Domingo, 17 de maio de 2009 - 22h21
“O Cel. Rondon tem, como homem, todas as virtudes de um sacerdote, é um puritano de uma perfeição inimaginável na época moderna; e, como profissional, é tamanho cientista, tão grande é o seu conjunto de conhecimentos, que se pode considerar um sábio. Quanto mais eu o conhecia e o estudava, em meio da contemplação da grandeza do Brasil, mais me firmava na idéia de que essa grandeza não era maior do que a do filho ilustre desse recanto prodigioso da Natureza”.
(Theodore Roosevelt)
Falar de Rondon é abusar dos adjetivos, é falar no superlativo. Encontramos na obra de Esther de Viveiros um relato pessoal que não nos cabe, como cronista, nada acrescentar. Apresentamos ao leitor brasileiro a vivencia contagiante de brasilidade de um ícone tão magnífico que a própria história resolveu materializar sua grandeza emprestando seu nome a um estado brasileiro - Rondônia. Este artigo mostra sua participação no movimento republicano.
- Libertação dos Escravos
“Tive a honra de participar de dois movimentos cívicos que, logicamente, se encadeiam: a lei áurea (libertação dos escravos) e a proclamação da República.
O ano de 1888 foi intensa preocupação social, reflexo da grande crise que abalara a França. Lá, movimento negativo, conduzido pela metafísica - fase iniciada em fins do século XIV - oscilava entre a escola filosófica de Voltaire e a escola política de Rousseau, proclamando uma a liberdade, pretendendo outra a igualdade, incapazes ambas de construir.
Mas no trinômio lendário da Revolução Francesa - ‘liberdade, igualdade, fraternidade’ - representava esta a parte construtiva, constituindo todo o programa de reorganização so¬cial. Sustentada pelos Enciclopedistas, com Diderot, Hume, d' Alembert, Condorcet, era defendida por Danton. A esta escola se ligaram os ardorosos moços da Escola Militar, orientados pelo Tenente Coronel Benjamin Constant Botelho de Magalhães, o Mestre amado. Por ele esclarecidos, compreenderam que o caos tremendo, em que as cabeças de um Lavoisier e de um Condorcet tinham sido lançadas, sem hesitação, como alimento ao novo Moloch, não representava de modo algum as fraternais aspirações dos Enciclopedistas. Não mais confundiram os esforços construtores de Danton, Hoche, Carnot, com a fúria assassina e os processos sanguinários de Robespierre. Embeberam-se na essência regeneradora daquela explosão, cujos reflexos iluminavam novos horizontes. E foram abolicionistas e foram republicanos. Já era antigo o anseio de libertar os escravos. Mesmo antes do grande José Bonifácio, os conspiradores da ‘Inconfidência’, em 1789, os patriotas revolucionários pernambucanos de 1817 e os chefes de outros movimentos republicanos projetavam suprimir a escravidão, caso fossem vitoriosos.
Por outro lado, a nacionalidade se viera formando e aspirava à independência sob a forma republicana: fora o patriota Bernardo Vieira de Meio, em 1710 (guerra dos Mascates), os conspiradores mineiros de 1789, as grandes revoluções de 1817 e 1824, a guerra civil dos Farrapos, no Rio Grande do Sul, além de outros movimentos de menor gravidade. Desde 1870, era a propaganda republicana feita com mais firmeza, formando-se clubes, combatendo-se a monarquia pelos jornais, em reuniões cívicas.
Os oficiais quase não permaneciam mais na Escola, empenhados em conferências políticas, sobretudo nas de Silva Jardim. Advertiu-os o Comandante da Escola de que se deveriam abster de comparecer a essas conferências. - Pelo menos, acrescentou, não o fizessem fardados. É inútil dizer que eu me entregara de corpo e alma a essas aspirações renovadoras. Ao ouvir a advertência do Comandante, levantei-me e declarei:
- Não posso ir a parte alguma sem ser fardado; o Senhor Comandante fará o que julgar de seu dever.
