Segunda-feira, 24 de abril de 2023 - 18h31
Bagé,
20.04.2023
Mais
uma vez tenho a honra de repercutir um belo e oportuno artigo de meu caro
Amigo, Irmão e Mestre Higino Veiga Macedo, editado em João Pessoa.
Minha Aprendizagem – Parte I
(Higino Veiga Macedo)
O
que escrevo são minhas vivências e experiências. Não cito fontes, não cito
trabalhos e nem tem o formato oficial ou oficializado. Eu os fiz para chegar ao
homem da ponta: Sargentos e Tenentes. Ou até mêsmo empresários [cujo étimo ([1])
é o mesmo de empreendedor] que deseja entender algo que é cultuado nos
quartéis, mas de uso universal. É muito mais inspirado no empirismo que no
racionalismo.
Desde
soldado, o que eu fui, escutava as referências de Hierarquia e Disciplina.
Como oficial ainda mais fui impregnado da necessidade de entender a Hierarquia
e Disciplina porque eu seria um Líder. Daí eu ter necessidade de primeiro
entender o que é e como se formam o líder. Depois entender o que seja
Hierarquia e Disciplina. Como praticante da arte real criei mais um elemento
importante nas organizações militares: a Lealdade. Assim, deixo a díade, instável,
para ter a tríade, equilibrada para ter o equilíbrio de LIDER.
As
definições do que tratarei, quando ia ao dicionário eram disparates: cada
dicionário tem as suas; cada intelectual tem as suas; e em particular em
tempos de forças ideológicas, a dialética “engeliana”
deforma tudo.
Resolvi
escrever o que entendi, vivenciei e pratiquei. Imagino que tenho razoável
bagagem para saber usá-los nas minhas argumentações. Bom tudo isso é para dizer
que tudo é fruto de observação muito particularizada. Em momento de arrogância
minha, digo que aceito discordância, mas o discordante teria que ter feito o
mesmo caminho que eu. Ou, no mínimo, parecido...
Montei
o meu perfil em espelhos. Busquei luz nos reflexos da dos gênios. Acho que nem
foi de perfil: foi montagem em verdadeira grandeza. Claro, não cheguei a
chorar, como Alexandre, por invejar Aquiles, segundo Plutarco. Invejei Aquiles
por ele ter o centauro Quiron por mestre. Os grandes combatentes e
conquistadores seguiram e foram seguidos. Assim, não diminui o valor de
combatente pelo fato de seguir e se mirar em gênios. Não pelo número de
sucesso, mas pelo comportamento de líder, de comandante, que permitiram seus
sucessos.
Aníbal seguia a Dario; Alexandre a
Aquiles; Júlio César a Alexandre; Napoleão a Júlio César. Sem pesquisar,
imagino que Caxias, Osório e Rondon se espelharam em todos eles. Patton
admirava a Napoleão... Todos, estrelas cósmicas. Eu admirei a todos, à medida
que aprendia seus feitos nas suas biografias.
Alexandre
montava sua barraca, domava seu cavalo, dormia ao relento com a tropa. A sua
guarda era iniciada no Templo de Apolo, Oráculo de Delfos.
Júlio
César mantinha a convivência com a tropa nos acampamentos. Cada soldado não era
um soldado. Era um companheiro de combate. Júlio era um soldado que combatia
com os soldados, nas legiões. Entretanto, não admitia fraqueza, titubeio, acovardamento.
Sua tropa jurava fidelidade a ele, por ser Comandante, Chefe de Estado,
Imperador. Como eu fiz, à Nação Brasil, perante a Bandeira Nacional.
Osório
vê a luz militar como soldado. Dou o testemunho de que, parafraseando Castro
Alves: “Não cora a espada do oficial ao
ombrear com o fuzil do soldado, nem cora o fuzil de pedir luz à espada”.
Afinal, em combate, a dependência é mútua. Osório, um iniciado na Arte Real,
tal qual Alexandre e Júlio Cesar, em seu castro tomava chimarrão no acampamento
e à frente de sua barraca, para ser visto por todos os seus combatentes –
oficiais e praças. No Passo da Pátria, atravessou com a vanguarda. Como ele
foi, eu fui soldado e sou iniciado na Arte Real.
Já
bem antigo, fui confirmar que eu estava certo. Instintivamente, colhi as luzes
de Guderian, na linguagem rude, simples, direta e objetiva, dispensando a
formalidade fútil, inútil e “bajulativa”.
Na lida militar, eu sempre preferi o TRATO CASTRENSE leal à FIDALGUIA PRAGMÁTICA
cínica.
