Quinta-feira, 23 de maio de 2019 - 10h45
[...] O
entusiasmo domina a Velha Guarda!
‒
Brados... exclamações... ao General
Os cavalos
escarvam e os freios mordem...
E a música
postada na vanguarda
Bate
trêmula o Hino Nacional. [...]
(Francisco Lobo da Costa)
Recebi um e-mail do Exm° Sr.
General de Divisão R/1 Décio dos Santos Brasil, do Sistema
Defesa-Indústria-Academia de Inovação (SisDIA/RJ), que, devidamente autorizado,
reproduzo a seguir.
Prezado Cel Hiram,
Primeiramente, saudações “Azul Turquesa”.
Anonimamente, tenho acompanhado suas publicações e
expedições, pois muito me atraem.
Neste caso, sobre os Waimiri-Atroari, resolvi me manifestar,
já que ele relembra uma fase importante e inesquecível de minha vida
profissional.
Como Capitão, nos idos de 86/87/88, servi no 6° BEC, em Boa
Vista. A maior parte do tempo estive à frente da 1ª Cia E Cnst, sediada em
Santo Antônio do Abonarí.
Aproveitando a experiência de companheiros que passaram por
lá, creio que o Sr. também, estabeleci uma convivência com os silvícolas da
área. Alguns fatos são inesquecíveis, pois estão ainda vivos até os dias de
hoje.
Vou enumerá-los:
Na ocasião, nós, digo EB,
tínhamos o controle do trânsito de veículos e de pessoas dentro da reserva, do
Rio Abonarí ao Rio Jundiá. A cancela era abaixada às 18h00 e liberada às 06h00
do dia seguinte. À frente da Cia tinha um posto da Petrobrás, cujo o dono tinha
um apelido marcante, mas o tempo não me permite mais lembrar. Ali, as carretas
destinadas ao Norte da BR-174, principalmente Boa Vista, estacionavam e
pernoitavam, bem apoiados pelo posto e seu dono simpático e amigo. Todos
respeitavam nossas ordens e orientações, os caminhoneiros, os moradores, a
FUNAI e, principalmente, os índios;
Lembro que o “cacique” dos Waimiri, de nome Tomás, era
muito cordial e estabelecemos um nível razoável de amizade. Quando ia a Manaus,
nos raros “arejamentos”, tinha que
trazer o fardo para o Tomás, que era composto de alimentos básicos [hoje chamado
de cesta básica] e produtos de higiene. Adorava sabonete Phebo. Quando, dentro
da reserva, cruzávamos com o Tomás, já era costume ceder-lhe o lugar do Cmt,
ao lado do motorista [Cb Cesário], na CP 97 e depois na CP 104. Tinha que parar
senão ele reclamava. Mesmo que o percurso fosse curto [100 metros];
Pequenas coisas como as
relatadas nos permitiam, EB, transitar dentro da reserva sem qualquer problema.
Podíamos trabalhar, desmatar, caçar e pescar. Além disso, costumava levar
comitivas que visitavam as obras do BR-174 às aldeias mais próximas, onde eram
travados os contatos com toda a tribo. Naquela época os índios eram pouco
aculturados e viviam nus, embora o Tomás já havia viajado para o Centro do País
e até para o exterior;
O Batalhão firmou um convênio
com a ELETRONORTE para o alteamento do greide da BR-174, principalmente no
trecho dentro da reserva dos Waimiri-Atroari. Além da terraplenagem,
construímos 5 pontes de concreto, incluindo a sobre o rio Abonarí e 3 dentro da
reserva. Esse convênio deveu-se à construção da hidroelétrica de Balbina, cujo
o lago, quando formado, atingiria diversos pontos da estrada. Fizemos um
volume imenso de aterro, bueiros celulares e tubulares e as 5 pontes. Lembro da
ponte sobre o igarapé Traíra e seus encabeçamentos, que foi um grande desafio,
devido à região alagadiça [igapós]. Para tal, num trabalho de prospecção,
encontramos uma grande jazida de material 1ª classe [cascalho] dentro da
reserva. Comandei um grande desmatamento para poder explorar toda a jazida.
