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Gente de Opinião

Hiram Reis e Silva

Terceira Margem – Parte DCLXXXVII - Helmo de Freitas – Parte II


Dona Anna Rodrigues de Oliveira - Gente de Opinião
Dona Anna Rodrigues de Oliveira

Bagé, 10.01.2024

 

A Estancieira “Barbuda

Helmo de Freitas, nos seus versos, fala-nos do campo, da Laguna, do Rio, de suas vivências, curiosi­dades e estórias muito particulares de sua região como esta da estancieira Dona Anna Rodrigues de Oliveira, mais conhecida como “Barbuda”.

José Custódio de Oliveira, rico estancieiro e industrial da erva mate, casado com Dona Anna, mais conhecida como a “Barbuda estancieira”, residia na Estância “El Vichadero”, no Departamento de Rio Ne­gro, Uruguai, quando resolveu se mudar para a Fazen­da dos Galpões, em Camaquã.

A Dona Anninha Barbuda, sogra e tia do General José Antônio Matos Neto (o Zeca Neto), faleceu em 1917 e foi sepultada no Cemitério dos Galpões.

Nos idos de 60, o então Padre Jacó Hilgert, hoje Bispo Emérito da Diocese de Cruz Alta, empenhado na reforma da Igreja Matriz (São João Batista), solicitou aos familiares os Mármores de Carrara do túmulo da Dona Anna, garantindo, em contrapartida, que seus restos mortais seriam transferidos para o altar mor da Igreja.

Músicas de Helmo de Freitas

Divisas com Ervas e Chibo

(Helmo de Freitas – O Carijó)

Na erva da Aninha

Não tinha daninha

Era seiva da mata

Lá da Bandeirinha.

Naquele local

Da Serra do Herval

Abriu-se divisas

Pra Banda Oriental.

A barbuda estancieira

Foi a primeira

A cruzar com erva a nossa fronteira

Saia dos galpões com bruaca e surrões ([1])

Nas cangalhas de mulas

Pras embarcações. (BIS)

Da grande Laguna entrava no Oceano

Rumo aos castelhanos o barco ia navegando

No porão o símbolo da União dos pampeanos

Que Sul do Rio Grande estava exportando

Da Colônia Canária, aqui dos Pomeranos ([2])

Com a leva da erva os tamancões lourencianos

Bota feita em Pelotas tinha gosto paisano

Para fazer chibo “aja” ([3]) com os Hermanos

Que ia e voltava com cinto forrado

De onça e condor ([4]) daquele mercado

De contrabando para ter ouro cunhado

Que vinha tapado no sebo do gado. [...]

Lago Verde Azul

(Helmo de Freitas – O Carijó)

T 2º Lugar e Música Mais Popular do 11º Reponte da Canção Crioula de São Lourenço do Sul-RS em 1995 T

O medo de andar “solito” ouvindo vozes e gritos

E até do barco um apito na sua imaginação

Olhos esbugalhados do moleque assustado

Olhando aquele mar bravo ora doce ora salgado

Num temporal de verão

 

Sem camisa na beirada, bombachita arremangada

Botou o petiço na estrada quando a areia lhe guasqueou

Sentiu um arrepio com aquele ar frio

Que o açude e o rio e as águas que ele viu

Não lhe provocou

Coqueiro e figueira nos matos e a bela Lagoa dos Patos

Oh, verdadeiro tesouro

Lago verde azul que na América do Sul

Deus botou pra bebedouro

 

Tempos que ainda tinha o bailado da tainha

Quando o boto vinha com gaivota em revoada

E entre outros animais no meio dos juncais

Surgiam patos baguais que hoje não se vê mais

Este símbolo da aguada

 

Nas noites de lua cheia a gente sentava na areia

Pra ver se ouvia a sereia entre as ondas cantando

E hoje eu volto ali no lugar em que vivi

Onde andei quando guri, me olho lagoa em ti

E me enxergo chorando.

Meu Rio

(Helmo de Freitas – O Carijó)

T Melhor Tema Sobre Ecologia e Meio Ambiente da 1ª Sapecada da Canção Nativa de Lages-SC em 1993 T

Com água no meu peito

Me doendo no coração

Ao ver o desmatamento

Cabresteando a erosão.

Ao longe se vê o clarão

Do fogo queimando o mato

Tarumã, cedro e angico

Em carvão, tábua e cavaco.

 

Os redemoinhos dançando

Nesta água eu quero ver

Não me matem este rio

Ao menos em quanto eu viver.

 

Rio...rio...rio...rio

Que mergulhou minhas lembranças

Rio da minha infância.

 

Linha, caniço e bocó

Entre os dedos as tamancas

Quantos capinchos eu vi

Se jogando das barrancas.

 

No remanso a garça branca

E a moura tinha um sossego

O biguá corria na água

Na frente do cisne negro

 

“De um lado eu nasci,

Do outro cresci

Deixei minha fome na pitanga,

Meu sangue na japecanga

Rio, rio que me deixou assustado

Com o meu primeiro dourado”.