Em
livro, descobri o “Tenente-Coronel Chukwumeka
Odumegwu OJUKWU, que tentou resistir, com a Biafra, contra a Nigéria”. “Compelido a depender de si mesmo e de mais
ninguém, Ojukwu desenvolvera uma filosofia pessoal de confiança em si mesmo,
uma inabalável autossuficiência interna que não exigia o apoio externo de
outros”.
Assim
também fiz, ser autossuficiente, ao transferir um Batalhão de Construção sem
ônus para o Exército.
Fundamentei
em Maquiavel uma moral: “ao rei a vida e
os bens devem ser dados, mas a honra é patrimônio da alma e pertence somente a
Deus”. Segui Gonçalves Dias: ...”A
vida é combate, Que os fracos, abate, Que os fortes, os bravos, Só pode exaltar”.
Ouvi
Kipling – “Se... És capaz de, entre a
plebe, não te corromperes; E entre reis, não perder a naturalidade; E de
amigos, quer bons, quer maus, te defenderes...”.
ü Nunca
comandei soldados: comandei jovens inexperientes na arte da guerra;
ü Nunca
comandei oficiais: comandei futuros Coronéis Comandantes;
ü Nunca
cultuei pessoas: respeitei superiores como mais experientes e, de momento,
mais bem informados;
ü Nunca
tive subordinados: colecionei amigos;
ü Assim
agi; assim pratiquei; assim fui “espelho”, também;
ü É
verdade, no cosmo fui micro, sempre reconheci;
ü
Sempre fui BOM, fazendo bem-feito o
BOM.
O
texto, que pretensiosamente chamo de cartilha, terá quatro partes: o que eu
tendi o que é ser Líder, o que é Hierarquia, o que é Disciplina e o amálgama
de delas – “A Lealdade” elementos
necessários ao Líder.
Um Líder
A arte da guerra é governada por cinco
fatores constantes, que devem ser levados em conta. São: a Lei Moral; o Céu; a
Terra; o Chefe; o Método e a Disciplina.
A Lei Moral faz com que o povo
fique de completo acordo com seu governante, levando-o a segui-lo sem se
importar com a vida, sem temer perigos.
(A Arte de Guerra – Sun Tzu)
Há
na literatura clássica referência aos motivos que um homem segue outro: “Os atenienses declararam serem três dos
mais fortes motivos para aceitar a proposta espartana: medo, interesse e honra” ([2]);
Maquiavel: “Na verdade, os homens ofendem
ou por medo ou por ódio”. (Capítulo XII). Longe de me comparar aos
clássicos, meu “pitaco”, por não ser
um estudioso, mas apenas um praticante de liderança, é: “um homem segue outro por um dos três motivos: por medo ou por corrupção
ou por ideal”. Por medo, se estiver sob o mando de alguém tirano e déspota;
por propina, se tiver personalidade gananciosa; e por ideal, se estiver sob o
mando de quem se crê as intenções, capacidade e disposição.
Necessariamente,
nem sempre a liderança, acontece só por motivos honrados. Há líderes em todos
os espectros da sociedade: do sacro ao vil. Mas em qualquer espectro, o líder
reúne qualidades que lhe permitem conduzir outros homens. Liderança tem um
objetivo a ser conquistado. Não há liderança para não fazer nada. Aprendi cedo
a identificar um superior, um igual e até mesmo um subordinado, como líder
respondendo a mim mesmo: eu gostaria que tal pessoa me comandasse?
1. Minha Definição de Líder
Elemento
que assume a responsabilidade de conduzir um “determinado grupo social” para uma “determinada ação” em um “determinado
ambiente”.
2. Tipos de Homens.
Em
qualquer grupo humano, existem dois tipos de homens – “homem que não quer...” e “homem
que quer...”. Dentre o “homem que quer...”, e há poucos, há o
homem que “nasceu para ser segundo” e
o que “nasceu para ser primeiro”, de
elevada minoria.
O
“homem
que não quer...” ([3])
é um ser que não tem ideias próprias. Sempre está atento à ideia do seu chefe.
Dificilmente aceita ideias de subordinados. Não tem luz própria e viceja à
sombra de alguém. Culmina por acomodar-se em algum canto e reza para que nunca
se lembrem dele até que a morte o livre dos compromissos. No mais das vezes é
um mercenário da sua atividade.
