Terça-feira, 5 de abril de 2022 - 06h00
Bagé, 05.04.2022
O
Coronel de Engenharia Zauri Tiaraju Ferreira de Castro parceiro de trabalho no
6° BECmb, São Gabriel, RS, (quando eu era ainda um jovem Tenente), e ex-prefeito
de Caçapava do Sul no período de 2009/2012, enviou-me um texto de sua autoria
que faço questão de compartilhar com os eleitores.
SETENTRIÃO NACIONAL
Em
maio de 1974 desembarquei em Roraima, um dos quatro Territórios Nacionais, que
ainda não detinha o status administrativo de Estado da Federação junto com o
Acre, Rondônia e Amapá.
Boa
Vista era uma cidade planejada com avenidas largas, asfaltadas, com muitos
espaços vazios e um monumento majestoso ao garimpeiro localizado bem no centro
do traçado urbano, defronte à Catedral e ao Palácio do Governo.
Não
havia ligação terrestre com o restante do País e ganhavam importância a
navegação fluvial que chegava pelas águas do Rio Branco na época das cheias e o
transporte aéreo feito pela FAB, o oficial, e o privado pela VARIG e
Transbrasil.
Sua
população era predominantemente de caboclos da região, nordestinos
remanescentes dos garimpos e alguns sulistas atraídos pela presença do Campus
da UFSM que fora instalado ali e fazia esse intercâmbio permanente.
No
quartel de engenharia (6° Batalhão de Engenharia de Construção) que tinha a
missão da abertura pioneira da BR-174 havia gente de todo o Brasil. Anualmente,
incorporava jovens da terra para o serviço militar. Haviam os índios Macuxís
vindos do Norte, fronteira com as Guianas e Venezuela. Ao Sul, na divisa com o
Amazonas era a terra dos outros grupos Yanomanis, não totalmente aculturados
como os do Norte, administrados pela FUNAI e diversas missões do Conselho
Indigenista Missionário que abrigavam um número significativo de padres e
religiosos estrangeiros, inclusive europeus.
Entre
os soldados recrutas, havia um número de cerca de 30% de índios aculturados.
Apresentavam um comportamento discretíssimo, sendo difícil arrancar deles uma
reação mais positiva sobre qualquer tema diferente. Quando comandei uma
companhia encarregada de manter o tráfego da estrada ainda não pavimentada de
Boa Vista até o BV 8, para o transporte de madeira para a Venezuela, implantei
uma horta para ajudar no rancho do pessoal, onde trabalhavam três soldados índios.
Numa das minhas andanças para ver as verduras encontrei diversas melancias
ainda no baraço identificadas com a minha rubrica, imitadas pelos bugres.
Serviam ao Exército e retornavam às suas malocas de origem para manter o apoio
da FUNAI e continuar na vidinha sossegada que levavam desde que nasceram. À
sombra dos mangueirais frondosos e seculares.
Nesse
tempo, também não havia satélite retransmissor para as TV da cidade. As novelas
chegavam por malote em fita cassete. Quando se extraviava o malote por qualquer
motivo fortuito, lá se ia um pedaço da novela.
Quando
o atoleiro era grande ou o serviço de manutenção ou recuperação de pontilhão ou
bueiro era mais demorado, o pessoal acampava em alguma fazendola a beira da
estrada. Normalmente, o pagamento do aluguel da instalação era o fornecimento
de alguns litros de combustível para alimentar as lamparinas dos moradores, sem
luz elétrica. Na cidade, a energia era fornecida por uma usina termo – elétrica
que comia um horror de diesel e por isso mesmo era bem cara.
Numa
visita a um desses acampamentos, conheci um galpão das tralhas com um girau
construído com as placas de sinalização de latão arrancadas da estrada e que
tanto trabalho nos traziam para serem repostas. Mandei que o encarregado,
quando terminasse o serviço, agradecesse pela hospitalidade e desmontasse o
paiol, carregando as nossas placas tomadas por empréstimo sem autorização e que
fornecesse um pouco mais de óleo diesel para o lampião da casa.
Houve
uma emergência para o concerto de uma ponte de madeira na Perimetral Norte,
trecho semiconcluído que na altura de Caracaraí, às margens do Rio Branco, 200
Km para o Leste e outro tanto para o Oeste, servia aos índios e moradores
locais. Na hora de formar a equipe me apareceu o Roberval, cearense, motorista
de caminhão que justificava sua voluntariedade na oportunidade que via de “pegar” uma indiazinha daquelas para ver
se era mesmo verdade tudo aquilo que contavam. No primeiro final de semana no
trecho, os índios que já utilizavam espingarda fornecidas pela FUNAI lhe
convidaram para caçar catitu. Arrependeu-se de ter nascido.
Foi
escalado para transportar o primeiro porco abatido, de uns quarenta quilos, nas
costas, com dois rasgos laterais na barrigueira enfiado nos dois braços, como
se mochila fosse. Quase morreu, correndo pelo mato com aquela bruta carga nas
costas, com medo de se perder atrás daqueles
Outro
incidente não comum foi quando resolvi convidar alguns civis “casados” para participarem da reunião
mensal que fazíamos para confraternizar entre oficiais, sargentos e alguns
empresários locais e suas famílias. Me apareceu um funcionário de nome Roberto,
discreto, boa gente, bem apessoado, acompanhado por uma senhora com idade para
ser sua mãe. No outro dia perguntei ao meu motorista Costa, um civil veterano
de Boa Vista, muito discreto e muito bem informado pelos seus mais de vinte
anos de batalhão qual o significado daquela união um tanto quanto disparatada
para a região. Respondeu que aquela parceria era uma estratégia do Roberto que
andava querendo mesmo era pegar a filha da velha...
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do Instituto
de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
·
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
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