Quarta-feira, 4 de outubro de 2023 - 06h20
Bagé, 04.10.2023
A Revista do
Instituto Histórico do Mato Grosso n° 25, publica um artigo intitulado “Traços
Biográficos do General de Divisão João de Oliveira Mello”, da lavra do Dr.
João Barbosa de Farias:
RIHMG n° 25, Tomos XLV a XLVIII, 1941/42.
Traços Biográficos do General de Divisão
João De Oliveira Mello
A horrenda sepultura
Conter não pode a luz brilhante e pura
Que, soberana, rege o corpo inerte...
Não descobre em ti um sentimento
Sublime e glorioso, que parece
Tua vida
estender além da morte? (SOUZA CALDAS) ([1])
Um culto existe que, tal como as condições
mais essenciais à vida coletiva, impõe-se a todos os povos, qualquer que seja a
sua educação religiosa, qualquer, que seja o seu grau de cultura – é o culto do
civismo. É ele que expande para além dos âmbitos do lar os afetos do homem
para, depois convergi-lo, uno, em torno da grande individualidade – a Pátria, é
ele que vivifica no coração humano o sentimento de amor pela comunidade, de
onde irradia a vida social, é ele, finalmente, que agrega homogeneamente todos
os cidadãos selando essa permuta de direitos e deveres, que é o fundamento
orgânico da família, da sociedade e da Pátria.
Entre os romanos antigos, era costume
levar-se ao herói que vencia batalhas e salvava vidas, um ramo de carvalho.
Essa oferta, que não representava precisamente um galardão, foi antes o
artifício de que se serviram os governantes para estimular o povo aos feitos de
armas, ao heroísmo... É, com efeito, ante as virtudes cívicas de um patrício
benemérito, é recomendando nomes e feitos gloriosos que se pode doutrinar e
incutir e acrisolar ([2])
na consciência popular esse culto salutar. Pois que, se as homenagens
significam uma glorificação, ‒ mais que isso ‒ elas traduzem sublime emulação
para as gerações que as sufragam ([3])
e quiçá para a posteridade.
Pois bem: depor um preito de homenagem ante a
memória do emérito brasileiro, cujo nome encima estas linhas, falar aos meus
compatrícios dessa vida gloriosa, em que se pode haurir ([4])
lições de civismo, de bravura, de generosidade, ‒ tal é o nosso tentâmen ([5])
inserindo no Almanaque de Mato Grosso estes traços biográficos.
A terra de Deodoro e Floriano foi
também o berço, de João de Oliveira Mello, que nasceu em Maceió a 05.02.1836.
Natural de uma Província onde o militarismo ganhara simpatias, e sob a
influência das ideias de sua época, João de Oliveira Mello, desde muito jovem,
revelou decidida vocação para a carreira das armas. Obedecendo, pois, às
solicitações dessa tendência, aos 15 anos, em 1851, verificou praça.
O jovem militar, que iniciava a
sua carreira como simples “praça de pret” aliava à sua vocação as mais
elevadas aspirações e uma larga inteligência, “ao serviço de uma vontade de
ferro”, de modo que, em 1860, por Decreto de 2 de dezembro, era promovido,
a 2° Tenente, por estudos, sendo classificado no Corpo de Artífices da Corte,
de onde foi transferido, pela Ordem, do Dia de 10.02.1861, para o Corpo de
Artilharia do Mato Grosso. Tendo se agravado por um momento a, desinteligência
entre o Império e o Paraguai [1863], tornou-se mister reforçar a fronteira
paraguaia. Nesta melindrosa emergência foi o Tenente Mello distinguido com a
nomeação de Comandante do Forte de Coimbra, cargo que deixou quando dissipou-se
o incidente que determinou as medidas de precaução tomadas.
