Sexta-feira, 5 de abril de 2024 - 08h05
Bagé,
05.04.2024
Libertos da Barra de
Serinhãem (14.10.1855)
Breve Exposição Acerca dos Fatos Ocorridos Antes e Depois
da Apreensão dos Africanos Efetuada na Barra de Serinhãem, em Outubro de 1855,
por Gaspar de M. V. de Drummond.
Typographia Universal, Recife, 1856
Breve Exposição
Oh turbulenta, e mordaz víbora!
Cujo agudo dente envenenado
Atassalha ([1]) a verdade pervertendo
Ainda o mais probo, e mais honrado.
No dia 11 de outubro de 1855, o Coronel Gaspar de Menezes Vasconcellos de Drummond
estando gravemente enfermo no seu Engenho Trapixe, sito no Termo de Serinhãem –
foi surpreendido pela voz de um indivíduo desconhecido que chegou a porta dessa
sua casa térrea – e lhe disse:
Sr. Coronel, eu
vinha ajustar com, V. S. para tirar um carregamento de pedras na Ilha de Sancto
Aleixo, próxima da Barra de Serinhãem.
Ao que respondeu-lhe o Coronel
Menezes que não era dono dessa Ilha, a qual pertencia ao Inglês João Donneley.
Então aquele indivíduo replicou:
Sr. Coronel desejo
dar-lhe uma palavra em particular.
O que
animou-o à levantar-se, e ir ouvi-lo em alguma distância da mesma casa. Aí
declarou-lhe esse indivíduo: que à sua consignação trazia de Angola um carregamento de africanos, e como o mesmo
Coronel Menezes lhe respondesse que não podia ser-lhe destinado tão
torpe, e criminoso negócio, por que nunca nele foi interessado.
O dito indivíduo, que era o
Capitão, importador dos africanos perguntou-lhe se não era o Coronel João
Manoel de Barros Wanderley, com quem falava, e à cuja casa havia pedido ao seu
condutor Manoel Fidellis do Nascimento para o levar – e obtendo em resposta que
estava falando com o Coronel Gaspar de Menezes Vasconcellos de Drummond, o qual
ocupava o emprego de Delegado de Polícia daquele lugar, o mencionado Capitão
ficou todo tremulo, e aterrorizado lançou-se aos pés do Coronel Menezes e
exclamou – foi aquele homem [apontando para Manoel Fidellis do Nascimento] que
me enganou!
Depois dessa cena, o Coronel
Menezes, que desde 1849, não se achava em exercício daquela Delegacia por suas
continuas e graves enfermidades, como é bem sabido, e ainda nessa mesma ocasião
estava muito incomodado de saúde começou à vacilar sobre o emprego das
providências mais acertadas para evitar, e apreender o contrabando, e, por
isso, tratou de demorar o Capitão em sua casa enquanto mandava chamar seu filho
o Dr. Antônio de Vasconcellos Menezes de Drummond, que residia no Engenho Anjo
[distante quase meia légua da predita sua casa no Engenho Trapixe] para com ele
tomar conselho, e direção à este respeito.
O dito seu filho não foi então
encontrado em sua residência por ter ido à Villa de Serinhãem, como advogado,
para audiência do respectivo Juízo Municipal, e por isso ali não apareceu
durante todo esse dia 11 de outubro de 1855. Apesar dos meios empregados para
tranquilizar o Capitão, e da vigilância para que ele se não evadisse, quando o
Coronel Menezes o procurou, na manhã do dia 12, já não o encontrou em sua casa,
com o que muito se afligiu, e então tratou de dar imediatamente todas as
medidas, as quais havia demorado somente à espera do mesmo seu filho.
Nesse mesmo dia 12 de outubro
de 1855, ao meio dia pouco mais ou menos tendo chegado o dito Dr., Drummond à
casa de seu Pai o Coronel Menezes, depois de já haver desaparecido dali o
Capitão do Palhabote ([2]), e avista da referência desses fatos que
lhe fora feita buscou aconselhar a seu pai para efetuar logo a apreensão.
Cedendo pois o Coronel Menezes à essas instâncias de seu filho Dr. Drummond,
ergueu-se do leito em que jazia ainda mais enfermo, e prostrado pela terrível
impressão resultante dessas ocorrências, assumiu a Delegacia, e passou a dar as
mais prontas providências em ordem a consumar a predita apreensão.
