Terça-feira, 20 de outubro de 2020 - 11h47
Bagé, 20.10.2020
Porto Velho, RO/ Santarém, PA ‒ Parte XXXVIII
Real Forte do Príncipe da Beira - VI
Tinham os Espanhóis atiladamente ([1])
consertado suas medidas, tencionando com um armamento interceptar os socorros
que pudessem vir do Pará, e com o outro cortar aos Portugueses as comunicações
com Vila Bela. Podiam eles, abastecidos de víveres das Reduções, facilmente
manter este bloqueio enquanto que, limitada à sua própria margem, ver-se-ia a
guarnição em míngua de munições de boca e de guerra, podendo assim ser reduzida
sem se ferir um golpe. Daí a pouco, soube Azambuja ter o armamento de cima
recebido um reforço de quarenta canoas, quase todas grandes, parecendo agora
preparar-se para fazer uma demonstração contra a Praça. Inferior em número como
era a sua força, sabia ele que até nos negros podia fiar-se quanto à firmeza,
não sendo provável que os canoeiros índios do inimigo sustentassem o fogo:
nesta confiança, pois, tripulou a sua flotilha, composta de três lanchas e
quatro canoas, embarcou, meteu o Capelão a bordo, e valorosamente ofereceu
batalha aos Espanhóis.
Jogavam eles jogo mais seguro,
rejeitando, pois a arrojada oferta. Durante a ausência do Governo evadiu-se de
noite com dois índios numa canoa um covarde traficante do Pará, por nome
Joaquim de Matos, abandonando as suas mercadorias. Era certo que, se este homem
lograva efetuar a sua fuga pelo Rio abaixo, havia de representar como
desesperada a condição do Forte, a fim de desculpar-se para com os seus
credores, cujas fazendas sacrificara. Mandou-lhes, pois, Azambuja uma canoa no
encalço, não fossem as falsidades do fugitivo impedir o Governador do Pará de
mandar socorro. Também para Vila Bela mandou aviso, fazendo constar em Mato
Grosso e Goiás o seu perigo, não fossem os colonos do curso superior do Guaporé
expor-se a cair nas mãos do inimigo, aventurando-se sem escolta como tinham de
costume. O portador destes despachos tomou numa canoa pequena por sobre as
terras inundadas, entrando ao nono dia no Rio acima da estação dos Espanhóis, e
efetuando assim a sua viagem.
Elevava-se agora toda a força da
Conceição a 244 homens, entre os quais havia 24 índios do Pará, e 114 negros. A
estes nem valor, nem atividade, nem inteligência faltava, mas eram boçais ([2])
pela maior parte, e por isso pouco exercitados ainda para servirem como
soldados, sobre achar-se então doente um sexto do número total. Fossem quais
fossem os seus sentimentos debaixo destas circunstâncias desanimadoras, não
mostrava Azambuja senão confiança, comunicando-a à sua gente. Vendo que
requeriam os reparos da estacada mais tempo e trabalho do que era possível
aplicar-lhes, disse aos soldados que a deixassem como estava, que não careciam
de fortificações os Portugueses, enquanto tivessem armas nas mãos. Tinham as
águas atingido agora a sua maior altura, sufocava o calor, e intolerável era a
praga dos insetos. Aqui e ali somente, de um e de outro lado do Rio aparecia
alguma eminenciazinha, surgindo das águas qual Ilha.
Destas havia
uma da banda dos Portugueses defronte da Barra do Itonamas e do Porto, em que
estava surta ([3]) a flotilha espanhola.
Cobriam-na árvores em parte e a Azambuja pareceu possível levantar ali
trincheiras, de onde fizesse jogar contra o inimigo alguma artilharia. Com
grande dificuldade e algum perigo se alcançou o sítio, vadeando através de
matas inundadas, mas ao principiar-se a cavar logo brotava água debaixo da
enxada, sendo forçoso desistir da empresa.