Ao, regressar de Coimbra o Ten
Mello veio encontrar o, seu nome cercado de prestígio pelas qualidades de
militar consumado que tão jovem revelava já, pelo cabal desempenho que dera à
incumbência que lhe fora cometida. O rompimento, porém, entre o Brasil e o
Paraguai, tantas vezes, evitado, de há muito protelado, era fatal. O
plenipotenciário brasileiro, em Assunção, acompanhando atento todos os
estratagemas da política do Ditador Solano López, que simulava quanto lhe
coube no espírito ardiloso a insídia que preparava ao Brasil, em meados de 1864
recomendou ao Presidente do Mato Grosso a máxima precaução contra o Paraguai,
visto que o Ditador aprestava-se para uma Guerra. Foi então, novamente,
reforçada a fronteira de Mato Grosso, indo o Corpo de Artilharia guarnecer o
Forte de Coimbra, onde chegou a 23 de outubro de 1864. A despeito das
insistentes insinuações do Ministro brasileiro em Assunção, que em nenhum só
momento traiu os deveres de seu cargo, o golpe traiçoeiro que o Ditador López
desfechou sobre o Brasil veio encontrar a Província de Mato Grosso quase
indefesa.
A luta homérica que tiveram de
sustentar os bravos soldados que guardavam as portas da Província, é um dos
mais belos florões do laurel do Exército Nacional. É dentre esses bravos que o
Tenente João de Oliveira Mello surgiu aureolado de fulgurante renome, porque,
em grande parte, deve-se ao seu valor a firmeza da resistência oferecida pelos
defensores de Coimbra à Expedição Paraguaia, que atacou o Forte nos dias 27 e
28.12.1864.
A infantaria paraguaia,
diz
E. C. Jourdan (JOURDAN, 1893),
avançando pelo
lado do sul e pelas fraldas da montanha, sempre com nutrida fuzilaria, tentou'
por vezes escalar os parapeitos, mas foi sempre repelida pelos bravos que
defendiam o Forte e que eram animados pelo valente 2° Tenente João de Oliveira
Mello e os outros oficiais que rivalizavam em entusiasmá-los com seus
exemplos.
Pugna titânica foi essa, luta desigual, em
que os paraguaios, perfeitamente armados e em número de 4.000, foram a cada
assalto tentado contra Coimbra rechaçados por 157 homens apenas, nas condições
as mais difíceis devido à carência absoluta de munição. Ao relembramos esse
passado, ao invocarmos esses feitos e esses heróis seja-nos permitido significar
aqui uma homenagem, um preito de veneração, àquelas abnegadas senhoras, que,
nos transes aflitivos por que passavam os habitantes do Forte, nos dias 27 e 28
de dezembro, enrobusteceram a defesa de Coimbra, entregando-se, dia e noite, à
manufatura de cartuchos, cuja falta teria obliterado os esforços gigantescos
dos bravos soldados ([6]). Depois
desses nutridos combates, dos quais as gloriosas tradições do Forte saíram
impolutas,
o Ten Cel Porto Carrero, aproveitando o prolongado crepúsculo, incumbiu
de melindrosa Comissão um dos seus oficiais que particularmente se havia
distinguido pela bravura, calma e prontidão de vistas na parte mais efetiva da
defesa, a fuzilaria, o 2° Tenente João de Oliveira Mello (TAUNAY, 1891).
O fim dessa incumbência confiada
ao Tenente Mello foi recolher os feridos deixados pelos paraguaios no Campo da
Ação, o bravo soldado desempenhou-a com alevantado critério, com nobreza,
acolhendo fidalga e gentilmente a 18 feridos, os quais nele encontraram
inexcedível gentileza, que nem parecia obrada pelo coração que, momentos antes,
se inflamava de impetuoso heroísmo, onde chocaram-se as hostes invasoras,
deixando na arena, mais de 100 mortos. Desse contraste, em que todos viam
envolvida a sua personalidade, alma aberta à mais extrema generosidade,
coração capaz da mais estoica bravura, o Tenente Mello, surgiu mais
prestigiado e admirado pelos seus irmãos de armas. A defesa de Coimbra, porém,
mais cedo ou mais tarde, viria a enfraquecer-se, porque aquele reduto de bravos
não podia manter por mais tempo a resistência até então sustentada, nas
condições desvantajosas com que lutavam incomparavelmente inferiores em número,
e o que é mais ‒ desprovidos de munição de guerra e de boca. Em tais condições,
quando nenhuma única probabilidade de bom êxito lhe sorria, o Tenente-coronel,
Porto Carrero, de saudosa memória, de acordo com a oficialidade do Forte e com
o Comandante Baldoino, resolveu evacuar Coimbra, o que, com efeito, realizou-se
a 28 de dezembro, às 23h00, sem que os paraguaios pressentissem, graças à
habilidade do bravo comandante do “Anhambahy”
A 30 desse mesmo mês, os
retirantes de Coimbra chegavam a Corumbá, onde o pânico lavrava e cujo abandono
o Coronel Carlos Augusto de Oliveira determinou irrefletidamente a 02.01.1865,
ao ter ciência das ocorrências de 27 e 28 de dezembro.
