Quarta-feira, 27 de setembro de 2023 - 06h10
Bagé, 27.09.2023
De
Onde Veio Antônio João
Quando morreu, Antônio João, tinha 39 anos, pois
nascera em Poconé, Mato Grosso, em 24.11.1825, filho de Manoel Ribeiro de
Britto e Rita de Campos Maciel.
Procurando recompor a sua árvore genealógica, o
General Valentim Benício escreve:
Antônio João é ainda hoje um mistério. Pouco se sabe dos
ascendentes e os descendentes desapareceram em lamentável penumbra. Parece que
foi exceção na família, o único na história nacional. Do casal Ribeiro de Brito
Campos Maciel houve apenas dois filhos, Antônio João e Anna Rondon de Arruda. Vagas
informações de família, a custo arrancadas a um mutismo explicável,
permitiram-nos há pouco, ao desaparecer o único filho de Antônio João construir
uma, árvore genealógica, consoante dados fornecidos por um de seus netos,
Ezequiel Pompeu Ribeiro de Siqueira.
Nessa árvore aparece o casal Antônio João ‒ Anna Maria. É
uma história de amor que apenas referimos, justificativa das dificuldades que
encontramos na busca de informações, sintomas do temperamento ardente e
apaixonado do herói de Dourados, quiçá precioso elemento para um estudo mais
acurado a que não nos aventuramos. De Antônio João ficou apenas um filho ‒
Thomé Ribeiro de Siqueira ‒ falecido em 14.08.1937, na capital do Estado do
Mato Grosso. De seus netos, provenientes do casamento de Thomé Ribeiro de
Siqueira com sua prima Franklina Ribeiro de Siqueira, restam três ‒ Antônio
João, Jacintho e Ezequiel Pompeu Ribeiro de Siqueira.
A vida modesta de seus descendentes não deixa perceber
continuadores de um temperamento arrebatado e afeito a lances que só repetiram,
incontidos no amor, arrojados no convívio social, decisivos na ação
profissional, inflamados em nobre civismo, coroados de magnífica renuncia no
momento supremo do sacrifício espontâneo. De onde lhe vieram virtudes excelsas
só nele conhecidas? É uma incógnita cujo valor não nos foi dado determinar.
A distância do meio em que vivem seus descendentes, o pouco interesse dos historiadores e a imperdoável modéstia, quase displicência, de sua própria estirpe, tudo concorre para que se conserve misteriosa a vida de um brasileiro digno da maior glorificação, da mais sublime e meritória exaltação. Os ligeiros traços que aqui deixamos talvez conduzam ao caminho largo da verdade histórica e à significação psicológica do extraordinário feito a custo arrancado à poeira dos arquivos, ao silêncio das paragens remotas que lhe não repetem os ecos.
Talvez um dia o viandante descuidado possa ouvir,
naquelas quebradas e coxilhas, o mesmo brado que os espartanos esculpiram para
a eternidade na rocha das Termópilas. E a História terá pago uma dívida
sagrada, cujo vencimento ela só admite no perpassar dos séculos. Vale a pena
contar, em resumo, uma historieta oriental, em que aparece um herói moço que
teve como prêmio das suas proezas que salvaram um reino o posto de
generalíssimo e a filha do rei em casamento.
Ao celebrar-se
a cerimônia nupcial, segundo as praxes do reino, um arauto proclamou alto as
origens da noiva. Ao ter de fazer o mesmo com o noivo calou-se. Não tinha o que
dizer. O herói então tirou-o do embaraço e exclamou desembainhando a espada:
‒ Sou
filho desta espada. Número 1 da sua dinastia.
Houvesse
Antônio João sobrevivido ao lance em que pereceu e talvez dissesse a mesma
coisa. Porque ele foi também o número um ‒ e sem sucessão ‒ na história da nossa bravura militar. (CORREIO DA MANHÃ N° 13.541)
O Ministério do
Exército publica, em 29.12.1964 1ª Edição), uma publicação comemorativa à
heroica defesa da Colônia dos Dourados, denominada Antonio João, de autoria do
Ten Cel Walter dos Santos Meyer. Nesta biografia encontramos a Fé de Ofício de
Antônio João Ribeiro:
Ministério do
Exército, SGEx
Imprensa do
Exército
Rio de
Janeiro, RJ, 1969
Antônio João
(Ten Cel Walter dos Santos Meyer)
* 2ª
Edição *
Anexo
Fé
de Ofício de Antônio João Ribeiro
(Pasta
I-18-7 do Arquivo do Exército)
Lucio
Ribeiro d’Almeida Raposo, Major do Corpo de Cavalaria de Mato Grosso, e
Comandante interino do mesmo.
