Segunda-feira, 26 de junho de 2023 - 06h05
Bagé, 26.06.2023
Valquírias
Americanas
Antônia (Jovita) Alves Feitosa – Parte IV
Vamos, a seguir, repercutir algumas
reportagens dedicadas à nossa “Voluntária
da Pátria”:
Correio Paulistano n° 2.843
São Paulo, SP –
Sexta-feira, 17.11.1865
O Brado da Virgem
(Recitativo Patriótico, Oferecido às Senhoras
Brasileiras por Francisco Muniz Barreto)
À Guerra, à Guerra meu Brasil ingente!
Oh! Não desmente o teu
passado, não!
À Guerra, à Guerra! lá no
Sul teu povo
Levante um novo marcial padrão!
Ouve, a bombarda ([1])
a combater te chama...
Bem alto a fama te apregoa
já:
De Riachuelo e Paysandu na
história
Já tua glória eternizada está.
Teus bravos filhos à peleja
corram;
Vençam, ou morram; que assim
quer o céu:
Quem os gemidos da mãe
Pátria escuta,
E foge à luta, de alto crime é réu.
Rompa, espedace o brasileiro
gládio,
Dos seus paládio, ao
paraguaio arnês ([2])!
Brazil! A afronta, que hás
sofrido, prava ([3]),
No sangue lava do feroz López!
Com essa de Palas ([4]),
multidão galharda,
Que vai a farda da Milícia
honrar,
Voa às muralha Humaitá
derruba
Com a crespa juba, meu leão sem par!
Perigos, refregas denodado
arrosta!
Castiga, prostra de Assunção
o bei ([5])!
Para ensinar-te da vitória
os trilhos,
Com seus dois filhos lá está teu Rei.
Rasgo sublime de amor santo
e fundo
Pedro Segundo praticou por
nós
Lá troca o cetro pela régia
espada,
Que herdara honrada, de seu Pai e Avós.
À sua Pátria sacrifica a
vida,
Vendo-a invadida pelo
inimigo audaz;
Esposa, filhas, tudo
esquece, e parte,
Anjo de Marte, como o é da Paz.
Pátria, os teus brios mais e
mais se expandam!
Ao Sul nos mandam Natureza e
Deus:
À voz de ‒ Guerra ‒ que nos
vem de cima,
Nenhum se exima dos bons filhos teus.
Êmulos surjam de Marcílio
Dias
Nessas porfias de mavórcio ([6])
ardor;
Cada um dos nossos, na naval
peleja,
Barroso seja no imortal valor.
Virgens e donas da Brasileia
terra,
Também à guerra devereis
correr,
Se por ventura masculinos
braços
Forem escassos pra o Brasil vencer.
Mães, vossos filhos,
exortai, no entanto,
Ao prélio Santo, que nos vai
remir
Dessa invasão do paraguaio
corvo,
Que a fome, torvo ([7]),
quer em nós nutrir.
Irmãs, esposas, ao combate,
ardidos.
Vossos maridos, deixai ir e
irmãos!
Oh! pelo Céu! não vos tomeis
de amores,
Nem de temores pueris e vãos!
Eia, patrícias! Varonil
pujança.
Não conte a França em suas
filhas só;
Dela e de Roma feminis
proezas
Obrai, acesas do Brasil em pró!
Segui o exemplo, que,
valente, abre
Jovita, o sabre a manear
gentil;
Ide com ela, de clavina ([8])
ao ombro,
Fazer o assombro do gaúcho vil!
Brasília ([9])
guarda nacional briosa,
Que já famosa em teu civismo és,
Vai retomar ao Paraguai teu solo,
Da hidra o colo, machucar aos pés ([10])!
Vai! Lá te espera o nosso sábio e justo
Irmão augusto e desvelado pai...
Por ti milícia cidadã bendita,
A Pátria grita: defendê-la
vai!
Brazil! Ao insulto inesperado, amargo,
Do teu letargo despertaste enfim...