Neste tentame ([4])
de necessidade haviam de ser descobertos os Portugueses, podendo ter sido
seriamente molestados se da parte do inimigo houvesse ao menor a vulgar ([5])
vigilância, e com isto lhes cresceu a confiança, vendo a negligência dos
Espanhóis, e a sua inatividade, depois dos grandes esforços que se deviam ter
feito para reunir tão grande força. Veio ainda animá-los mais a chegada de nove
camaradas, que tinham sido feitos prisioneiros, uns por ocasião da caçada, outros
descendo o Rio, ignorantes do que se passava. Tinham-nos tratado mais como
malfeitores do que como prisioneiros, e depois de retidos por algum tempo com
cordas ao pescoço, e aos pés e mãos, enviados para S. Maria Madalena em duas
canoas, sob a guarda de dois Espanhóis e trinta índios, conseguindo os
Portugueses porém uma noite pelo caminho desamarrar as cordas, tomadas as armas
da escolta, a haviam posto em fuga, e voltado ao Forte. (SOUTHEY)
Tendo em vista a
enorme superioridade numérica dos castelhanos, Rolim de Moura optou por uma
Guerra de Movimento realizando ataques-relâmpago com o claro objetivo de
inquietar e deixar as tropas espanholas sem víveres necessários para a
subsistência.
No dia 05.05.1763,
determinou ao Tenente de Dragões Francisco Xavier Tejo, acompanhado de 10
soldados, um aventureiro, três pedestres, oito nativos e 17 remeiro-defensores
escravizados que realizasse um golpe de mão na missão de São Miguel, a mais
próxima das missões envolvidas no conflito e situada na retaguarda espanhola,
às margens no Rio Baurés, afluente da margem esquerda do Rio Guaporé.
A patrulha parte, no dia 06.05.1763,
em uma canoa de guerra, uma igarité ([6]) e três
canoinhas. Na madrugada do dia 08.05.1763, atacaram a Missão de São Miguel,
atearam fogo nas casas e armazéns, saquearam, apreenderam duas canoas de
mantimentos que seriam enviadas ao Itonamas, aprisionaram os Padres Francisco
Espino e João Roiz, e os conduziram ao Forte de Conceição.
No solo impidió cosechar esta mies, sino que
también perturbó otras varias reducciones adyacentes, de la otra parte del río,
es decir en territorio del rey de España, de manera que durante muchos días nos
vimos forzados por temor a alguna incursión – a abandonar la reducción, huir a
los bosques con nuestros indios y vivir allí en la intemperie. En la reducción
mas cercana a ellos demostraron sus propósitos sobre las restantes: estaba
dedicada a San Miguel y el mismo día de su festividad, en el momento de ir a
comenzar a misa, la redujeron a cenizas, sin excluir el templo, llevándose como
cautivos a sus misioneros y a todos los indios; no dejaron libre a uno de los
Padre [pues el otro falleció en La cárcel, como efecto de los infortunios y del
hambre] hasta al cabo de un año. (EDER)
No dia 15.05.1763,
Rolim de Moura, seguindo a estratégia adotada, realizou uma emboscada que
resultou na morte de 11 castelhanos e 3 nativos. Os luso-brasileiros mantiveram
a iniciativa dos combates atacando pequenas frações castelhanas. A 22.06.1763,
os reforços solicitados a Vila Bela, em 19.04.1763, chegaram ao Forte Nossa
Senhora da Conceição. Entre o pedido de reforços e sua chegada ao Forte
decorreram pouco mais de dois meses.
O
reforço de Vila Bela, de cerca de 230 homens, chegou a 22.06.1763, e foi
organizado, em grande parte, pelos moradores de Cuiabá. De Vila Bela seguiram
Bento Dias Botelho, João Raposo da Fonseca, Sebastião Pinheiro Raposo, filho do
brigadeiro Antônio de Almeida Lara e o Padre José Manoel Leite; e de Cuiabá,
Antônio de Pinho Azevedo, Vicente Rebello Leite, Ignácio Maciel Tourinho,
Joaquim Lopes Poupino, Miguel José Rodrigues e Antônio Pereira, com uma
companhia de índios mansos e outra de agregados de José Paes Falcão. (FILHO)
Cem homens, comandados por Manoel da
Ponte Pedreira, Ajudante de Ordens do Capitão General, no dia 26.06.1763,
marcham para a Barra do Itonamas. A Companhia de Negros portava machadinhas que
foram usadas para abrir caminho na mata e seriam empregadas a derrubar as
paliçadas espanholas. Como manobra de cobertura, foram empregadas duas frotas de
canoas, a de jusante comandada por Rolim de Moura, e a de montante, mais
numerosa, comandada pelo Tenente Francisco Xavier que aportou à frente do
acampamento espanhol simulando um ataque frontal. O ataque teve o sucesso
almejado graças ao fator surpresa, mobilidade, simulação de ataque fluvial e
retirada rápida. Os espanhóis confiando demais na sua superioridade bélica e
numérica não guarneceram adequadamente suas posições defensivas nem
providenciaram patrulhas noturnas.