Principiou o Governo a se preocupar, sobretudo com o efeito dessa atitude dos oficiais no ânimo dos alunos. Daí a reorganização a que me referi: na Escola Militar da Praia Vermelha continuaram os cadetes e passou a funcionar a Escola Superior de Guerra, para os oficiais, no edifício do antigo Arquivo Militar, defronte do quartel do 2° Regimento de Artilharia a Cavalo, à Av. Pedro II, depois Pedro Ivo. Aí estudava eu alemão e matemática superior - cálculo das funções, mas o estudo caminhava paralelamente às preocupações sociais, ao entusiasmo com que prometera dar a vida pela organização de uma sociedade melhor, mais fraterna. A questão militar viria agravar a efervescência, questão esta, em parte, conseqüência do erro político da monarquia de manter a escravidão, deixando que o movimento abolicionista se fizesse à revelia do Governo, apesar do magistral projeto de José Bonifácio, concebido desde 1823, segundo o qual o tráfico seria extinto dentro de 4 a 5 anos, abolindo-se gradualmente o cativeiro.
No regime antigo, em que a civilização era militar, compunha-se a sociedade de vencedores e vencidos, praticamente, de soldados e escravos. A estes cabiam as funções industriais, àqueles a profissão da guerra. As lutas quotidianas punham em evidência a superioridade dos chefes, dando-lhes inexcedível prestígio sobre as tropas que os seguiam como prediletos da vitória. A partilha do perigo e das privações, a ansiedade com que, temeràriamente, buscavam as posições mais arriscadas, a imperturbabilidade com que arrostavam as mais duras provações, acendiam no ânimo dos soldados verdadeiro entusiasmo pelos seus chefes. A estes, por outro lado, a convicção de que eram seres superiores, de origem sobre-humana, pelo direito divino, a veneração extrema de que se viam cercados, davam uma dignidade de que debalde se procuraria hoje equivalente. Tudo concorria, pois, para a mais completa obediência dos subordinados, base de perfeita disciplina. Tal regime, porém, se foi diluindo e acabou por se esgotar em fins do século XIII, quando se iniciou a longa transição revolucionária que se agravava dia a dia, buscando, desordenadamente embora, atingir o regime pacífico-industrial.
Era o Imperador, pela sua origem, um chefe militar - nunca, porém, pelas suas tendências. A índole simpática do povo brasileiro, que leva os 'próprios militares a se subordinarem à influência da opinião civil, garantiu-lhe a obediência de oficiais saídos de classes imbuídas de constitucionalismo e ligadas ao trono por interesses diversos. A disciplina foi fácil, também, por ser diminuta a força armada de terra e mar, até à guerra do Paraguai. Passaram então as solicitudes para com o Exército e a Marinha a preponderar no Governo, pelo fato do príncipe consorte ter chefiado o desfecho da Guerra. Assim, o desenvolvimento do espírito militar depois desta e, paralelamente, a evolução de sentimentos e opiniões, que se vinha processando, desde Tiradentes, tornaram precária a obediência ao Imperador e a direção política foi saindo das mãos dos civis para as das corporações militares.
O dissídio se alargava. Em 1888, enviou o General Manoel Deodoro da Fonseca uma representação à Princesa, para que não obrigasse o Exército a colaborar na captura dos escravos. Estava assim feita, de fato, a abolição, certos os fugitivos de que ficariam impunes, uma vez que o Exército não mais colaboraria nas batidas para os capturar. Não tendo a Monarquia mais força para manter a escravidão, a abolição se fez ‘porque a Nação o quis e assim o quis’ disse João Alfredo, o autor da ‘lei áurea’. A fraqueza da Monarquia não decorreu, pois, da abolição e, sim esta é que proveio daquela.
Eis um trecho da representação que o General Manoel Deodoro da Fonseca enviou à Princesa: ‘diante de homens que fogem calmos, sem ruído, mais tranqüilamente que o gado que se dispersa pelos campos, evitando tanto a escravidão como a luta, e dando, ao atravessar cidades inermes, exemplo de moralidade cujo esquecimento tem feito muitas vezes a desonra dos exércitos mais civilizados, o exército brasileiro espera que o Governo Imperial lhe concederá o que respeitosamente pede, em nome da honra da própria bandeira que defende’.
