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Hiram Reis e Silva

Contrarrevolução de 64 – Parte XVII


04.11.1964 - Revista Manchete n° 625c - Gente de Opinião
04.11.1964 - Revista Manchete n° 625c

Bagé, 19.06.2024

 

Após receber no Palácio das Laranjeiras o General Oromar Osório, comandante da Vila Militar, o Presidente da República passou a pesar bem na balança as vantagens e conveniências de um recuo ou de uma sustentação de sua atitude. De um lado, os Oficiais da Marinha e do Exército, que no Clube Naval e no Clube Militar, exigiam a punição dos marinheiros, e, do outro, os comandos sindicais impondo a liberdade dos marinheiros como condição indispensável para que não fosse deflagrada uma greve geral. Ao mesmo tempo, circulavam notícias e rumores que completavam o quadro da crise:

 

I      O Governador Nei Braga voara até Goiânia a fim de conversar com o Governador Mauro Borges, e, possivelmente integrá-lo na entente dos Governadores liderados pelo Sr. Magalhães Pinto.

 

II     Alegava-se no Congresso que o novo Ministro da Marinha não tinha poderes para anistiar os rebeldes, porque essa atribuição era privativa do Poder Legislativo.

 

III   No Senado, o Sr. Moura Andrade reunia um grupo de Deputados e Senadores não só para tomar conhecimento do manifesto do Governador Mineiro como também para divulgar uma nota oficial sobre a situação.

 

IV    Afirmava-se que o Marechal Augusto Magessi Presidente do Clube Militar, poderia também ser punido pela solidariedade ao Clube Naval, embora isso não estivesse nas cogitações do governo.

 

V      O Banco do Brasil ordenara a suspensão do redes­conto de alguns bancos paulistas, mineiros e cario­cas, ligados a líderes oposicionistas. O Sr. Hugo de Faria, diretor da Carteira de Redesconto, deveria ser nomeado para a presidência do BB, em substituição ao Sr. Nilo Medina Coeli.

 

VI    Em Governador Valadares, agravara-se o choque entre camponeses e fazendeiros.

 

VII   O Ministro da Guerra, em convalescença de uma operação cirúrgica, desmentia os rumores de que pretendia viajar para os Estados Unidos, assim desautorizando indiretamente as notícias de que teria substituto.

 

Em meio a tantos receios e temores, o Sr. João Goulart dirigiu-se ao Automóvel Clube do Brasil para ser homenageado pelos sargentos do Exército. Aeronáutica, Marinha e Policias Militares. Ali ouviu a palavra de vários líderes da classe, entre outros, o sargento Garcia Filho, atualmente deputado federal, que perguntava:

 

Quem depôs o Sr. Getúlio Vargas em 1945? Quem derrubou o Ministro João Goulart da pasta do Trabalho? Quem levou o Presidente Vargas ao suicídio em 1954? Foram os soldados? Não! Quem tentou impedir a posse do Presidente Juscelino em 1955? Foram os marinheiros? Não! Quem fez as rebeliões de Aragarças e Jacareacanga? Quem quis impedir a posse do Presidente Jango em agosto de 1961? Foram os soldados e marinheiros? Não e não!

 

Foi após essas indagações e respostas, e já tendo falado cerca de oito oradores, que o Presidente da República se levantou, para fazer um dos seus mais longos e veementes discursos. Declarou, de início, que a crise que nesta hora se manifestava no País foi provocada pela minoria de privilegiados que vive de olhos voltados para o passado. Afirmou que o momento exige de cada brasileiro o máximo de calma, mas também o máximo de energia e determinação, pois só assim faremos face ao clima de intriga e envenenamento que grupos poderosos estão procurando criar contra o governo e as Classes Armadas. Prosseguiu o Sr. João Goulart:

 

Para compreender o esquema desses grupos –basta observar que eles estão comandados pelos mesmos inimigos da democracia que ontem pregavam o golpe e a ditadura, concitando o povo ao regime de exceção. As forças e as pessoas que provocaram o suicídio do Presidente Vargas, que foram as responsáveis peta renúncia de meu antecessor, que procuraram impedir em 1950, 1955 e 1961 a posse dos três presidentes eleitos são as mesmas que agora se reúnem contra as reformas exigidas pelo povo brasileiro. Elas, em 1951, desejavam rasgar a Constituição e hoje se julgam as suas defensoras. Tudo isto é história recente, que não precisa ser repetida. Os Inimigos do povo Intensificam a luta contra o meu governo.

 

Declarou que a nação é testemunha do seu empenho em falar com lealdade e franqueza. Disse ter feito:

 

Toda a sorte de esforços para procurar soluções conciliatórias no encaminhamento pacífico das reformas, convocando para seus auxiliares alguns representantes das classes dirigentes e submetendo-se, com isto, à crítica de companheiros leais. No entanto, todos esses esforços encontraram a resistência de preconceitos, a frieza da intransigência, o hábito do insulto pessoal ao presidente, a insensibilidade dos mais favorecidos, que encaravam como sinal de fraqueza o meu desejo de encontrar soluções pacíficas. O veto dessa minoria reacionária revelou-se quando disse que reprimiria pela violência as mais legítimas reivindicações das classes populares.

 

Disse o Presidente João Goulart que a campanha de sabotagem foi além da deformação das diretrizes legalistas de seu governo, procurando aliciar os próprios sentimentos cristãos e religiosos do povo brasileiro E asseverou que, de repente, aqueles que mais pregavam o ódio se irmanaram aos maiores corruptores para juntos falarem em nome do sentimento cristão do povo. E, assim, passaram a acusar de anticatólico e anticristão não apenas o presidente da República, mas o próprio cardeal de São Paulo.

 

Na hora em que ainda repercutem as Encíclicas de João XXIII continuou têm esses aventureiros a audácia de falar em nome do povo. Não me cabe combater essa usurpação. A Ação Católica de Minas e a de São Paulo já tomaram essa iniciativa. E a maior resposta a esses fariseus foi dada por aquele extraordinário prelado brasileiro que a 2 de fevereiro de 1963 afirmava:

 

Os poderosos da América Latina falam muito de reformas de base, mas acusam de comunistas aqueles que querem realizá-las. O egoísmo de muitos ricos, sua cegueira, é um problema muito mais grave e importante do que o próprio comunismo.

 

Esse grande sacerdote acaba de ser designado pelo Papa para Arcebispo de Recife. É o Arcebispo D. Helder Câmara. Aconselho a todo brasileiro que medite um pouco se está realmente defendendo a doutrina daquele que morreu na cruz ou está apenas defendendo ingenuamente interesses de grupos poderosos.

 

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

 

Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989);

Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;

Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;

Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS);

Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO);

Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS);

Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG);

Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN);

Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP)

E-mail: [email protected].

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