Goulart toma Rumo Desconhecido e o Brasil Volta à Normalidade

Bagé, 03.04.2024

Jornal do Brasil n° 78, Rio de Janeiro, RJ

Sexta-feira, 03 de Abril de 1964

Após “dispensar o sacrifício do povo gaúcho e do povo brasileiro”, em Porto Alegre, o Sr. João Goulart – substituído às 03h45 de ontem, no Governo, pelo Sr. Ranieri Mazzilli – embarcou às 21h40 no Viscount presidencial, acompanhado de uma comitiva de 15 oficiais do Exército, tomando, desde então, destino ignorado: até aos primeiros minutos de hoje não havia desembarcado em Assunção ou em Montevidéu, onde estava sendo esperado, sendo provável que tenha cruzado a fronteira em automóvel.

Ignora-.se se o General Ladário Pereira Teles acompanhou o ex-Presidente, mas é certo que o Sr. Leonel Brizola ainda se encontra em território nacional. A nota lida ontem, às 13h00, pelo Prefeito de Porto Alegre, Sr. Sereno Chaise, pondo fim ao movimento de resistência, diz que o sr. Goulart tomou essa decisão após ter examinado, “com autoridades militares, amigos e correligionários as condições de resistir ao processo golpista”.

Empossado o Sr. Ranieri Mazzilli, a vida do País volta à normalidade: o General Costa e Silva é o novo Ministro da Guerra, o Brigadeiro Correia de Melo chefia a Aeronáutica, e para a Pasta da Marinha há três nomes em vista: Almirantes Rademacker, Sílvio Heck e César Andrade. Os Generais Amauri Kruel e Justino Alves foram mantidos respectivamente, nos comandos do II e IV Exércitos, e nomeados para o III e I Exércitos os Generais Pope de Figueiredo e Ururai Magalhães.

O General Olímpio Mourão Filho declarou, ao assumir a Presidência da Petrobrás, que o seu trabalho inicial seria “a completa limpeza da área, retirando todos os elementos comunistas ou suspeitos de seguir as ideias dos agentes de Moscou”.

Em visita ao Ministro da Guerra, o Governador Carlos Lacerda pediu-lhe o afastamento imediato de todos os comunistas dos postos-chave da Administração Federal. O Marechal Osvino Ferreira Alves está preso.

Em mensagem enviada ontem ao Sr. Ranieri Mazzilli, o Presidente Lyndon Johnson dispôs-se a intensificar a cooperação entre o Brasil e os Estados Unidos. “no interesse do progresso econômico, da justiça social para todos e da paz no hemisfério e no mundo”. A maioria aos jornais ocidentais mostrou-se, ontem, em seus editoriais, simpática ao movimento revolucionário que resultou na deposição do sr. João Goulart.

Em manifesto ontem ao povo brasileiro o Governador Magalhães Pinto afirmou que a vitória da legalidade “está em fase de consolidação”, e convidou-o a se unir em torno de uma série de medidas necessárias à recuperação do País. “O movimento restaurador da legalidade foi feito pelas armas e pelo povo. Não pode e não deve ser dispersado em esforços de realização de objetivos pessoais ou de grupos” – afirmou.

As Associações Comerciais do Brasil, reunidas ontem na Associação Comercial do Rio de Janeiro, sob a Presidência do Sr. Rui Gomes de Almeida preparam manifesto ao Congresso em que repudiam qualquer movimento que se siga ao da Revolução Democrática com princípios de violência e ódio, e em que se afirmam favoráveis às reformas justas preconizadas pelo movimento vitorioso.

O Governador Badger Silveira, depois de 15 horas de prisão na Escola Naval, reassumiu o Governo do Estado do Rio. Na Assembleia, deputados oposicionistas articularam seu impeachment, mas o projeto foi rejeitado com a interferência da bancada do PSD, em obediência à determinações do Sr. Amaral Peixoto. Em Recife, os vereadores votaram o impedimento do Prefeito Pelópidas Silveira que está recolhido à Vila Militar do Socorro, onde se encontra o Sr. Miguel Arrais. É de calma a situação em todo o Nordeste e no Rio Grande do Sul.

Os líderes dos partidos na Câmara já estão tratando da substituição do Presidente Ranieri Mazzilli, pois o seu mandato tem duração de 30 dias, ao fim dos quais deverá ser escolhido, pelo Congresso, o Presidente efetivo. Nesse sentido as lideranças partidárias vão pedir regime de urgência para o projeto do Deputado Osvaldo Zanelo, que regulamenta a eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República, pelo Congresso, em caso de vacância na segunda metade do período presidencial.

Carlos Castello Branco revela, em sua coluna, que foi um grupo de Coronéis, com consentimento do Comandante do Estado-Maior do Exército, que iniciou há quatro meses o processo de conspirarão contra o Governo Goulart, sensibilizando os altos escalões das Forças Armadas e se infiltrando entre a oficialidade.

Deu motivo à conspiração a tentativa de prisão do Governador Carlos Lacerda por soldados paraquedistas, e apressou o plano a crise na Marinha de Guerra, quando os marinheiros e fuzileiros navais se rebelaram. Diante da onda de boatos que circulavam esta madrugada todas as guardas militares da Guanabara foram reforçadas. [...]

Festa da Vitória Leva à Ruas 1 Milhão de Pessoas

A “Marcha da Família com Deus pela Liberdade” mobilizou, ontem, no Rio de Janeiro, uma multidão calculada em um milhão de pessoas, que desfilaram da Candelária à Praça Barão do Rio Branco, em regozijo pela vitória das Forças Democráticas. Ao passarem em frente ao JORNAL DO BRASIL, os manifestantes saudaram-no com vivas pela campanha que sustentou em defesa da democracia

O Marechal Eurico Gaspar Dutra puxou o desfile ao lado dos Generais Augusto Magessi e Mourão Filho. O General Mourão disse, do palanque oficial, que estava ali “para saudar o povo, que acabamos de libertar”.

O Governador Carlos Lacerda que não compareceu à concentração, falou à noite a cinco mil pessoas, em frente ao Palácio Guanabara, dizendo que “nem durante as duas guerras mundiais as Forças Armadas foram chamadas à ação com tonta urgência, para salvar a integridade do Brasil”.

Bibliografia

Jornal do Brasil n° 78, Rio de Janeiro, RJ, Sexta-feira, 03 de Abril de 1964.

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;

Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP)E-mail: hiramrsilva@gmail.com.