Como castigo, e para o afastar da Capital, pelas suas atitudes nas questões militares, foi Deodoro, embora amigo pessoal da Família Imperial, destacado para Corumbá, como Comandante das Armas e das forças de observação na fronteira com a Bolívia”. (Viveiros)
- Tenente Coronel Benjamin Constant
“Em começo de 1889 retirava-se ele, com suas forças, para o Rio. Exultou a Escola Militar, projetando, desde logo, estrondosa manifestação - mas o Governo Imperial proibiu que os alunos o fossem receber. Submeteram-se eles, aparentemente, conservando-se na Escola, encerrados pelos seus altos muros e pelos seus portões trancados. Entretanto, na noite que precedia a chegada de Deodoro, saltaram os muros, por meio de grandes escadas, obtidas sob as vistas complacentes dos oficiais de serviço. E, fardados solenemente, foram recebê-lo com todas as honras.
No dia seguinte, o corpo de alunos formava e o comandante da Escola lhes passava revista, ao mesmo tempo que os interrogava, para abertura de rigoroso inquérito. Ao chegar junto ao Alferes-aluno Euclides da Cunha, exprobrou-lhe àsperamente o Ministro Tomás Coelho, também presente, o não estar ele na forma, ao que respondeu Euclides da Cunha quebrando a espada e declarando que deixava de pertencer à Escola. Preso imediatamente, foi destituído do posto de Alferes-aluno - mas nada foi possível fazer contra a Escola, uma vez que houvera unanimidade na atitude tomada. Viu-se, assim, o Governo Imperial forçado a ‘não tomar conhecimento do sucedido’. Quanto a Euclides da Cunha, foi reintegrado por Benjamin Constant, ao ser proclamada a República, a pedido de todos os seus colegas.
Feita a abolição, repontou, como transformação iminente, a República. Não ocultava Benjamin Constant suas convicções republicanas, ao contrário, expunha-as. Convencido pelos ensinamentos de Augusto Comte, transmitidos, principalmente, por Miguel Lemos e Teixeira Mendes - de que a sociedade e o homem, tal como o mundo, obedecem a leis naturais, compreendeu que a reforma das instituições deveria ser precedida pela regeneração de opinião e costumes. Decidiu empregar todo o esforço para poupar à Pátria perturbações e desordens, para transformar uma revolução, que vinha de longe e nada poderia conter, em evolução - ensinando. Foi da cátedra que espalhou as sementes de idealismo que frutificariam a 15 de novembro. A Escola Militar da Praia Vermelha e a Escola Superior de Guerra formaram, de modo decisivo, em torno do idolatrado Mestre. Por ocasião do banquete que a Escola Militar da Praia Vermelha ofereceu à oficialidade chilena do navio de guerra ‘Almirante Cochrane’, foi o discurso de Benjamin Constant, pronunciado na presença do Ministro da Guerra, verdadeira profissão de fé. O Mestre não foi preso e os alunos fizeram-lhe espontânea e entusiástica manifestação, não permitindo que soldados, e sim eles próprios, remassem no escaler que o conduziria para a Praia de Botafogo - faziam os Lentes o trajeto, entre aquela praia e a Escola, naquela época, por mar.
Firmaram-se pactos de sangue! Compromissos cheios de ardentes protestos de o acompanharem até no terreno da resistência armada: ‘Mestre, não são arroubos de mocidade, nem tão pouco explosões de entusiasmo extemporâneos os motivos que nos guiam no passo que hoje damos, não são flores que vos trazemos, nem o aplauso, embora merecido, pelo ato que ainda ontem praticastes, quando, no meio do júbilo que nos invadia, ao recebermos a visita dos bravos filhos da grandiosa República do Chile, com a vossa palavra clara, que esmaga gigantes, mostráveis a um dos Ministros da Coroa que ainda há muita dignidade no exército.
