tenente PM
Rodney, em Ipixúna, AM, Tenente PM Ricardo em Eirunepé, AM, Sargento PM Barbosa
em Itamarati, AM, Tenente PM Alain em Carauari, AM, e Tenente PM Jesus no
Juruá, AM.
Além
destas Instituições, fomos assistidos pelos irmãos maçons de Eirunepé, AM, e
Carauari, AM, liderados pelos veneráveis Ir:. Francisco Djanir e Santiago,
respectivamente, pelo Sr. Armando Athos Rebelo de Medeiros Filho do Instituto
Mamirauá de Tefé, AM, e pelo empresário Abraão Cândido em Ipixúna, AM.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
Galeria de Imagens
* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
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