Segunda-feira, 20 de abril de 2015 - 16h18
Hiram Reis e Silva (*), Porto Alegre, RS, 17 de abril de 2015
Soneto do amigo
(Vinicius de Moraes)
Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.
É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.
Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano
O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...
Partiu para o Oriente Eterno meu caríssimo Amigo e Mestre José Holanda. Por uma destas estranhas, misteriosas e curiosas coincidências engendradas pelo Grande Arquiteto do Universo e que Carl Gustav Jung denominava de “sincronicidade”, no mesmo dia e mês do nascimento, de meu pai e meu herói. Desde que tive a honra e o privilégio de conhecer o José Holanda, nossas rotas, apesar da distância física que nos separava, vinham se entrelaçando constantemente e nos comunicávamos, sem falta, nas datas mais importantes do calendário, havia um respeito e uma admiração mútua que nos unia.
Sua biografia é um exemplo de luta e determinação de um homem que jamais se conformou, nunca se acomodou e que, graças a isso, conseguiu que sua família viesse a desfrutar uma vida mais confortável. É um privilégio poder dizer que fui e serei sempre seu Amigo, mesmo que estejamos agora ocupando planos divinos distintos, o Zé foi e será sempre um de meus mais queridos Mestres. Listo algumas das felizes passagens, relatadas nos meus livros, que tiveram o José Holanda como protagonista.
Descendo o Rio Amazonas I (2010/2011)
28.12.2010 (terça-feira) – Itacoatiara, AM
Depois do almoço, recebemos a visita do Senhor José Holanda que subiu a bordo perguntando em alto e bom tom:
– Aonde está o atleta?
Depois das devidas apresentações, o Zé, gentilmente, convidou-nos para conhecer sua fazenda, localizada na Foz do Madeira, no dia seguinte.
29.12.2010 (quarta-feira) – Itacoatiara, AM
À tarde, visitamos a fazenda de Búfalos do senhor José Holanda na Foz do Rio Madeira.
Descendo o Rio Madeira (2011/2012)
25.12.2011 (quarta-feira) – Humaitá, AM
Novamente minha rota se entrelaça com a do amigo José Holanda, de Itacoatiara, AM. No Porto do Caçote, ancorado no Flutuante Vovó Abigail, se encontrava sua lancha “Rosa Holanda” e sua simpática tripulação, Comandante Elizeu dos Santos Gonçalves, Marinheiro Fluvial de Convés (MFC) e o maquinista Khryslley Márcio Fonseca de Souza, Marinheiro Fluvial de Máquinas (MFM). Os marinheiros do Zé nos informaram que ele estaria nos esperando, a partir das 11h00, do dia 16 de janeiro, na sua fazenda com um churrasco.
16.01.2012 (segunda-feira) – Rumo à Fazenda do Sr. José Holanda
Havia prometido ao grande Amigo e Mestre José Holanda que chegaria à sua Fazenda, a 78 km de distância, exatamente às onze horas e, para isso, precisava manter uma média de 13,8 km/h, um ritmo bastante forte para o final dessa 1ª Etapa da 4ª Fase do Projeto Desafiando o Rio-Mar.
Acordei às 04h45 e fui direto para o Porto. Às 05h30 partimos, eu e o Soldado Marçal Washington Barbosa Santos (Cozinheiro do B/M Piquiatuba), embarcado no caiaque “indomável” de propriedade do José Holanda. A correnteza forte, a ausência de troncos, as nuvens encobrindo o sol causticante, tudo conspirava para que atingíssemos nosso objetivo no tempo estipulado. O Marçal resolveu deixar o João Paulo remar comigo os últimos quinze quilômetros. Uma esperada garoa começou a cair refrescando nossos corpos, o Grande Arquiteto, por intermédio de São Pedro, resolvera dar uma “forcinha” para que atingíssemos nosso objetivo com mais tranquilidade ainda. Chegamos às 11h01, um minuto além do programado para o tão esperado churrasco. O Mestre Holanda fora abastecer sua lancha e chegou logo em seguida. Degustamos uns saborosos jaraquis e carne de porco assados enquanto ouvíamos atentamente as histórias de sua vida.
O Mestre perguntou a meu filho se ele estava satisfeito com o caiaque que ele emprestara e, como ele respondesse afirmativamente ganhou o caiaque de presente.
28.01.2012 (terça-feira) – Partida de Mauari
Em contrapartida, o Mestre José Holanda, com sua fidalguia peculiar, deixou-nos seu carro à disposição e tive que reaprender a dirigir utilizando os recursos da direção hidramática do sofisticado veículo. Confesso que é muito mais fácil nos adaptarmos ao conforto e às coisas boas do que à carência e às dificuldades. Graças a isso, conseguimos visitar os prédios históricos da Cidade e fotografá-los.
29.01.2012 (quarta-feira) – Itacoatiara, AM
No domingo, Holanda nos proporcionou um belo almoço no Restaurante Panorama, de sua sobrinha, e à tarde concedeu, no Piquiatuba, uma entrevista, acompanhado de seu neto, contando sua origem e sua história de vida que, oportunamente, reproduziremos.
Descendo o Rio Juruá (2012/2013)
18.12.2012 (terça-feira) – Partida para Foz do São João
Acordamos cedo e partimos às sete horas. O Angonese, ainda um neófito na canoagem, demonstrou uma coragem e uma determinação invulgar na condução do caiaque “indomável” doado pelo Amigo José Holanda.
Grande Mestre José Holanda
Descendente de cearenses que se estabeleceram nas proximidades de sua atual propriedade, possui a determinação e a vontade férrea dos sertanejos cuja têmpera foi forjada no Sol causticante da caatinga.
Com treze filhos e mais de 30 netos, Holanda encanta a todos com sua fala mansa, seu carisma contagiante e a riqueza ímpar de suas experiências em suas mais de sete décadas de vida na região. Alfabetizado tardiamente pelo antigo MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), recuperou o tempo perdido lendo autores consagrados, dentre eles Ernest Hemingway.
O deslocamento até a fazenda de Holanda, na Foz do Rio Madeira, foi realizado numa lancha rápida por ele mesmo projetada, com motor Suzuki de 300hp.
Holanda comentou que o abigeato é comum na região e que em determinada ocasião um comerciante local, seu vizinho e proprietário de um comércio instalado em um flutuante, surrupiou-lhe seis cabeças de gado. Conhecendo o responsável pela autoria do roubo, ele se dirigiu, com a tranquilidade que lhe é peculiar, ao estabelecimento comercial do mesmo e fez uma compra considerável de combustível e de gêneros bem superior ao preço dos seis bois levados pelo inescrupuloso mercador.
Determinou que a embarcação carregada se afastasse e ficou com uma lancha rápida para lhe facilitar uma emergencial evacuação. Chamou o comerciante meliante para uma mesa e disse que precisava conversar com ele. Olhando fixamente nos olhos do ladrão disse que o pagamento do material que ele havia acabado de adquirir deveria ser abatido do preço dos bois roubados. Quando o malandro se esticou para pegar uma arma por traz do balcão, Holanda mostrou-lhe a Calibre 12 engatilhada e destravada e saiu sem ser incomodado pelo covarde trapaceiro.
Fonte:
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM - RS);
Sócio Correspondente da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER)
Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS);
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com;
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