Segunda-feira, 22 de junho de 2020 - 10h19
Bagé, 22.06.2020
Ao final de minha
descida do Rio Negro, em janeiro de 20101, conheci o ilustre escritor
amazonense Dr. Antônio Loureiro, membro do Instituto Geográfico e Histórico do
Amazonas (IGHA), da Academia Amazonense de Letras (AAL), da Academia Maçônica
de Letras (AML), da Academia de Medicina do Amazonas e membro correspondente da
Academia Nacional de Medicina. Visitei-o na sua residência onde tive a
oportunidade de ouvi-lo discorrer entusiasmado sobre a história do Amazonas, à
medida que discorria sobre os eventos históricos de seu querido Estado, trazia
alguns de seus livros para reforçar a argumentação. Mestre Loureiro me
presenteou com diversas obras e lanço mão de uma delas, “Tempo de Esperança”, onde ele descreve a Batalha Naval de
Itacoatiara.
Os irmãos da Loja Força
e Harmonia n° 19, Oriente de Óbidos, recomendaram-me a leitura do livro de
Ildefonso Guimarães: “Os Dias recurvos,
anatomia de uma rebelião”. No seu romance, o autor relata, com detalhes, a
revolta que eclodiu no quartel do 4° Grupo Artilharia de Costa, onde serviu o
Tenente Leônidas Cardoso, pai do ex-Presidente Fernando Henrique.
Liderados pelo
extravagante “Coronel Pompa”, os
sargentos da guarnição encarceraram todos os oficiais e aderiram à Revolução
Constitucionalista de 1932 ou Guerra de São Paulo que tinha por objetivo a
derrubada do Governo Provisório de Getúlio Vargas e a promulgação de uma nova
Constituição.
Intercalei trechos de
Loureiro e Guimarães, para narrar esta passagem pouco conhecida pelos amazonenses
e ignorada pela grande maioria dos brasileiros.
Revolução
de 1930 no Pará
No dia 03.10.1930, o
movimento teve início com assaltos a quartéis e deposições de governadores em
vários estados brasileiros. No Pará, no dia 05.10.1930, o 26° Batalhão de
Caçadores foi tomado pelos revolucionários. O Governador Eurico de Freitas
Valle foi deposto depois que a Força Pública, leal ao Governo, foi subjugada.
Assumiu, então, como interventor do Pará, em 12.11.1930, o Tenente Magalhães
Barata ([1])
que, em agosto de 1931, foi promovido a Major. O jornal “Folha do Norte”, que havia sido fechado pela junta governativa,
voltou a circular e, na sua edição de 13.11.1930, publicou matéria enaltecendo
o novo governante. O interventor declarou, em sua posse, que seu Governo
seguiria a risca o programa da Revolução definido anteriormente pelo Coronel
Landry Sales, Comandante das Forças Revolucionárias do Norte do Brasil e
Governador Militar do Estado do Pará.
O Decreto n° 19.398, de
11.11.1930, concedia ao Interventor o direito de exercer, em sua plenitude, as
funções do Executivo e do Legislativo, dissolvidos pela mesma Lei, sem qualquer
tipo de ingerência por parte do Judiciário, Barata responderia, tão somente, ao
Presidente Getúlio Vargas.
Barata fez uso
sistemático de Decretos-Lei, para reorganizar o Estado e desmontar a estrutura
de poder dos antigos adversários confiscando a sede do Partido Republicano
Federal onde funcionava o jornal “Correio
do Pará”. Foi nesse clima que eclodiu em Óbidos um Movimento
Revolucionário, fiel à Revolução Constitucionalista de 1932. O intrigante
Coronel Pompa promoveu graduados ao posto de oficias, deteve embarcações,
saqueou comerciantes mediante “requisições”
onde, além de extorquir-lhes dinheiro, exigia o fornecimento de artigos, para
amparar o Movimento, onde se incluíam loções para cabelo, meias de seda para
senhoras, caixas de cerveja, garrafas de whisky e urinóis.
Sua atitude mais cruel,
porém, foi o recrutamento, à força, de jovens “voluntários” totalmente despreparados para reforçar suas fileiras.
Como o próprio Ildefonso Guimarães nos conta no seu romance histórico:
Agarrou-se
o caboclo à força, no amanhecer do dia anterior e se arrastou pro Quartel que
nem mamote para capação. A maioria está mais assustada do que onça diante de
coivara, sabendo que está sendo preparada para ser metida numa guerra que tanto
pode ser mais logo à noite como amanhã de manhã. (GUIMARÃES)
Batalha
Naval de Itacoatiara
Idelfonso Guimarães
relata, no seu livro que o Tenente Fontelles, Delegado de Polícia de Óbidos, enviou
um telegrama urgente a Magalhães Barata cientificando-lhe da eclosão de um
Movimento Revolucionário na sua jurisdição liderado por um tal de Coronel
Pompa:
URGENTÍSSIMO
Interventor Magalhães
Barata – Palácio do Governo – Belém Pará. Idêntico para Dr Nogueira de Faria –
DD Chefe de Polícia.