Não vimos também vos trazer alento, porque os titãs não se cansam. Vimos apenas dizer-vos, Mestre e grande Amigo, que, nos dias desgraçados que atravessa nossa Pátria, ai deles, os que já estão procedendo à partilha do segundo reinado, se ousarem tocar naquele onde se guardam puras todas as nossas esperanças, urna preciosa que encerra o que pode haver de mais caro e de mais grandioso’. Era grande a apreensão pelo terceiro reinado, em mãos de um príncipe estrangeiro. ‘Mestre, sede nosso guia em busca da Terra da Promissão – o solo da Liberdade!’
No dia 9 de novembro, realizava-se na ilha Fiscal um baile oferecido aos chilenos. Com alguns companheiros, assisti à chegada da Princesa. Dirigimo-nos então para uma sessão no Clube Militar, deliberadamente marcada para esse dia e hora e que só deveria ser iniciada depois de terem todos os convidados seguido para a Ilha Fiscal. Foi essa a célebre sessão do Clube Militar que decidiu da sorte da Monarquia, sessão presidida pelo Tenente Coronel Dr. Benjamin Constant B. de Magalhães, por se achar enfermo o Presidente, General Deodoro”. (Viveiros)
- Adesão de Deodoro
(...) “O obstáculo a vencer era a dedicação de Deodoro ao Imperador, a quem muito admirava. Cuidava em derrubar o Ministério Ouro Preto, apenas. Sem aprofundar a situação até o âmago, só via nas dificuldades do momento a questão militar que o não levava além de uma mudança de Ministério. Finalmente, assediado pela insistência de Benjamin Constant, acabou por declarar:
- Pois seja! Já que você assim o quer”. (Viveiros)
- Urgia precipitar a explosão
“Foram procurados todos os republicanos, entre eles Aristides Lobo, Quintino Bocaiúva, Glicério, etc. Tentou-se aproximação com Floriano. Rui Barbosa só entrou em contato com os revolucionários na antevéspera da proclamação da República. Estava muito adiantada a organização do movimento que deveria rebentar em breve. Mas, o Coronel Solon, do 1° Regimento de Cavalaria, verificou que o Governo acabava de ter denúncia do que se passava e que, a qualquer momento, poderiam ser todos presos. Urgia precipitar a explosão. A 14 de novembro, muito cedo, foi ele comunicar a Benjamin Constant o que sabia. Manobrou no sentido de, na noite desse mesmo dia, reunir Benjamin Constant os oficiais do Clube Militar e das Escolas Militares, no Quartel do 2° Regimento de Artilharia a Cavalo - para onde acorreram também os oficiais do 1° e do 9.° Regimentos de Cavalaria.
(...) Realizava-se nessa mesma noite uma festa em casa da família Vicente Marques Lisboa, um sobrinho do Almirante Tamandaré. Vivia essa família na vizinhança dos Leais, a quem a unia estreita amizade. Fazia anos Estela, a filha mais moça da família Lisboa, e era esse o motivo da alegre reunião. Entre os convidados estava a família Xavier. Sentia-me assim dividido entre o desejo ardente de estar ao lado de Chiquita: e a preocupação de estar alerta. Resolvi, afinal, ir à festa, encarregando meus companheiros de república, entre eles Fileto Pires, Ovídio Abrantes, Astínfilo de Moura, de me prevenirem imediatamente do que houvesse.
(...) Daí a pouco ouviu-se, de fato, o rodar de um carro que se aproximava. Era um tílburi que parou em frente à casa da família Lisboa e de onde saltou Fileto. Não entrou.No patamar da escada confabulou comigo e com os Leais que também se achavam na festa.
- Não passará talvez a noite, disse eu - a pensar na Monarquia - repetindo a versão de Fileto, como se se referisse a Abrantes.
Despedi-me, ficando todos compungidos e edificados com a dedicação daqueles moços que deixavam a festa - e seus interesses a ela ligados - para acompanhar um amigo enfermo. Os Leais partiram imediatamente, depois de prevenir a mãe, D. Rosa, e as irmãs que os acompanharam.
