Quarta-feira, 5 de março de 2025 - 07h45
Bagé, 05.03.2025
Continuando
engarupado na memória:
Tribuna da Imprensa n° 4.312, Rio, RJ
Segunda-feira, 30.03.1964
A Renúncia
de Jango
O sr. João Goulart não
é mais o presidente da República. Renunciou voluntariamente em favor do CGT, do
Partido Comunista, dos grupos mais radicais de esquerda. Quem comanda o País
são alguns marinheiros sublevados, são os representantes do Partido Comunista
enquistados em alguns sindicatos, e nos postos chaves do governo, são os
comuno-carreiristas, são os “nacionalistas”,
são alguns elementos minoritários das três Armas, precisamente os de pior
reputação, sem passado, sem credenciais e sem tradição.
O maquiavelismo de
subúrbio de S. Exª teria que dar nisso. Cansamos de alertá-lo para os
resultados a que o seu excesso de habilidade levaria o País. Dotado de uma
espantosa intuição política, mas nem a menor base intelectual, histórica,
ideológica ou filosófica, o sr. João Goulart teria que ser engolido pelos
grupos subversivos que se serviram dele fingindo que serviam aos seus
objetivos.
Tendo chegado ao poder
pela renúncia de Jânio, Jango renuncia por sua vez 30 meses depois, deixando o
País entregue ao caos e à anarquia, sem liderança em nenhum setor, com o
princípio da disciplina e da hierarquia deliberadamente subvertido, com as
classes armadas mais perplexas do que manietadas, com as forças econômicas mais
apavoradas do que desarticuladas, com o povo muito mais inquieto do que satisfeito,
com o País à beira da guerra civil.
Nesta hora em que
Jango renuncia efetivamente aos seus poderes constitucionais, deixando-se
conduzir por meia dúzia de pelegos boçais e por alguns militares e “juristas” espertos demais, os alhos
inquietos da Nação se voltam para o Congresso.
É dali, é do povo
representado pelos seus legítimos procuradores que são os deputados e
senadores, que deve surgir a solução salvadora, que evitará que o País se
transforme numa nova Hungria, numa outra Tchecoslováquia, numa sangrenta e
quase inacreditável Cuba.
Não é mais possível
transigir com a indisciplina, com a subversão, com a sedição, com a traição ao
País.
Depois de
restabelecida a ordem: depois de restabelecidas as prerrogativas
constitucionais dos Poderes: depois que o Executivo abandonar a sua louca ideia
de governar por decretos com objetivo mais do que evidente de marginalizar o
Congresso: depois que restaurada a dignidade das Forças Armadas atingida pelas
manobras, de meia dúzia de carreiristas comunistas: depois que a vida econômica
se livrar do fantasma da comunização: depois que a intervenção de órgãos
ilegais como o Partido Comunista e o CGT for debelada: depois que enfim a
loucura de alguns momentos ceder lugar à serenidade de sempre, então será hora
de pensar nas reformas, nas reivindicações legitimamente expostas, na
integração do maior número de cidadãos na vida efetiva do País.
Enquanto perdurar o
caos e a anarquia não se pode pensar em reformas. Ou melhor: a única reforma
que o momento exige é a reforma de mentalidade, é a reforma de métodos, e a
reforma de homens. Não se trata nem de discutir ou de votar o “impeachment” do presidente da República,
pois ele já renunciou voluntariamente, não ocupa mais o cargo de presidente da
República nem DE FATO nem DE DIREITO.
As inconstitucionalidades praticadas pelo
sr. João Goulart são gritantes, não necessitam nem de Juristas para
caracterizá-las, pois elas podem ser ressaltadas e definidas por qualquer
estudantezinho do primeiro ano de Direito. Desde que deliberadamente violou a
independência dos Poderes, desde que conscientemente invadiu a área do
Legislativo, desde que se arrogou o direito de praticar atos que a Constituição
lhe proíbe expressamente, o sr. João Goulart deixou de ser o presidente
Constitucional da República.