Comunico Vossa Ex.ª Sargentos
e Praças 4° GAC aprisionaram Oficiais da unidade VG (38) aderindo
Revolução São Paulo PT ([2])
Rebelião começou amanhecer hoje instigada civil conhecido por Pompa se faz
passar Coronel Exército PT (38) Delegacia ocupada por praças está
sendo dirigida civil dentista Emílio Pereira PT (38) Sigo Santarém
de onde darei melhores esclarecimentos PT (38) Respeitosas saudações
– Tenente Fontelles Delegado Polícia Óbidos (GUIMARÃES)
LOUREIRO: Na noite de
19.08.1932 espalhou-se, em Manaus, a notícia de que os Sargentos do 4° Grupo
Artilharia de Costa, de 70 homens, sediado em Óbidos, haviam aderido à
Revolução Reconstitucionalista de São Paulo, obedecendo à chefia de um civil,
comissionado no posto de Coronel, pelo General Bertholdo Klinger, o Doutor
Alderico [Pompa] de Oliveira, advogado baiano, que aqui vivera, tornando-se
figura conhecida no “Ponto Chic”, na
“Leiteira Amazonas” e no “Bar Americano”, onde passava por
caixeiro viajante. (LOUREIRO).
O aventureiro Alderico
de Oliveira fazendo-se passar por Coronel Pompa, emissário do General Bertholdo
Klinger conseguiu convencer os praças do 4° Grupo a se rebelar contra seus
oficiais e se utilizou da mídia obidense, mandando publicar manifestos à
população. No dia seguinte ao levante a “Folha
de Óbidos” esgotou a edição extra de 200 exemplares. Estampada na primeira
página estava a seguinte manchete:
“ÓBIDOS TOMA POSIÇÃO AO LADO DE SÃO PAULO”, e logo abaixo o texto da
proclamação:
GUIMARÃES: MANIFESTO AO
POVO OBIDENSE
O Coronel Pompa,
Comandante das Tropas Revolucionárias de Óbidos, comissionado e enviado
especial do Sr. Bertoldo Klinger, Comandante em Chefe do Exército
Constitucionalista, lançando o presente boletim ao povo desta Cidade, com a
franqueza e lealdade própria do soldado que coloca as honrarias e postos sob os
pés, para olhar e encarar a defesa e integridade da Pátria, sente-se orgulhoso
em dizer que o movimento ora levantado neste rincão belíssimo do Amazonas está
vitorioso, porque não só conta com a adesão incondicional da maioria da Armada Nacional
e Exército Brasileiro, como também não se trata de um movimento político,
porquanto, mais alto que o interesse do mando, mais alto que o desejo de
perpetuidade nos cargos públicos, fala pela boca do são patriotismo a
necessidade de o País voltar ao “regímen”
da lei. E voltará.
Apenas calma, reflexão,
ponderação pedimos e aconselhamos ao povo desta boa e hospitaleira terra.
Esteja o povo tranquilo
que tudo há de ser resolvido dentro das melhores maneiras, sem estrépitos
inúteis e sem fuzilaria desnecessária.
O Povo que se
congregue, o Povo que se levante e o Povo que venha lutar pela
constitucionalização do País, para salvar a honra deste Brasil amado e desta
Pátria querida.
Avante, brasileiros,
que à frente desta luta sacrossanta e digna estão brasileiros, civis e
militares, de envergadura moral invejável, de caráter impoluto e de honra
inatingível.
Para a frente!
[a] Coronel Pompa.
(GUIMARÃES)
LOUREIRO: Os rebelados
haviam mandado um ultimato ao 27° Batalhão de Caçadores [27° BC] de Manaus,
solicitando a sua adesão ao movimento, caso contrário atacariam a Cidade. A
partir deste momento, o Interventor Federal em exercício, o Comandante do 27°
BC e o Capitão dos Portos tomaram as providências ao seu alcance, para a defesa
da Cidade, mobilizando lanchas para o patrulhamento do litoral, estabelecendo o
regime de prontidão nos quartéis, guardando os principais prédios públicos,
vigiando as ruas e apagando a luzes da orla portuária. (LOUREIRO)
O Major Magalhães
Barata, Interventor Federal do Pará, tomou, imediatamente as medidas cabíveis,
deslocando para a região uma força de trezentos homens armados e municiados a
bordo do vapor “Tenente Portella”, da
flotilha do Estado e autorização do Governo Federal para que o encouraçado “Floriano” seguisse, logo em seguida, em
apoio ao “Tenente Portella”.
Bibliografia:
GUIMARÃES, Ildefonso. Os Dias Recurvos: Anatomia de uma Rebelião – Brasil – Belém, PA –
Secretaria de Estado de Cultura, Desportos e Turismo, 1984.
LOUREIRO, Antônio. Tempos de Esperança – Brasil – Manaus, AM – Gráfica Fenix, 1995.
Solicito Publicação
Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia,
Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e
Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS);
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO);
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS);
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG);
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN);
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] General Joaquim de Magalhães Cardoso Barata: filho de Antônio
Marcelino Cardoso Barata e Gabrina de Magalhães Barata, nasceu em Belém do
Pará, em 02.06.1888. Cursou a Escola Militar do Realengo e a Escola de Guerra
de Porto Alegre. Foi Interventor Federal, de 12.11.1930 a 12.04.1935 e, a
seguir, Governador do Estado do Pará.
[2] VG: vírgula; PT: ponto.
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H