(...) Estava cheio o quartel. Chegamos na ocasião em que era arrombada a Arrecadação. Pedi logo um dos revólveres nagan que estavam sendo distribuídos - arma que conservo, com a que me ofereceu Roosevelt, verdadeiras peças de museu. Benjamin Constant chegou às 2 da madrugada. Conferenciavam os oficiais, entre os quais o Coronel Solon. Ficou resolvido que se indagasse se a Marinha permitiria a saída da ‘Brigada Estratégica’ e foi, nesse sentido, redigido um ofício ao Almirante Wandenkolk”. (Viveiros)
- Os Mensageiros
“Escolheu Benjamin Constant, para portadores de tão importante mensagem, os dois discípulos em quem mais confiava - os discípulos amados - Tasso Fragoso e eu. Seríamos a ligação entre a ‘Brigada Estratégica’ rebelada e os oficiais revoltados da Armada. Às 4 horas partimos em cavalos escolhidos para uma galopada de São Cristovão ao Clube Naval, no largo do Rossio. O tropel dos cavalos cortava o silêncio da madrugada, mas prosseguíamos sem obstáculos. Cauteloso, propus, ao sairmos da rua General Pedra, para defrontar o Quartel General, que nos mantivéssemos cosidos com a grade do jardim, para não ser percebidos. Estava o Quartel General todo iluminado, como que para advertir de que o Governo vigiava. Continuamos a cautelosa marcha, quase que sopitando o pisar dos cavalos, para que não ressoasse na calçada, até desembocar na Câmara Municipal.
Ao fazer a curva, para ganhar a rua da Constituição, o meu cavalo prancheou - mas o vaqueiro mimoseano galopava firme na rédea e o animal que rodara, conseguiu firmar-se. Seguíamos, insensíveis a tudo o que não fosse o pensamento de chegar, o mais depressa possível, ao largo do Rossio, ao Clube Naval e, quando apeamos, estavam nossos cavalos brancos de espuma. Levávamos a senha. Batemos, a uma portinha que nos fora indica da, três pancadas espaçadas. Depois de alguns minutos, percebemos que alguém descia. Ouvimos, de dentro, as palavras da senha a que respondemos, repetindo por três vezes a contra senha, segundo as instruções recebidas. Abriu-se, então, uma fenda na portinha, por onde introduzimos o ofício. Daí a pouco voltou quem recebera de nós o documento e, repetidas as mesmas formalidades, foi-nos entregue, pela fenda, o ofício-resposta”. (Viveiros)
- Brigada Estratégica
“O tempo de montar de novo e lá partimos para o Convento de Santo Antônio, onde estava aquartelado o 7° Batalhão de Infantaria, a fim de informar da situação o Capitão Ferraz. Já encontramos todos a postos. Depois de lhe falar e de lhe transmitir a mensagem de que éramos portadores, tocamos para São Cristóvão a galope, sem acidente. O dia despertava. Súbito, tingiu-se o oriente sob uma chuva de ouro, pálida a princípio e depois cada vez mais rubra... e sobre essa cortina surgiria em breve o sol, a iluminar um novo dia, a iluminar, pela primeira vez, a República Brasileira.
Apesar da notícia de que o Governo estava a postos, vibravam todos de entusiasmo. Ao ser conhecida a resposta do Almirante Wandenkolk, soaram os clarins e, em meia hora, estava formada a ‘Brigada Estratégica’ que se compunha do 1° Regimento de Cavalaria, do 9.° Regimento de Cavalaria, formado como infantaria, por falta de cavalos, e do 2° Regimento de Artilharia a Cavalo. Quanto aos dois oficiais de ligação, Tasso Fragoso e eu, formou ele no pelotão de Alferes Alunos, constituído em guarda pessoal de Benjamin Constant que assumiu o comando, e eu fui designado para comandar a 4ª Sessão da 4ª Bateria do 2° Regimento de Artilharia, sob o comando do Capitão Hermes da Fonseca.