De Fato o sr. João Goulart já não manda
mais nada, pois é prisioneiro de um triunvirato composto por Assis Brasil,
Assis Brasil e Assis Brasil. Subordinados a este, e cumprindo suas ordens,
espoletas e inocentes úteis do tipo de Darci Ribeiro, Osvino, Valdir Pires,
Crisanto, Dante Pelacani, Osvaldo Pacheco, Hércules Correia, Luís Carlos
Prestes, Aragão, Abelardo Jurema, e órgãos subversivos e ilegais como o Partido
Comunista e o CGT.
Ou o Congresso reage agora e devolve o CGT
e o Partido Comunista aos limites da sua ilegalidade, ou teremos jogado fora
com consequências imprevisíveis a nossa liberdade, a nossa independência, o
direito de decidir por nós mesmos, e o caminho que queremos trilhar no futuro.
Se o Congresso restaurar a legalidade no
País, AS FORÇAS ARMADAS ESTARÃO INCONDICIONALMENTE AO SEU LADO. Não importa o
que se diga, o que os porta-vozes do governo, espalhem, os comunistas
sussurrem, ou alguns traidores mais afoitos proclamem em voz alta. A VERDADE É
QUE AS FORÇAS ARMADAS ESPERAM A DECISÃO DO CONGRESSO E HÃO DE CUMPRI-LA SEM UM
MINUTO DE HESITAÇÃO.
JANGO está superado.
Como Instrumentos do Poder, tem apenas os palácios, mais ou menos como
mensagem, a capacidade de requisitar aviões para os seus intermináveis passeios
de fazenda a fazenda, e a sua imensa capacidade de se enganar pensando que está
enganando a todos. Não tem mais nem o direito ao tratamento de Excelência, pois
é um pobre coitado que trocou os poderes que já tinha pela louca ideia de que
se poderia transformar em ditador. Um homem que pensa que pode cavalgar o
Partido Comunista, coisa que ninguém conseguiu no mundo todo, ou é um
irresponsável ou um primário. E o sr. João Goulart é as duas coisas. A sorte
está lançada. Os próximos dias serão decisivos. A iniciativa está com o
Congresso, que tem a cobertura total da Nação e das Forças Armadas. Do seu
poder de discernir, do seu poder de agir, do seu poder de resolver dependerão
os rumos deste País.
Oficiais não Transigem na Disciplina
Mais de três mil
oficiais do Armada reuniram-se, secretamente, no Clube Naval para discutir se
acatariam ou não as ordens do novo ministro da Marinha, almirante Paulo Mário
da Cunha Rodrigues, face às circunstâncias que o conduziram à pasta e diante da
impunibilidade dos marujos revoltados.
À reunião, onde foi
vetada a presença de repórteres e fotógrafos, compareceram o sr. Augusto do
Amaral Peixoto, o Marechal Augusto Magessi e até o Coronel Ardovino Barbosa.
Apesar do sigilo, transpirou que a oficialidade não se renderá à não punição
dos marujos indisciplinados.
Sobressalto
Às 20h30, os oficiais
que se encontravam reunidos suspenderam a Assembleia com gritos de regozijo e
palmas, descendo de imediato, alguns às carreiras, as escadarias do Clube. O
sr. Augusto do Amaral Peixoto, que também saiu na mesma ocasião, revelou à
imprensa que o II Exército se levantara e que, por isto, fora suspensa a
reunião para que todos pudessem chegar até suas Unidades e aguardar o
desenrolar dos acontecimentos. Após a saída do Sr. Amaral Peixoto, diferentes
versões foram ouvidas entre as rodas de oficiais do lado de fora do Clube sobre
a notícia do levante do II Exército. Alguns diziam que a notícia tinha sido
mandada espalhar pelo sr. João Goulart para que a reunião se dissolvesse.
Outros diziam que fora, também, uma jogada de Jango para que “nos apresentássemos nas Unidades e Navios e
lá chegando eles nos prendessem”. A oficialidade fazia os seus comentários
em grupos de quatro ou cinco e quando percebia a aproximação de qualquer
repórter procurava afastar-se ou mudar de assunto.
Magessi Solidário
O Marechal Augusto
Magessi, ao sair do Clube Naval foi abordado pela imprensa e declarou:
Não posso dizer nada quanto às decisões da
oficialidade da Marinha no que diz respeito à crise do momento. Minha presença
aqui foi para autenticar o meu manifesto e hipotecar a solidariedade do Clube
Militar aos companheiros da Armada. O Exército, Marinha e Aeronáutica só
divergem em seus fardamentos mas a disciplina é a mesma, não sendo portanto
justo que fiquemos alheios aos acontecimentos. Na reunião agora realizada
revelei aos oficiais da Marinha que hoje convocarei uma reunião no Clube
Militar e depois darei uma Nota oficial esclarecendo a nossa posição diante da
crise.