Certifico
que do Livro Mestre que serve de registro dos assentamentos das praças do
referido Corpo, tem o oficial abaixo declarado os do teor seguinte.
Segunda Companhia
Alferes
Antonio João Ribeiro, filho legítimo de Manoel Ribeiro de Brito, natural de
Poconé, Província de Mato Grosso, nasceu em 1823, solteiro, altura sessenta e
quatro polegadas ([1]),
cabelos pretos e lisos, rosto comprido e claro, olhos pretos, barba pouca e
preta.
Promoções:
Em 1841 – Assentou praça voluntariamente no 12°
Batalhão de Caçadores da Província de Mato Grosso a 06.03.1841, Cabo em
primeiro de abril do dito ano; Furriel a três da agosto do sobredito ano.
Em 1842 – Segundo Sargento em 01.01.1842.
Em 1845 – Primeiro Sargento em 01.05.1845.
Em 1849 – Sargento Ajudante graduado a
22.03.1849.
Em 1852 – Alferes por Decreto de 29.07.1852.
Nomeações:
Em 1841 – Passou para o Batalhão Provisório a
24.11.1841
Em 1843 – Para o Corpo Fixo de Caçadores em
01.04.1843.
Em 1844 – Para o 1° Corpo Fixo em 01.11.1844.
Em 1847 – Para o Corpo Fixo de Caçadores em
primeiro de março de mil oitocentos e quarenta e sete.
Em 1849 – Para o Corpo Fixo de Cavalaria
Ligeira em 22.05.1849.
Em 1851 – Para o Corpo de Cavalaria de Mato
Grosso em 07.10.1851.
Movimentações:
Em 1842 – Destacou para a Fronteira do Baixo
Paraguai a 18.06.1842.
Em 1844 – Recolheu-se a 03.10.1844.
Em 1846 – Marchou a comandar o Destacamento dos
Dourados no Baixo Paraguai em 08.06.1846.
Em 1848 – Seguiu para a Fortaleza de Coimbra a
02.03.1848, e recolheu-se a dezoito de maio do dito ano. Marchou em diligencia
ao Distrito Militar de Mato Grosso em 01.07.1848, e apresentou-se a nove de
setembro do mesmo ano. Marchou em diligência ao Distrito Militar de Villa Maria
a doze do dito mês, e apresentou-se a cinco de outubro do mesmo ano.
Em 1849 – Seguiu a comandar o Destacamento dos
Dourados a 06.05.1849.
Em 1850 – Recolhendo-se à Cuiabá a 31.05.1850,
tornou a seguir destacado à Fronteira do Baixo Paraguai.
Em 1851 – Marchou em diligência à Corte do Rio
de Janeiro a 21.01.1851, onde foi adido ao 1° Regimento de Cavalaria Ligeira a
vinte nove de abril do referido ano. Por Aviso da Repartição da Guerra de vinte
e oito do dito mês, foi admitido como ouvinte da Aula Militar, onde obteve o
grau três em aritmética, dois em francês e um em geografia.
Em 1852 – Por Aviso da Repartição da Guerra de
quinze e ofício do Quartel General de 17.07.1852, foi mandado chamar para o
serviço por ter sido inabilitado do exame de suficiência ao primeiro ano da
Escola Militar.
Em 1853 – Recolheu-se ao Corpo estacionado em
Villa Maria a 26.01.1853.
Licenças:
Em 1842 – Registradas por três meses a
08.04.1842: presente a 09.06.1842.
Em 1848/49
– Por três meses a 21.10.1848; presente em 01.02.1849.
Prêmios e Castigos:
Em 1853-55 – No Livro de Prêmios e Castigos consta
o seguinte: Foi preso, em 13.07.1853, por ter saído fora do Exército sem
licença, solto no mesmo dia. Foi preso em vinte e cinco por responder ao
Capitão comandante, estando debaixo de forma; solto em vinte e seis do dito
mês. Preso a vinte e sete de novembro e recolhido à capital a quatorze de
dezembro tudo do dito ano, pelo ferimento feito na pessoa do Capitão Francisco
d’Assiz Machado Bueno.
Respondeu
a Conselho de Guerra, e sendo absolvido pelo mesmo em 23.02.1854, foi reformada
a sentença, e condenado a um ano de prisão pelo Conselho Supremo Militar de
Justiça de vinte e um de junho do mesmo ano; solto em 21.06.1855, e destacou
para a Fronteira do Baixo Paraguai em vinte e oito de novembro do dito ano.