Foi em face desse ato pusilânime do Coronel
Carlos Augusto de Oliveira, que, fugindo covardemente para Cuiabá acompanhado
apenas pelas tropas que couberam a bordo do “Anhambahy”, largava ao
abandono desumanamente, sem destino e alucinada, uma população de mais de 400
pessoas, .quando os paraguaios marchavam já sobre Corumbá, foi face desse ato
cobarde do Comandante das Armas que o Tenente Mello recebeu a consagração a
mais imponente do respeito e confiança que lhe tributavam os que o conheciam.
Naquela tremenda conturbação, o sentimento popular e sobretudo da tropa,
que ainda conservava algum espírito de disciplina, mostrou-se bem inspirado,
reclamando todos, paisanos e soldados, o mando único de João de Oliveira Mello.
Queremos o Tenente, bradavam a uma voz, e no meio de muitos Tenentes que lá se
achavam, além de capitães, majores e coronéis, era esse 2° Tenente excepcional,
o herói de Coimbra, que ainda tinha de salvar grande número de vidas (TAUNAY,
1891).
O Tenente Mello bem mediu a extensão dos
sacrifícios e das responsabilidades que lhe impunham os que o aclamavam; mas a
sua abnegação, que não era uma ficção, e o seu civismo falaram-lhe mais alto na
consciência do que todas as conjecturas. E dispôs-se a ir corresponder ao
apelo da multidão, quando foi impedido de fazê-lo pelo Coronel Carlos Augusto
de Oliveira.
‒ Sr. Comandantes das Armas, aquelas Praças
ainda não almoçaram até a esta hora, 09h30, não tem gêneros nenhuns para a
viagem e, demais, são de meu Corpo e não têm junto delas sequer um oficial.
Em vista de energia com que o Tenente Mello
timbrou esta observação, o Coronel Carlos Augusto de Oliveira compreendendo a
disposição do brioso oficial, deu-lhe a permissão para ir reunir-se àquele
punhado de brasileiros que o Comandante das Armas largava à mercê do acaso em
tão aflitiva emergência.
Sem deter a sua marcha, andando
sempre, o vapor “Anhambahy” arriou um escaler, que o Tenente Mello e
outros que o acompanharam voluntariamente tomaram em demanda da escuna “Jacobina”,
onde se achava o povo. Antes de qualquer outra providência, o Tenente Mello fez
matar oito reses, voltou à Corumbá, onde comprou gêneros alimentícios, e,
dirigindo-se ao Quartel em que o 2° Batalhão de Artilharia esteve aquartelado
inutilizou toda a munição que aí encontrou abandonada. Tomadas estas medidas, o
Tenente. Mello voltou para bordo da escuna “Jacobina”, que singrava o
Paraguai acima. A marcha, porém, teve de ser interrompida a 03 de janeiro,
porque, tendo os paraguaios avançado até Corumbá, eles não tardariam a sair ao
encalço da escuna, logo que a divulgassem ao longo do Rio, amplamente
descortinado aos olhos da velha Albuquerque. E a “Jacobina” seria fatalmente
abordada. O Ten Mello, pois, prevendo essa desgraça, para obvia-la ([7]),
desembarcou o pessoal que a “Jacobina” conduzia, e deixando à mercê das
ondas a frágil escuna, acampou nas margens do Rio Paraguai, tomando de antemão
as necessárias prevenções a fim de que não fosse surpreendido pelos paraguaios.