Assembleia Permanente
Mantendo a fidelidade ao
sigilo dos assuntos discutidos na reunião a oficialidade, já à zero hora de
hoje, começou a voltar para o Clube Naval onde ficou em Assembleia permanente
durante toda a madrugada.
# Aragão Perdeu Pose e
foi Preso Mesmo #
A lenda da bravura do almirante Aragão
terminou com os incidentes da Semana Santa. Na Marinha ninguém tinha dúvida da
sua covardia. O almirante comandante dos Fuzileiros tem apenas arrogância, e só
grita quando está cercado dos seus capangas. Eis um episódio que mostra
seguramente quem é o almirante Aragão.
Depois de ficar escondido por mais de 24
horas, com medo de ser preso, o almirante Aragão, com o movimento dos
marinheiros já vitorioso, e empossado o almirante Paulo Mário, indicado por
ele, foi assistir à posse do novo ministro. Quando ia entrando no Ministério da
Marinha, o capitão Clinton de Queirós Barros encostou-lhe a metralhadora na
barriga e deu-lhe voz de prisão. Já assustado, o almirante pediu-lhe que
tirasse a metralhadora, e tentou aparentar coragem, dizendo: “Isso não dispara sozinha”. Respondeu-lhe
o Capitão de Fragata: “Na mão de macho
dispara mesmo, almirante”.
Fingindo despreocupação o almirante Aragão
tentou seguir em frente, mas esfriou completamente quando o capitão Clinton
disse-lhe com a voz mais dura possível:
Se o senhor der um novo passo, almirante será o
último;
Vendo que o capitão Clinton não estava
brincando, o comandante dos Fuzileiros saiu pela tangente afirmando que só
podia ser preso por um outro almirante. Foi chamado então o almirante Paulo Guilhobel
que lhe deu voz de prisão levando-o para o 7° andar do Ministério onde ele
ficou durante duas horas, debaixo de insultos de muitos oficiais. Depois de
libertado o almirante tentou posar de machão, dizendo que não havia sido preso.
Mas foi e em condição nada honrosa para um oficial general.
Na sexta-feira, em conversa com amigos e
capangas o almirante Aragão afirmou que o capitão Clinton não perde por esperar
“pois ele vai ver o que vai lhe acontecer”.
Ontem no Clube Naval foi discutida essa questão. E ficou resolvido que todas as
garantias serão dadas ao capitão Clinton de Queiroz Barros. Se alguma coisa lhe
acontecer dose igual, seja o que for, será aplicada imediatamente ao almirante
Aragão.
Outro episódio que demonstra que o
almirante Aragão além de covarde é primário: o chefe da 3ª seção, Capitão de
Mar e Guerra, Roberval Pizarro Marques, preparou um manual secreto contendo normas de
adestramento contra a guerra revolucionária Levou
esse manual ao almirante Aragão que o assinou. Isso foi há uns 10 dias atrás.
Logo que se tomou conhecimento desse manual, oficiais “nacionalistas” procuraram o almirante Aragão revoltados. E
espinafraram-no por ter assinado um documento que seria usado contra ele mesmo.
Apavorado, o almirante foi ao ministro
Sílvio Mota e comunicou-lhe que não poderia cumprir o documento. Perguntou-lhe
o ministro:
Como não pode cumprir se ele está assinado por você
mesmo?
Respondeu o comandante dos Fuzileiros:
Fui iludido.
De volta ao seu gabinete, desesperado, o
almirante se lamentava exclamando em altos gritos:
Sou um desgraçado. E agora o que é que vão dizer de
mim os homens das Ligas Camponesas?
É esse o homem que o sr. João Goulart
mandou perdoar e renomear para o comando do Corpo de Fuzileiros.