Nunca fui questionado sobre esse enorme dano à natureza e agressão à reserva
indígena. Essa jazida proporcionou realizar a base de todos os trechos alteados
e os encabeçamentos das pontes. Foi um grande achado, pois acarretou economia
considerável ao projeto;
Na ocasião, o pessoal da Divisão
de Levantamento de Manaus [DL], por meio de seus engenheiros em Geodésia e seus
topógrafos militares já estaqueavam o eixo do linhão que ligaria Manaus a Boa
Vista com energia elétrica, inclusive dentro da reserva Waimiri-Atroari. Hoje muito questionado. Se o projeto do linhão tivesse
andado naqueles tempos, Boa Vista não
estaria sofrendo com a incapacidade da Venezuela transmitir a energia
contratada de Guri. A escolha do traçado e a localização das torres já
estavam definidos;
Certa ocasião, fomos
surpreendidos por uma equipe de reportagem dinamarquesa, que tinha como destino
Boa Vista. Eram 2 casais jovens e suas mulheres, loiras, eram extremamente
bonitas e esbeltas. Identificados e estando devidamente autorizados pelos
órgãos responsáveis, continuaram a viagem. Fui alertados de que eles não haviam
saído da reserva. Passei então a procurá-los. Foram encontrados numa aldeia dos
Atroari, já próximo do Jundiá. Viana, o cacique dos Atroari, era um camarada
totalmente aculturado e se vestia muito bem. Só era índio quando lhe convinha.
Tive que negociar com calma e comer muita pupunha para agradar os índios e
principalmente o Viana, que havia se apaixonado por uma das duas belíssimas
loiras dinamarquesas; e
Próximo ao nosso acampamento, cerca de 100 km a dentro da
reserva, havia a mina do Pitinga, da Paranapanema, que explorava a cassiterita
na região. Era a Mineração Taboca. Mantínhamos excelente relacionamento com
eles, inclusive com uma conta de livre acesso em seu almoxarifado, que supria
muitas necessidades da Cia, principalmente em madeira, material de construção e
peças dos Equipamento de Engenharia [Eqp Eng]. Em troca, mantínhamos a rodovia
nas melhores condições de tráfego. Era uma troca muito vantajosa para nós. Nas
emergências, mandava os auxiliares buscar peças e materiais na Taboca. Era um
período de expansão da mineradora, com grandes áreas de desmatamento, para a
construção de suas instalações e aeroporto e de substituição de diversos Eqp
Eng. Os velhos D-8H não operavam mais, mas havia ainda um considerável estoque
de peças que nos interessavam, além de oferta generosa de madeira já
trabalhada. Aproveitei bem a fase. Mas a Taboca e a Eletronorte [Balbina]
começaram a acostumar mau os índios. Construíram nova grande aldeia, servida de
pontes e estradas, forneceram armamento de caça, alimentação processada e
viaturas para deslocamento. Lembro que o Batalhão, na época do asfaltamento
da BR-174, acho que no final dos anos 90 e início dos 2000, teve sérios problemas
para atuar dentro da reserva, obrigando a interferência de altas autoridades,
dos diversos níveis.
Coronel Hiram, por enquanto é só. Nosso trechos têm muita
história e o Sr. tem proporcionado boas recordações.
Meu pai comandou o 7° BEC [72/73/74] quando eu ainda era
jovem adolescente, interno no Colégio Militar de Manaus [CMM]. Mas aproveitava
as férias para conhecer melhor a nossa Engenharia, dedicando rápidas passagens
pelas residências de construção do Batalhão. Na vida acadêmica me dediquei a cultuar
o nobre amigo, inclusive, já na Engenharia, sagrar-me campeão da prova de
hipismo nas Olimpíadas Acadêmicas de 1977. Mas o sangue “azul turquesa” falou mais alto. Embora voluntário para comandar o 7°
BEC, fui designado para o 2° BE Cmb, em minha terra natal.
Sobre o Padre Calleri, próximo
ao início da reserva indígena, após transpor o rio Abonarí, havia um monumento
abandonado em homenagem àquela expedição. Mantive o terreno limpo, mas os transeuntes
depredavam o que podiam. Outro monumento abandonado, à época, era o da
passagem da Linha do Equador, próximo ao acampamento da Arara Vermelha, já em
território roraimense.
Estarei acompanhando suas
postagens.
Forte abraço.
Gen Décio Brasil
SisDIA-RJ
Solicito publicação
(*) Hiram Reis e
Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor,
Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul
(1989)
Ex-Professor do
Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
Ex-Pesquisador do
Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do
Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
Membro do 4°
Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de
História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto
de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de
Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
Membro da Academia
Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito
da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito
da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com;
Blog:
desafiandooriomar.blogspot.com.br
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