Domador das Sesmarias

(Helmo de Freitas – O Carijó)

T Linha de Manifestação Campeira e Troféu Calhandra de Ouro - Prêmio Máximo da 23ª Califórnia da Canção Nativa de Uruguaiana-RS em 1993 T

 

Brotam campos, abrem flores

Largam os reprodutores

Pro focinho da potrada

Os buçais dos domadores

 

Deixam os ranchos e os seus

Hereges, pobres plebeus

Ficam em volta aos rosários

Chinas rezando pra Deus

Dando dentada nas loncas

Entre flores de açucenas

Em garrões de rudes pés

Vão cantando as chilenas

 

Travasse uma luta bruta

Entre os dois animais

Por natureza e instinto

Vencem sempre os racionais

 

Com jeito de tapejara

Soprando e tapeando a cara

Volta em coxilhas morenas

Quando a noite é lua clara

 

O ronco da virilha

E o ringir do arreio

Espantam os quero-queros

E se levanta o rodeio.

 

Dançam entre ao vivente

Lambem bota e tirador

Os cachorros que festejam

A volta do domador.

Bilhete do “Cumpadre”

(Helmo de Freitas – O Carijó)

Compadre velho vem me visitar

Tou com saudade das nossas folia

Tira uma hora vem cá matear

“Bamo” botar a nossa prosa em dia.

 

Tou te deitando estas simples linha

E desculpa a letra do “biete” ([5])

Pra te lembrar do feijão carioquinha

O fumo em corda e o milho cadete ([6]).

 

Prende os cavalo na tua carroça

Vem passar Natal e Ano Novo

Traz o produto que colheu na roça

Pra fazer uns cobre aqui no povo.

 

Vamos beber um vinho feito em casa

Comer um macucho ([7]) com batata assada

Botá um borrego ([8]) pra pingar na brasa

Contar proezas, mentir e dar risada.

 

Meter um baile lá na bailanta ([9])

Gastar um pouco do nosso dinheiro

Marcar um xote e molhar a garganta

E enticar ([10]) com as moça do povoeiro ([11]).

 

E se tu ficares até o dia seis

Têm uns ranchos pra nós visitar

Não esquece do tambor do Reis ([12])

Fiz um terno ([13]) pra nós dois cantar.

Soneto do amigo

(Vinicius de Moraes)

[...] O amigo: um ser que a vida não explica

Que só se vai ao ver outro nascer

E o espelho de minha alma multiplica...

 

Recado aos Amigos Distantes

(Cecília Meireles)

Meus companheiros amados,

Não vos espero nem chamo:

Porque vou para outros lados.

Mas é certo que vos amo. [...]

 

Não condeneis, por enquanto,

Minha rebelde maneira.

Para libertar-me tanto,

Fico vossa prisioneira.

 

Autobiografia

(Fernando Pessoa)

Ah, meu maior amigo, nunca mais

Na paisagem sepulta desta vida

Encontrarei uma alma tão querida

Às coisas que em meu ser são as reais. [...]

 

Não mais, não mais, e desde que saíste

Desta prisão fechada que é o mundo,

Meu coração é inerte e infecundo

E o que sou é um sonho que está triste. [...]


 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

 

Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

E-mail: hiramrsilva@gmail.com.



[1]    Surrões: recipientes, feitos de couro para transporte variado colocado, neste caso, nas cangalhas equilibradas no lombo das mulas. (Hiram Reis)

[2]    Pomeranos: imigrantes originários do Mar Bálticoque vieram para o Brasil no século passado fugindo dos horrores da guerra. (Hiram Reis)

[3]    Aja (espanhol): lá com os hermanos. (Hiram Reis)

[4]    Onça e Condor: prata e ouro contrabandeados vinham escondidos sob o sebo do gado. (Hiram Reis)

[5]    Biete: bilhete. (Hiram Reis)

[6]    “Geographia do Brasil” de Delgado de Carvalho, 1929: Cultiva-se no Brasil variedades de milho, “milho cadete”, milho amarello, milho perola, crystallino, etc. (Hiram Reis)

[7]    Macucho: porco. (Hiram Reis)

[8]    Borrego: cordeiro novo. (Hiram Reis)

[9]    Bailanta: festa popular onde se dança. (Hiram Reis)

[10]  Enticar: implicar. (Hiram Reis)

[11]  Povoeiro: habitantes de um povoado. (Hiram Reis)

[12]  Reis: a tradição dos Ternos de Reis, que celebra o Dia dos Reis Magos a cada 6 de janeiro, ainda persiste em algumas localidades do Rio Grande do Sul. (Hiram Reis)

[13]  Terno de Reis: é como são chamadas as canções, ou os pequenos grupos de músicos que as realizam, que têm como referência a história bíblica dos Três Reis Magos(Hiram Reis)

Galeria de Imagens

  • General Zeca Netto sentado à esquerda
    General Zeca Netto sentado à esquerda
  • Meu Rio
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  • Lago Verde Azul
    Lago Verde Azul

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