Sexta-feira, 12 de abril de 2024 - 08h10
Bagé,
12.04.2024
O Imbróglio chamado “Prince of Wales”
Diário de Pernambuco, n° 13
Pernambuco – Sábado, 17.01.1863
Ministério dos Negócios Estrangeiros
Notas Trocadas Entre o Ministro dos Negócios Estrangeiros e
o Ministro Plenipotenciário de S.M.B.
Primeira
Petrópolis, 05.12.1862.
Sr. Marquês,
O governo de Sua Majestade
deu-me ordem de dirigir a V. Exª a seguinte comunicação relativa aos nefastos
acontecimentos que se seguiram ao naufrágio do navio inglês “Prince of Wales”.
Este naufrágio, que ocorreu
provavelmente no dia 7 ou 8 de junho do ano próximo passado ([1]), chegou primeiro ao
conhecimento do Cônsul de Sua Majestade no Rio Grande do Sul no dia 13 daquele
mês, por intermédio do Sr. Bento Venâncio Soares, magistrado do Distrito de
Albardão, que declarou que alguns corpos haviam sido lançados à praia na
proximidade de sua residência, mas assegurou não ter notícia do naufrágio.
Ulteriores pesquisas,
entretanto, induziram o cônsul de Sua Majestade a suspeitar que um navio
britânico tinha naufragado, e em consequência disso partiu, no dia seguinte,
para a Costa do Albardão com o juiz municipal e um pequeno número de guardas da
alfândega, e chegaram à casa do Sr. Bento Soares, onde foram recebidos com
evidente relutância por sua filha, na ausência de seu pai.
Na seguinte manhã, cedo,
visitaram eles o lugar do naufrágio e acharam a praia juncada dos destroços do
navio e de parte de sua carga, tais como barris, caixas de marinheiros etc.;
alguns desses objetos tinham sido evidentemente despedaçados sobre a praia,
porém outros haviam sido evidentemente abertos há pouco, e roubado o seu
conteúdo. O envoltório de alguns volumes estavam complemente secos, como se
tivessem sido trazidos a salvo para a praia em botes.
Verificou-se que tinham sido
descobertos dez corpos, alguns dos quais muito longe da praia; não apareceu,
porém, nem dinheiro, nem relógios. Os objetos, sem avaria, pertencentes ao
carregamento do navio naufragado, foram encontrados na casa do Sr. Bento
Soares.
Não tendo o subdelegado do
distrito procedido a exame nos cadáveres, Mr. Vereker exigiu vê-los, o que foi
energicamente recusado, de maneira muito suspeita, pelo Inspetor do Distrito;
que fora encontrado na praia acompanhado de uma força armada. Então o Sr.
Vereker voltou para o Rio Grande e solicitou auxílio para que fossem os dez
cadáveres conduzidos para ali, a fim de serem examinados e sepultados. Foi-lhe
o auxílio prestado, posto que nessa ocasião o Sr. Vereker fosse obrigado a
fazer todas as despesas; porém só quatro cadáveres chegaram ao Rio Grande.
Subsequentemente fizeram-se no
Rio Grande exames sobre os cadáveres, bem como sobre aqueles no Albardão, neste
último lugar pelo subdelegado Gonçalves, hoje demitido, ajudado pelo cunhado do
sr. Soares, o sr. Pereira de Sousa, que se diz ter capitaneado um bando de
dilapidadores dos salvados.
Apenas um dos cadáveres foi
desenterrado, os outros foram achados insepultos e em estado adiantado de
putrefação. Em todos os exames se declarou efetivamente que eram cadáveres de
pessoas – afogadas – apesar de haverem circunstâncias muito suspeitas, visto
serem encontrados alguns deles despojados de suas roupas e longe do lugar onde
chega a maré nas águas altas.
Depois de repetidas e enérgicas
solicitações do Sr. Vereker para que se fizesse uma minuciosa pesquisa, ouviu
ele dizer por fim, no dia 18 de setembro, que um homem tinha sido convicto de
ter em seu poder objetos roubados dos salvados. O Presidente da Província
declarou ao mesmo tempo em que os principais culpados haviam fugido, e fez ver
a grande dificuldade de induzir os habitantes a fazer qualquer declaração sobre
o caso. Mais tarde, em dezembro, as mesmas razões foram apresentadas como
justificação do infrutífero resultado de uma ulterior pesquisa, e conquanto
fosse admitido, desde o princípio, que os salvados haviam sido roubados, foi
somente em agosto deste ano – quatorze meses depois de ter tido lugar o
naufrágio, – que V. Exª informou que, em consequência de novos inquéritos,
haviam sido demitidos dois empregados e acusados onze pessoas de roubo de
salvados. Mas declara-se que o Sr. Bento Soares está livre de toda a acusação e
não foi processado. O Governo de Sua Majestade julga impossível que Soares não
tivesse conhecimento do que ocorrera: em verdade é forte a presunção de que ele
participou do roubo.