Ainda sobre a crise que esta estarrecendo
todo o País: um almirante da ativa, se for preciso eu publico o seu nome, logo
depois da demissão de Sílvio Mota, foi no gabinete do ministro, e disse-lhe
cara a cara:
Você é o responsável por tudo o que está
acontecendo. Foi a sua covardia, a sua consideração com homens como Aragão e
outros que levaram a situação ao ponto de hoje. Você é o coveiro da Marinha.
A primeira medida do Capitão de Mar e
Guerra, comunista, Paulo Werneck que é o homem indicado para chefiar o gabinete
do “ministro” Paulo Mário e
teleguiado foi determinar que todos os oficiais ao entrarem no Ministério da
Marinha sejam revistados e desarmados. Como é natural a medida causou revolta
na Marinha. Paulo Mário passou o sábado e o domingo no seu gabinete do Ministério.
Só foi visitado por um almirante: o tristemente célebre Cândido Aragão. Isso dá
uma ideia do prestígio do novo ministro da Marinha.
# Finanças e Negócios
#
Há Outras Coisas, Presidente
Ontem resumimos para V Exª sr. presidente
três importantes itens do retrospecto anual elaborado pela “Conjuntura Econômica” da Fundarão
Getúlio Vargas. Por ali se viu:
1° Que o Brasil em vez de progredir sofreu um
atraso no seu desenvolvimento;
2° Que os brasileiros dispuseram em 1963 de
menor quantidade de alimentos que em 1962;
3° Que a atividade industrial cresceu menos que
nos anos anteriores e que, pela primeira vez, nos últimos 15 anos diminuiu o
consumo de energia elétrica, o que não é nada lisonjeiro para um País que se
diz em desenvolvimento.
Vamos contar hoje mais alguma coisa para
seu conhecimento e dos leitores deste jornal:
1) A indústria automobilística, em 1963, quebrou seu
ritmo de aumento registrando-se uma queda de 9% na produção;
2) A indústria têxtil permaneceu estagnada. O que
significa menos tecidos para o povo vestir, pois a população aumentou;
3) Registrou-se sensível redução na oferta de empregos
na indústria. Essa deve ser uma importante revelação para V. Exª que é um
presidente trabalhista.
4) O balanço de pagamentos acusou um “déficit” de 220
milhões de dólares. A bem da verdade deve-se dizer que esse é um dado superior
ao ano anterior, quando bise “déficit” foi de 360 milhões. Entretanto o governo
foi beneficiado pela conjuntura internacional do mercado de café;
5) O dólar subiu de aproximadamente 770 cruzeiros para
1.400 em dezembro continuou a subir até 1.700 depois disso.
6) O desequilíbrio inflacionário registrou um novo
“record”. Enquanto o Plano Trienal previa emissões da ordem de 34% e aumento do
custo de vida em torno de 25% os verdadeiros resultados foram 74,7°: e 80%;
7) As emissões de capital foram inferiores à taxa de
desvalorizarão da moeda. Em termos reais, diminuíram essas emissões.
Entretanto para que não se diga que a “Conjuntura” é uma revista de oposição,
devemos anotar que durante o governo de V. Exª continuou a acentuada expansão
nos transportes terrestres inclusive a rede pavimentada aumentou em 18%. Mas
para um presidente que pretende dar ao País novas estruturas esse resultado é
mesquinho. V. Exª não acha que já é tempo de colocar outra vez esse País em
andamento ou, se lhe faltarem condições políticas para isso, apresentar uma
solução qualquer? Sim, porque deixando que o País prossiga nesse declive, já
agora comprovado pelos números, V. Exª vai acabar dando razão ao professor Gudin.
(*) Hiram Reis e
Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor,
Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
Link: https://youtu.be/9JgW6ADHjis?feature=shared
Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989);
Ex-Vice-Presidente
da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;
Ex-Professor do
Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
Ex-Pesquisador do
Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do
Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4°
Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS);
Ex-Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO);
Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Membro do
Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP)
Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS);
Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG);
Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN);
E-mail: hiramrsilva@gmail.com
Bagé, RS, 05.03.2025 Mais uma vez tenho a honra de repercutir um artigo de meu Mestre Higino Veiga Macedo. Cidadão ou Indivíduo!(Cel Eng Higino Veiga
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – XLI
Bagé, 28.02.2025 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 4.310, Rio, RJQuinta-feira, 26 e Sexta-feira 27.03.1964 Lei de Segurança
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – XL
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Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – XXXIX
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