Em ti não mais inércia tal se aponte;
Não mais te afronte o estrangeiro
assim!
Não mais te oprimam dolorosas fases,
Formoso Oásis dos amores meus!
Longe discórdias e fatal cobiça!
Pátria! Justiça, Monarquia e Deus! (CP N° 2.843)
O escrito Joaquim Maria Machado de Assis manifestou sua sexista
opinião, concorde com a sociedade da época, a respeito da participação das
mulheres na Guerra do Paraguai:
Diário do Rio de Janeiro n° 32
Rio de Janeiro, RJ –
Terça-feira, 07.02.1865
Folhetim - Ao Acaso
(Revista da Semana)
Dedico este
folhetim às Damas. [...]
Mas não é neste ponto de vista que eu venho hoje falar das
damas. Deixemos em paz os amantes e os moralistas. Não entrais hoje neste
folhetim, minhas senhoras, como Julietas ou Desdemonas ([11]), e sim
como Espartanas, como Filipas de Vilhena ([12]), como
irmãs de caridade.
A bem dizer é uma reparação. Já falei dos “Voluntários”; já consagrei algumas
palavras de homenagem aos corações patrióticos que, na hora do perigo,
esqueceram-se de tudo, para correr à defesa da Pátria. Mas, nada escrevi a
respeito das damas, e quero hoje reparar a falta, começando por aí e dedicando
às damas estas humildes colunas.
Não nascestes para a Guerra,
isto é, para a guerra da pólvora e da espingarda. Nascestes para outra Guerra,
em que a mais inábil e a menos valente vale por dois Aquiles. De qualquer modo,
ajudais os homens. Uma como mãe espartana, arma o filho e manda para a
Batalha; outras bordam uma bandeira e entregam aos soldados; outras costuram as
fardas dos valentes; outras dilaceram as próprias saias para encher cartuchos; outras
preparam os fios para os hospitais; outras juncam de flores o caminho dos
bravos.
Voltará aquele filho antes da
desafronta da Pátria? Deixarão os soldados que lhes arranquem aquela bandeira?
Entregarão as fardas que os vestem? Sentirão os ferimentos quando aqueles fios
os vão curar? [...] Não tendes uma espada, tendes uma agulha; não comandais um
regimento, formais coragens, não fazeis um assalto, fazeis uma oração; não
distribuis medalhas, espalhais flores, e estais, podeis estar certas, haverão
de lembrar quando forem secas, os feitos passados e as vitórias do País. (DRJ
N° 32)
A negativa da Secretaria de Estado
dos Negócios da Guerra, em 16.09.1865, enuviou a imagem da destemida “Voluntária” imergindo sua sedutora e
destemida figura em uma série de eventos que culminaram com um fim trágico.
Publicador
Maranhense n° 253
São Luís, MA – Terça-feira, 05.11.1867
Suicídio – Lê-se
no Jornal do Commercio: – Suicidou-se anteontem de tarde, na casa da praia do
Russell n° 43, Jovita Alves Feitosa, natural do Ceará, a mesma que viera para
esta Corte com o posto de Sargento em um Batalhão de Voluntários daquela
Província, e que tendo depois tido baixa, aqui ficou. A respeito deste trágico
acontecimento e dos motivos que levarão aquela infeliz a dar fim aos seus dias,
comunicou-nos a autoridade competente o seguinte:
Jovita entretinha há algum tempo relações com Guilherme Noot,
engenheiro da companhia “City
Improvements” morador com outro engenheiro da mesma companhia na casa
acima. Tendo finalizado o tempo do contrato que Noot tinha com a companhia, e
devendo ele partir anteontem para à Inglaterra, escreveu, no domingo, à Jovita
um bilhete em inglês, no qual despedia-se participando-lhe aquela sua intenção.
Desconhecendo a língua inglesa, e
na suposição de que aquele bilhete não continha mais do que a repetição de
cumprimentos que o mesmo lhe havia mais de uma vez dirigido em outros escritos
em português, Jovita não se deu pressa em procurar quem lho traduzisse.