O “homem
que quer...”, mas que “nasceu
para ser segundo”, sendo inteligentes, será grande e exímio, cumpridor de
ordens; diligente e criativo executor de ideias alheias; espectador de fatos
consumados. Nunca espere um ato ou ideia de sua iniciativa. Se expuser ideia
nova, não será sua e, sendo sua, o fará somente depois de ungida pelo chefe. ([4])
O
“homem
que quer...” e “nasceu para ser primeiro” tem a
iniciativa como primeira atitude. Mesmo sendo de inteligência menos brilhante,
sempre estará em vanguarda, pois a sua impulsividade contagiará os que o
cercam e, assim, a máquina da vida será impulsionada para frente. Mesmo com
ideias de brilho menor e alcance prospectivo limitado, um “homem que quer” e nasceu
para ser primeiro:
ü
Tem ideia própria;
ü
É receptivo à ideia nova;
ü
Valoriza sempre os subordinados;
ü
É LEAL nas três direções – superior, subordinados e semelhantes
– isto é, pratica os três “S” da
lealdade, e
ü
Julga os homens pelos números de
acertos e não pelos de erros.
O
“homem
que quer” e “nasceu para ser primeiro” – é LÍDER.
3. Líder
A
força do líder reside na força moral
e equilíbrio emocional.
Moral é o compromisso da pessoa, consigo
mesma, de respeitar os códigos de valores vigentes que seu íntimo avalia como
sensato. Podem até ser estabelecidos pelos liderados e introjetados pelo
líder. Tais valores codificados recebem uma quantificação: é a diferença
entre o que “o Líder quer, para si e para
os liderados” e o que “o Líder não
quer, para si e para os liderados”. Esta quantificação é o “valor em moral”, como se moeda fosse.
Esse “valor em moral” é que gera uma
força, um poder, uma energia transformadora no líder.
Força Moral, portanto, é a crença de que os
valores morais, quantificados e estabelecidos; são inalienáveis em qualquer
negociação de conflito. A autodisciplina será fundamental para o fortalecimento
da força moral. A força moral será tanto maior quanto maior for a
autodisciplina do Líder.
A
Força Moral gera uma Vontade Resistente, que sublima cansaço, dores, fadigas,
fome... E a Vontade Resistente se chama “IDEAL”.
O Ideal justifica a motivação (motivo que convence perto do limiar da euforia).
O
Equilíbrio Emocional é fundamental
para manter os liderados confiantes nas decisões do Líder. O destemperamento, a
agressão gratuita, a busca de culpados deságua na perda da Força Moral.
Em
resumo: o líder e seus liderados buscam um ideal alimentado pela motivação,
motivação gerada por uma vontade resistiva vinda da força moral cujo valor
dessa força é a diferença do que se quer e do que não se quer sem a perda do
equilíbrio emocional. A liderança é uma atividade de altruísmo. O líder não
pode esperar recompensa, pagamento ou reconhecimento. Se acontecer alguma
dessas manifestações, deverá ser de forma espontânea e por iniciativa de seus
liderados.
Muitas
literaturas existem sobre: formação de líderes; qualidades dos líderes; tipos
de lideranças; aspectos psicológicos: do líder, da liderança e dos liderados
e, até aspectos metafísicos, genéticos, ambientais... dos líderes. A
psicologia, a psiquiatria, a neurologia produzem montanhas de literatura a respeito
de Líderes e Liderança.
Entretanto,
são sempre considerações estabelecidas por pessoas sem experiência de
liderança na prática. No mais das vezes repetem conceitos alheios, também
teóricos.
Quando
os liderados querem algo ou alguma coisa, o Líder conhece muito bem o “o que, o como, o quando e o porquê” de
esse querer. O Líder então: conhece seus liderados e conhece e interpreta o
desejo, a esperança e a vontade dos que o rodeiam. Conhece a Vontade Social, do
grupo. Convence com seu equilíbrio emocional.
Conhece
também, e muito bem, o local, o terreno, onde atua, isto é o ambiente físico, a
geografia. (Continua...)
Higino
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] Étimo: verdadeiro significado de uma palavra, de acordo com a sua
origem. (Hiram Reis)
[2] A Origem da Guerra no Ocidente – Doyne Dawson – pág. 169 –
Blibliex 1999. (Higino)
[3] ... “cumpria seus deveres
de subordinados com maior prazer que os de Chefes”. (Leon Tolstoi - Guerra
e Paz – Segunda Parte – Cap II – 6° §); Araktcheiev era um fiel executor,
observador da ordem e guarda pessoal do imperador. (Idem, ibidem – Nona Parte –
Cap IX – § 10). (Higino)
[4] HONORÉ DE BALZAC – Alguns indivíduos são como o zero. Eles
precisam de um algarismo que os preceda e sua nulidade adquire, então, um valor
decuplicado. (Higino)
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H