Com o seu exemplo, parece Azambuja
ter infundido em todos os ramos do seu Governo, vigor raras vezes manifestado
no Brasil. Apenas o Capitão-mor de Vila Bela, João da Cruz, soube do perigo que
o Governador corria, logo envidou todos os esforços para aprestar reforços.
Acima do Itonamas, se estabeleceu um Posto, onde podiam ser recebidos os
suprimentos, e de onde podiam os Portugueses operar ofensivamente contra os
seus desleixados contrários. Daqui fizeram uma correria contra a Redução de S.
Miguel, que tinha sido removida da margem direita, e continha oitocentos
vizinhos. Foi tomada, saqueada e queimada a Aldeia. Alcançaram as chamas a
Igreja, que os conquistadores queriam preservar do incêndio, não podendo, porém
conseguir, salvaram as coisas sagradas, transportando-as com a imagem do Arcanjo
para o seu posto avançado, que daí se ficou chamando Pouso de S. Miguel.
Apoderaram-se de fornecimentos destinados ao exército de Itonamas, fazendo
também boa presa em açúcar, e outros objetos fabricados pelos neófitos. Os
Jesuítas foram levados para a Conceição, a fim de serem trocados pelos
prisioneiros que ainda estavam em poder, mas tendo eles sido remetidos para
Chuquisaca, foram os Padres enviados para o Rio de Janeiro por via de Vila Bela
e Cuiabá.
Mantiveram-se
os Portugueses na posse do território retirado dos de S. Miguel, que abundava
em bois, cavalos e porcos, de modo que se viam agora bem abastecidos de
víveres, sendo tão grande o terror incutido por esta incursão, que a redução de
S. Martinho voluntariamente se lhes submeteu. Em fins de junho, uns três meses
depois do aparecimento do inimigo, chegou de Vila Bela um grande reforço de
vinte e oito canoas, vindo nelas também alguns sertanejos, práticos do País das
Missões, excelentes atiradores e ótimos guias. Assim reforçado, aventurou-se
Azambuja a acometer os Espanhóis no seu campo, passando por detrás de um
espesso matagal e a volta de um Lago, para cair-lhes em cima pela retaguarda,
enquanto a sua flotilha procurava atrair-lhes a atenção para outro lado.
Era por demais forte a estacada,
mas a ousadia do ataque, posto que infrutífera, desanimou o inimigo, cujos
planos de operações tinham sido inteiramente frustrados pela atividade dos
Portugueses, estabelecendo-se no Pouso de S. Miguel. Retiraram-se, pois os
Espanhóis da sua estação para a nova Redução de S. Rosa, não tardando também a
ser levantado o acampamento do Mamoré, até que voltando todos a S. Cruz,
terminaram as hostilidades. Retiraram-se então também os Portugueses da margem
esquerda. Entretanto se celebrara a Paz de Paris, estipulando-se que se alguma
coisa mudada houvesse nestas colônias, se reporia tudo no antigo pé em que
estava antes da guerra, conforme os tratados então existentes e agora
renovados. Ratificaram esta estipulação as cortes de Madrid e Lisboa. (SOUTHEY)
(Continua...)
Bibliografia
EDER, Francisco Javier. Breve
Descripción de las Reducciones de Mojos (1772) – Bolívia – Cochabamba –
Historia Boliviana, 1985.
FILHO, Virgílio Corrêa. As
Raias de Matto Grosso – Brasil – São Paulo, SP – Volume IV – Fronteira
Occidental – Seção de Obras d’O Estado de São Paulo, 1925.
SOUTHEY, Robert. História
do Brasil ‒ Brasil ‒ São Paulo, SP ‒ Editora Melhoramentos, 1977.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
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Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
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Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H