V. Exª teve a bondade de dizer
que o Governo Imperial se convencera de que pessoa alguma da tripulação do
navio fora assassinada. O Governo de Sua Majestade não está de modo algum
convencido disso. É forte a presunção de que as pessoas, cujos corpos se diz
que foram enterrados, mas cujas sepulturas ninguém pode mostrar, foram
assassinadas. Mas esta questão de assassinato é uma daquelas que poderia ter
sido inteiramente liquidada por um exame imediato sobre todos os corpos das
pessoas da tripulação, e por uma pronta e diligente investigação no lugar.
O Governo de Sua Majestade
considera inteiramente inadmissível as alegações que V. Exª, no intuito de
declinar a responsabilidade, exibiu a respeito de ser deserta e inóspita a
costa, onde estes ultrajes foram praticados por súditos brasileiros sobre estrangeiros
inermes, bem como não julga procedente a alegação das causas, porque depois de
muitas delongas não pôde o Governo Imperial descobrir os culpados.
É chegada a época de reclamar o
Governo de Sua Majestade uma indenização pela dilapidação dos salvados e dos
corpos; e ele deve exigir esta indenização do Governo Brasileiro, como
responsável das perdas ocasionadas pelo culpável procedimento das suas
autoridades.
Em consequência recebi ordem
para exigir do Governo Imperial uma indenização pelas perdas que sofreram os
donos do “Prince of Wales”, e pelo roubo total dos salvados e dos objetos
pertencentes à tripulação. O proprietário reclama:
Pelo carregamento e
provisões: .......... £ 5.500.00.0
Pelo frete:
........................................ £
1.025.19.0
Total
............................................... £
6.525.19.0
O Governo de Sua Majestade não
se responsabiliza pela exatidão da quantia reclamada, pertencendo ao dono
produzir uma conta em devida forma do valor do carregamento e provisões.
Logo, porém, que o Governo
Imperial admita o princípio, o Governo de Sua Majestade acha-se preparado para
aceitar um arbitramento justo sobre a questão, pelo que diz respeito à
importância da indenização que se terá de satisfazer, e deixará igualmente ao árbitro
ou árbitros o determinarem a importância da que se deverá dar aos parentes das
pessoas de bordo, cujos corpos foram despojados dos objetos que lhes
pertenciam.
Em conclusão, recebi ordem para
declarar que o Governo de Sua Majestade, tendo em atenção a demora e
procrastinação extraordinária por parte das autoridades brasileiras neste grave
negócio, deve insistir em que se trate sem perda de tempo deste arbitramento, e
seja ele decidido com a brevidade possível.
Aproveito-me da oportunidade
para renovar a V Exª as expressões de minha alta consideração.
A S. Exª o Marquês de Abrantes,
Ministro dos Negócios Estrangeiros de S. M. o Imperador do Brasil.
W. D. Christie (DIÁRIO
DE PERNAMBUCO, N° 13)
Bibliografia
DIÁRIO DE PERNAMBUCO, N° 13. Ministério dos Negócios Estrangeiros Notas Trocadas Entre o Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Ministro Plenipotenciário de S.M.B. – Brasil – Recife, PE – Diário de Pernambuco n° 13, 17.01.1863.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989);
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato
Grosso do Sul;
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS);
Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO);
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS);
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola
Superior de Guerra (ADESG);
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN);
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós
(IHGTAP)E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – II
Bagé, 29.11.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 174, Rio de Janeiro, RJSábado, 27.07.1963 Processo em Marcha O Chefe da
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – I
Bagé, 27.11.2024Nos parece que Alto Comando do Exército Brasileiro está agindo de forma politicamente persecutória […]. Os Oficiais Superiores, que
Estado - Entendendo a Definição
Bagé, 18.11.2024Repercuto mais um artigo de meu caro Amigo, Irmão e Mestre Coronel de Engenharia Higino Veiga Macedo. Estado - Entendendo a Definição
Bagé, 06.09.2024 Mais uma vez tenho a hora de repercutir um artigo de meu caro Amigo, Irmão e Mestre Higino Veiga Macedo. Salve Sapador(Higino Veiga