À esta crítica situação
acrescia que o única autoridade em exercício no Termo de Serinhãem era o
respectivo Juiz Municipal Suplente – Dr. Manoel de Barros Wanderley, o qual
estava com jurisdição plena avista do art. 8 do Decreto de 24 de Maio de·1845
[por se achar o efetivo no Recife com licença, o Dr. Theodoro Machado Freire
Pereira da Silva] e era irmão legítimo do Coronel João Manoel de Barros
Wanderley, consignatário do mencionado Palhabote, e por isso pessoa muito
suspeita, a tal respeito.
Sendo que dos demais empregados
policiais uns estavam ausentes dos seus encargos, e outros impedidos por
moléstia, isto é, estava o Termo em perfeita acefalia como se evidencia do
documento junto sob n° 1.
Sobreleva ainda atender que no
Termo de Serinhãem não havia naquela época um só soldado; apenas existia na
cidade do Rio Formoso [distante quatro léguas da Barra daquele nome] um
destacamento de linha. O Coronel Menezes superou todas essas não pequenas
dificuldades, concentrou todas suas forças, fez um esforço imenso para efetuar
aquela apreensão, e prestar tão importante serviço ao País, salvando da escravidão
perpétua aqueles infelizes africanos que estavam ameaçados de infalível
escravidão.
Nesse louvável empenho o
Coronel Menezes, de comum acordo com seu filho Dr. Antônio de Drummond oficiou
ao Inspetor de Quarteirão da Barra de Serinhãem – Manoel Elias Salgado
ordenando-lhe mui expressamente, que sem perda de tempo reunisse a maior força
possível de paisanos, e com ela se fosse postar a bordo do mesmo Barco afim de
evitar qualquer desembarque, e extravio.
De feito, esta força ali
permaneceu durante aquela noite até a chegada de outra que na mesma ocasião
requisitou ao Comandante de Destacamento, existente no Rio Formoso,
declarando-lhe logo – que era para esse fim, e recomendando-lhe que dali
seguisse imediatamente e com toda reserva para Barra de Serinhãem, mas que se
no trajeto encontrasse algum inconveniente fosse com ele próprio entender-se no
Engenho Trapixe, à qualquer hora como praticou, donde o fez partir, dando-lhe
sem demora um guia, e as mais circunstanciadas e completas instruções, segundo
depôs o mesmo Capitão no processo agora instaurado contra o dito Coronel
Menezes, e adiante se vê no documento n° 15.
No dia seguinte, 13 de outubro
de 1855, o Coronel Menezes ainda não restabelecido de sua enfermidade foi à
Barra de Serinhãem em companhia do Escrivão da Delegacia, e de seu filho o Dr.
Antônio de Drummond, e aí fez lavrar todos os termos da apreensão, redigir, e
expedir toda correspondência oficial sobre ela ao Presidente da Província, e ao
Chefe de Polícia da Província.
Cumpre porém observar que no
ato de contar, e achar 162 africanos na Barra de Serinhãem foi o primeiro a
declarar publicamente, que deles tinha havido roubo ou extravio pois que o
Capitão lhe dissera que trazia 212 africanos, e apenas tendo morrido um na viagem,
e outro ao chegar àquele porto faltavam, por conseguinte, 48.
Essa mesma circunstância o
Coronel Menezes não ocultou àquelas autoridades, e antes dela fez expressa
menção naquela sua comunicação, o que prova assaz, a lealdade, e lisura do seu
proceder, como tudo consta dos mesmos ofícios anexos ao predito processo nos n°
2, 3 e 4.
Essa importante apreensão
efetuada pelo Coronel Menezes, com tamanho sacrifício pessoal, em tão crítica
emergência, e sem recursos alguns mereceu os mais subidos elogios, e agradecimentos
abaixo transcritos sob n° 5, 6, e 7, do Governo Imperial, do de Inglaterra, e
do Presidente da Província. [...]
Recife, 9 de outubro de 1856.
O Coronel, Gaspar de Menezes Vasconcellos de Drummond. (DRUMMOND)
Bibliografia
DRUMMOND, Gaspar de Menezes Vasconcellos de. Breve Exposição Acerca dos Factos Ocorridos
Antes e Depois da Apreensão dos Africanos: Efetuada na Barra de Serinhãem em
Outubro de 1855 – Brasil – Recife, PE – Typographia Universal, 1856.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós
(IHGTAP)E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H