Quando os regimentos se puseram em movimento, foram acompanhados pelas mulheres dos soldados, até certa distância, no desejo de participar dos acontecimentos em que se achavam envolvidos os seus, ansiosas pelo que lhes poderia suceder. Um mensageiro fora enviado a Deodoro, informando-o de que as tropas tinham tomado posição. Ignorava-se, entretanto, se sua saúde lhe permitiria assumir o comando, embora tivesse ele tomado o compromisso de, a menos de absoluta impossibilidade, comandar o movimento, mesmo doente. Era indispensável e urgente que o fizesse”. (Viveiros)
- Deodoro
“Quando nos aproximávamos do Gasômetro, percebemos um carro que vinha a toda a brida - era Deodoro. Parou a tropa e ele, com esforço, montou o cavalo que lhe ofereceu um oficial, assumindo o comando. Às 7 horas formava, em pé de guerra, a ‘Brigada Estratégica’, estendida em toda a praça, em frente ao Quartel General, onde se achava reunido todo o Ministério, com exceção do Ministro da Marinha, o Barão de Ladário. Estava a tropa revolucionária a postos, quando ele chegou. Foi detido pelo Alferes-aluno Adolfo Pena Filho que lhe deu voz de prisão. O Ministro disparou a pistola - que falhou - sobre ele, mas foi ferido no braço pelo oficial que, revidando, o prendeu, impossibilitando-o de se reunir aos seus colegas.
Conservavam-se fechados os portões do Quartel General, salvo uma portinhola na porta principal, que se abria de vez em quando - e por ela falavam oficiais revolucionários ao ouvido do oficial que se achava dentro. Passava o tempo. As forças do Quartel General continuavam inativas e as forças revolucionárias, em linha de combate. É que Floriano desempenhava seu grande papel na proclamação da República - evitar derramamento de sangue. Aliás, embora não tivesse nunca Benjamin Constant podido ter com ele entendimento decisivo, confiava inteiramente no seu patriotismo.
Finalmente, o Ministro da Guerra, Visconde de Maracaju, dirigiu-se a Floriano a quem, como Ajudante General, competia dar ordens às tropas:
- Você não está vendo que os revolucionários estão prontos para atacar? Faça sua tropa sair!
- Infelizmente, Sr. Ministro, não posso cumprir essa ordem.
- Você, um herói da guerra do Paraguai, teme dar solução a uma questão política?
- É que lá se tratava de inimigos e aqui iríamos matar irmãos”. (Viveiros)
- República
“Seguiu-se animada discussão, mas Floriano se manteve inabalável. Eram de 8 para 9 horas. Um oficial comunicou, para fora, o que se passava. Abriram-se então os portões do Quartel General, deram-se 21 tiros, vivas à República, sobretudo para abafar o inadvertido ‘Viva o Imperador’ de Deodoro. Este e Benjamin Constant, junto de quem me achava eu - que deixara o comando da 4ª sessão da 4ª bateria deram voz de prisão aos Ministros, declarando que estavam destituídos e à disposição da Revolução. Não deixava Ouro Preto de olhar fixamente para Benjamin Constant - previra sempre que aquele moço daria com a Monarquia em terra.
Quando saíam, os Ministros foram apupados pelo povo, com exceção do Conselheiro Lourenço Cavalcanti de Albuquerque, Ministro da Agricultura, que a todos impunha respeito. Houve então um desfile pela cidade, em meio ao mais vivo entusiasmo. Dr. Xavier, ignorando o que e passava, acompanhava as filhas à Escola Normal. Ao passar em frente ao Quartel General, fê-lo um oficial conhecido voltar para Cascadura:
- Onde vai, Xavier? não é momento para passear com as filhas.
E os repetidos ‘Viva a República’, completavam a advertência. O herói da memorável jornada, Benjamin Constant, levou a grandeza ao ponto de tudo atribuir a Deodoro, mesmo depois de rotas as relações entre ambos”. (Viveiros)
Fonte: VIVEIROS, Esther de – Rondon conta sua vida - Brasil, Rio de Janeiro,1958 – Livraria São José.
Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva
Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA)
Acadêmico da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS)
Telefone:- (51) 3331 6265
Site: http://www.amazoniaenossaselva.com.br
E-mail: hiramrs@terra.com.br
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