Nada
mais consta dos seus assentamentos aos quais me reporto; em firmeza do que
mandei passar a presente, em que me assino, e vai selada com o sinete do Corpo.
Quartel em Villa Maria, 07 de novembro de 1856. E eu o Tenente Antonio Maria
Xavier, Secretário interino que a subscrevi e conferi.
Lucio Ribeiro d’Almeida Raposo
O
que acima transcrevemos é a Fé de Ofício existente no Arquivo do Exército. Pode
ser complementada oficiosamente utilizando-se o que publicaram Armando de
Arruda Pereira [Heróis Abandonados! – São Paulo, 1925]; Valentim Benício da
Silva [Antonio João – Bibliex, 1928) e Walter Spalding [A Invasão Paraguaia no
Brasil – Cia. Editora Nacional, 1940].
‒ Em
1857 – Foi elogiado em ordem do dia n° 83 do Comandante das Armas pelo bom
resultado da Comissão de que foi incumbido de afugentar do sertão desta
Província os índios bravios que infestavam a sua estrada sabendo conduzir uma
escolta composta de quarenta praças de linha sob seu comando em 28.11.1857.
‒ Em
1858 – Recolheu-se ao Corpo a 26.01.1858; marchou com o mesmo e para o
Distrito Militar de Miranda em primeiro de maio do mesmo ano onde chegou a
treze do dito.
‒ Em
1859 – Foi nomeado pelo Presidente da Província para ir comandar o 9°
Destacamento de São Lourenço pelo que seguiu para Cuiabá a 02.06.1859, onde
ficou adido ao 2° Batalhão de Artilharia a Pé até primeiro de julho do mesmo
ano, quando partiu para seu destino.
‒ Em
1860/61 – Foi desligado do mesmo Batalhão, em 01.10.1860, para recolher-se
ao Corpo ao qual apresentou-se a 04.01.1861; passou a exercer as funções de
Agente por eleição do Conselho Econômico a sete do dito mês e ano. Por ofício do Comando das Armas desta
Província n° 19 de 28.02.1861 foi ordenado que se averbasse em seus
assentamentos a seguinte nota:
‒ Tem
a seu favor as vantagens do artigo oitavo da Lei de 18.08.1852 desde 26.01.1853
até vinte e sete de novembro do mesmo ano em que foi preso e de 21.06.1855 em
que foi solto até 30.07.1856 em que foi extinta a mesma Lei.
‒ Deixou
o exercício de Agente em 01.07.1861.
‒ Em
1862 – Marchou em diligência aos Campos da Fronteira de Miranda ao encontro
da partida paraguaia que invadiu o nosso território comandada pelo Tenente da
República Pedro Pereira, a fim de fazê-la retirar-se a 12.02.1862; recolheu-se,
a vinte e três e a vinte e sete tudo do mesmo mês e ano, e seguiu em tomar o
comando da Colônia Militar dos Dourados;
‒ Em
1863 – Por aviso do Ministério da Guerra de 02.07.1863 foi louvado e
agradecido pelo Governo Imperial pela oferta que fez de uma parte de seus
vencimentos para as urgências do Estado.
Finalmente, pode esta Fé de Ofício ser
completada com o seguinte:
‒ Em 1865 – A 06.11.1865, a ordem do dia n° 482 da Repartição do Ajudante-General da Secretaria de Estado dos Negócios da Guerra comunicava o falecimento do Sr. Tenente do Corpo de Cavalaria da Província de Mato Grosso Antonio João Ribeiro em ataque com os paraguaios na Colônia dos Dourados, por ocasião da invasão da mesma Província. (SANTOS MEYER) (SGEx)
Bibliografia
CORREIO
DA MANHÃ N° 13.541. Resgata-se uma Dívida
de Gratidão – Uma Síntese Histórica da Bravura de Antônio João ... – Brasil
– Rio de Janeiro, RJ – Correio da Manhã n° 13.541, 29.12.1938.
SGEx
– Antônio João – Ten Cel Walter dos
Santos Meyer – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Ministério do Exército, SGEx –
Imprensa do Exército, 1969.
(*) Hiram Reis
e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor,
Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
Campeão do II Circuito
de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio
Militar de Porto Alegre (CMPA);
Ex-Pesquisador do
Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do
Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4°
Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade
de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de
História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de
História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de
Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
Membro da Academia
Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia
Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da
Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da
Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
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Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
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Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H