À 4, continuou a marcha, à pé, internando
pelos campos, vastos pantanais, onde os fugitivos carpiram cruel martírio...
O que foi aquela terrível marcha
durante quatro meses, por pauis quase invadeáveis, um solo sempre encharcado,
cortado de fundos corixos, na estação mais rigorosa do ano, debaixo de
contínuos aguaceiros, por lugares nunca antes transitados, sem guia, vencendo
enormes distâncias e rios caudalosos, que todos deviam transpor, desde os mais
fortes e impacientes até os mais débeis e retardados, passa os limites da
descrição.
Só mesmo uma alma de herói, empenhada em sacrossanta missão. Sabia que,
nada menos de 400 vidas, homens, mulheres, crianças e velhos, dependiam só e
unicamente da sua serenidade e coragem, e dessa convicção tirava recursos para
encarar sem desfalecimento as mais cruéis e desesperadoras conjecturas.
Também severíssima e meticulosa disciplina
reinava naquela mísera coluna a que se haviam juntado não poucos índios Terenos,
Laianos, Quiniquináos e Guanás; e os castigos não eram poupados ao mais leve
delito ‒ caso de salvação pública. (TAUNAY, 1891)
Após quatro meses de angustiosa viagem, à
30.04.1865, chegavam, com efeito, à Cuiabá, salvos, os habitantes de Corumbá.
Toda a sorte de sacrifícios experimentaram os fugitivos nessa infortunada
jornada, mas, em meio dos sofrimentos que os afligiam, todos folgavam de ver
aquela massa de gente, onde se encontravam indivíduos de toda a casta, uma
heterogeneidade de caracteres, na maior ordem, não se tendo registrado um só
caso de roubo ou de atentado à moral durante o longo percurso dessa viagem.
A homenagem rendida ao Tenente Mello pelos
cuiabanos bem merece ser relembrada, menos em honra ao emérito brasileiro cuja
vida traçamos, do que como justo enaltecimento dos sentimentos cívicos a dos
homens de então.
A população de Cuiabá, que refluíra na
povoação do Coxipó, aguardava aí os retirantes. A emoção, que o entusiasmo e a
satisfação levavam à alma da multidão ali aglomerada, estava expressa no
semblante de todos, ansiosos por acolher os infortunados fugitivos, ansiosos
por glorificar o patrício benemérito, que tantas existências redimia. Em um
momento, o povo agitou-se, e uma salva de palmas e um estrepitoso murmúrio
prorromperam em aclamação ao Tenente Mello, que surgia. A um movimento, a
figura do bravo militar desapareceu entre “uma floresta de braços” que
lhe acenavam; e enquanto uns substituíam o rústico chapéu de couro, que o
acompanhara durante a longa jornada, por coroas de flores, outros o carregavam
nos braços delirante e alucinadamente.
Ao penetrar na Capital, cortejado
sempre por numerosa multidão que o vitoriava, o Tenente Mello foi alvo dos mais
ardentes aplausos e conduzido à Catedral, assistiu o “Te Deum” celebrado
e, honra ao feito.
Durante muitas semanas esteve em festas a capital, pasmos todos da
milagrosa salvação de tantos entes, graças à dedicação e valentia de um único
homem, que também salvou alguma coisa de seu, de bem seu, o nome, na triste
história da invasão de Mato Grosso pelos paraguaios. (TAUNAY, 1891)
Após essa mortificante jornada, era natural,
muito justo que o bravo militar fosse repousar. Mas não, o Tenente Mello
entendia que o momento era de sacrifícios para todos. Em seguida à sua chegada
a Cuiabá apresentou-se pronto para o serviço e, a 23.05.1865, seguiu para; “Aricá-Assú”
com seu Corpo, que fazia parte da 1ª Brigada da Divisão em operações, e com o
qual, em outubro, marchou para Coxim. O Governo Imperial, porém, não tardou em
galardoar os inestimáveis serviços do distinto militar.