Anteontem de manhã, indo alguém à
rua das Mangueiras n° 36, onde morava a infeliz, disse-lhe que Noot havia
partido no paquete inglês “Oneida”,
notícia esta que causou-lhe surpresa e desassossego tais que uma mulher que com
ela morava, temendo algum desatino da sua parte, procurou tranquilizá-la,
dizendo-lhe que talvez não fosse Verdade.
Pouco depois de 2 horas da tarde
fez Jovita chamar um carro, e vestida com todo o esmero, nele entrou, mandando
que a conduzissem à casa indicada na praia do Russell, onde chegando e sabendo
de uma preta que com efeito Noot havia partido e que seu companheiro não se
achava em casa, entrou no quarto que fora habitado por aquele a quem procurara,
e tendo pedido um envelope nele meteu alguns papeis endereçados a Noot, entregou-os
preta com a recomendação de remetê-lo, e sentou-se na cama que ali havia,
retirando-se a preta.
Às 5½ horas, vendo a preta que a
moça ainda se conservava no quarto, ali penetrou e encontrando-a deitada na
cama com a mão direita sobre o coração e parecendo presa do algum ataque,
tentou reanimá-la chegando-lhe ao nariz um vidro com água de colônia, depois do
que procurou levantá-la e viu então que a mão colocada sobre o coração apertava
um punhal nele cravado até às guardas. Foi então chamado o Dr. Façanha,
subdelegado da Glória, o qual ajudado pelo respectivo médico verificador dos
óbitos, Dr. Goulart, procedeu à autopsia no cadáver, verificando ter o punhal
penetrado na região precordial, entre a 4ª e a 5ª costela, ferindo ligeiramente
o bordo do pulmão esquerdo o indo penetrar na cavidade esquerda do coração. No
bolso esquerdo do vestido da suicida foi encontrado um bilhete por ela escrito,
declarando que ninguém a havia ofendido e que matava-se por motivos que só dela
e de Deus então conhecidos. Ao sair de sua casa Jovita despedira-se da mulher
que com ela morava, dizendo-lhe: “Adeus
até nunca mais nunca”. (PUBLICADOR MARANHENSE N° 253)
Bibliografia
CP, N° 2.843. Notícias da Expedição de Mato Grosso ‒
Brasil – São Paulo, SP ‒ Correio Paulistano, n° 2.843, 17.11.1865.
DRJ N° 32. Folhetim – Ao Acaso – Brasil – Rio de
Janeiro, RJ – Diário do Rio de Janeiro n° 32, 07.02.1865.
PUBLICADOR
MARANHENSE n° 253. Suicídio – Brasil
– São Luís, MA – Publicador Maranhense n° 253 05.11.1867
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] Bombarda:
morteiro que arremessava grandes pedras. (Hiram Reis)
[2] Arnês:
armadura. (Hiram
Reis)
[3] Prava: cruel. (Hiram Reis)
[4] Palas Arena:
deusa da sabedoria, da estratégia em batalha... (Hiram Reis)
[5] Bei:
Governador de província muçulmana. (Hiram Reis)
[6] Mavórcio: marcial. (Hiram Reis)
[7] Torvo: terrível. (Hiram Reis)
[8] Clavina: carabina utilizada pela tropa de cavalaria no século
XVIII. (Hiram Reis)
[9] Brasília: brasileira, brasiliana, brasílica. (Hiram Reis)
[10] “Aos pés do vencedor
obediente” “O colo oferece a áspera
corrente” ‒ Ode a Afonso de Albuquerque – João Ignácio da Silva Alvarenga,
1811. (Hiram Reis)
[11] Peça baseada em Otelo ‒ O Mouro de Veneza, de William Shakespeare
escrita nos idos de 1603. (Hiram Reis)
[12] D. Filipa de Vilhena, Marquesa de Atouguia, considerada, pelos
portugueses, um dos seus maiores símbolos do patriotismo. (H. Reis)
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H