Por Decreto de 07.07.1865 nomeou-o Cavaleiro
da Ordem da Rosa e, a 22.01.1866, promoveu-o a 1° Tenente por atos de bravura,
sendo-lhe também conferida uma medalha de prata pelos serviços prestados em
Coimbra nos combates de 27 e 28.12.1864; e pelo Decreto de 06.01.1866 foi ainda
nomeado Cavaleiro da Imperial Ordem do Cruzeiro. Comissionado em Capitão por
Decreto de 01.06.1867, foi promovido a este posto, sendo classificado na 7ª
Companhia do 2° Batalhão de Artilharia a Pé. Quando o então Presidente da
Província, Dr. Couto de Magalhães, organizava Corpos para retomar a cidade de
Corumbá, o Capitão Mello foi oferecer-lhe os seus serviços, sendo com efeito
incorporado às Forças que marcharam para expulsar os paraguaios daquela parte
do território nacional.
Os feitos do Capitão Mello no
memorável combate de 13.06.1867, em que os mato-grossenses lavaram a afronta
assacada à Pátria, foram outros tantos atos de heroísmo, que mais enalteceram o
nome do bravo oficial. Depois da vitória das Forças Brasileiras na praça de
Corumbá, regressou o Capitão Mello a Cuiabá, sendo designado para servir no 1°
Regimento de Voluntários Cuiabanos, e mais tarde para, seguir em diligência ao
Baixo Paraguai. Por ato do Vice-presidente da Província foi nomeado Major em
Comissão para o 1° Corpo Destacado, do qual foi desligado por ter sido chamado
para servir no Exército em operações na República do Paraguai.
Aí o Capitão Mello foi incumbido
de importantes comissões, notadamente a de Adjunto à Repartição do Deputado do
Quartel Mestre General, junto ao Comando em Chefe, cargo que deixou para ir
servir no 1° Corpo de Exército, assumindo então o comando da Ala Esquerda do
Batalhão de Engenheiros, no Rosário, e depois, em Cunguaty, o da Ala Direita.
Pela ordem do dia de 06.01.1870,
o Marechal Conde d’Eu elogiou-o, com especial menção, pela resignação e
disciplina com que suportou prolongadas privações em S. Joaquim de Capivary,
pelas matas insalubres de Jejuy-guassú e Jejuy-mirim.
Muitas e muitas outras comissões importantes,
melindrosas, às quais deixamos de nos referir para não mais alongar este
trabalho, foram cometidas ao Capitão Mello, durante o longo período da Guerra
do Paraguai, que ele acompanhou “pari-passu”, das primeiras hostilidades
recebidas por Coimbra ao momento em que o tiro de honra foi desfechado sobre
Solano López e o Hino Nacional ecoou na amplidão anunciando a vitória do
Brasil. Em compensação, muitos são também os louvores que a sua brilhante fé de
ofício registra, enaltecendo a sua inteligência, a sua probidade, o seu amor à
disciplina e o zelo no cumprimento de seus deveres, dos quais teve sempre a
mais larga compreensão.
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Terminada a Guerra, voltou o Capitão João de
Oliveira Mello à monotonia da vida de Quartel, recolhendo-se ao seu Corpo, que
se achava em Cuiabá. Na então Província de Mato Grosso, achava-se, pois,
reduzido a uma vida militar sedentária, adormecida, pouco compatível com a, sua
atividade e com o seu mérito. E, afastado para lugar tão longínquo das vistas
do Governo, era evidente que o bravo Capitão Mello ia ser condenado ao esquecimento,
a despeito da fulgurante auréola que cercava o seu nome. Com efeito, depois de
ter servido algum tempo arregimentado, foi nomeado comandante do Distrito
Militar de Mato Grosso, onde serviu de 06.06.1873 a 14.05.1877, com algumas
interrupções; e só em 1878 era graduado no posto de Major e incluído no Corpo
de Estado Maior de 2° classe, sendo-lhe conferida por esta ocasião a medalha de
Cavaleiro da Ordem de Cristo, pelos serviços que prestou na retirada de
Corumbá.
Em 1882, foi novamente nomeado para comandar
o Distrito de Mato Grosso. Ele bem compreendia quão prejudicial era para a sua
carreira essa incumbência, que, não constituindo merecimento, afastava-o dos
meios, onde pudesse exercitar a sua atividade profissional. Mas capitulando em
face do dever, foi de novo assumir o exercício desse cargo, sacrificando o seu
futuro e toda a sorte de interesses. Lá, na decadente Vila Bela, ficou por
muito tempo esquecido do Governo o brioso oficial.
Só seis anos depois de sua
graduação, em 23.12.1884, teve efetividade no posto de Major; sendo, a
02.05.1885, graduado no posto de Tenente-coronel; para o qual foi promovido em
29.06.1887. Assimilado pelo meio em que vivia, João de Oliveira Mello filiou-se
a um dos Partidos militantes na Província e, posto não tivesse sido um
obcecado, foi, todavia, político austero; intransigente, fiel ao seu Partido
até ao sacrifício de seu futuro. Em verdade, a intolerância política feriu bem
fundo a sua carreira, até que, de desgosto em desgosto, pediu transferência
para a 2ª Classe do Exército, em 01.04.1888, para pôr-se a cobro de manejos
políticos.
A 14.09.1889, porém, reverteu à
1ª Classe. Pelo Decreto de 6 e Carta de 17, tudo de agosto de 1889, foi nomeado
Cavaleiro da Ordem de S. Bento de Aviz, sendo-lhe também concedida a medalha
comemorativa da Guerra do Paraguai em 19.07.1890. O Ten Cel Mello, posto
tivesse um nome glorioso, posto tivesse gozado a satisfação de ver-se vitoriado
por um povo inteiro a aclamá-lo delirantemente jamais, tivera a febre das
grandezas; as suas conquistas ele as guardava sob uma modéstia inexcedível,
que foi sempre o seu apanágio e a ânfora cristalina através da qual os seus
títulos transpareciam mais rutilantes.
Isso, porém, não excluía que ele fosse cioso
de si mesmo, de seus direitos, até ao egoísmo e, digamos, mesmo à ambição, que,
muitas vezes, são em essência os atributos do brio, do altruísmo e da dignidade
do homem. Ferido, pois, em seus direitos pelo Governo Provisório, que o
postergara nas promoções efetuadas logo após o advento da República, o
Tenente-coronel Mello solicitou a sua reforma, que foi-lhe concedida, quando
ainda, oficial cheio de serviços, tantas esperanças lhe sorriam!
Tendo sido
reformado em 06.10.1890, no posto de Coronel, posteriormente foi graduado em
General de Divisão, em virtude de lei.
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Recolhido à vida privada, entregue à vida
remansosa do lar, o General Mello foi chamado a ocupar o cargo de Chefe de
Polícia deste Estado, sendo Governador o então Coronel Mallet.
Quando deu-se aquela deplorável sedição
militar, que, em 1892, depôs o Presidente do Estado, o General Mello pôs de
parte o preconceito de classe e colocou-se ao lado da legalidade,
desinteressadamente, sem visar as promessas da política e prestigioso como
bravo militar que foi, no comando da 1ª Brigada da Divisão “Floriano Peixoto”,
desempenhou proeminente papel, foi o braço forte da contrarrevolução operada
para a reposição do governo constituído.
Os fatos, porém, são de ontem e nos julgamos
desobrigados de comentá-los. Após esse movimento revolucionário, o General
Mello, que, modesto, nada aspirava da política, como já dissemos, tornou de
novo a vida do lar, ao qual foi extremamente devotado, como esposo e como pai. Quando
ainda intestináveis serviços poderia prestar à Pátria, um lamentável incidente
ocorrido no rio Cuiabá, a 17.04.1899, veio roubar-lhe a vida preciosa, aquela
que mais exuberantemente encarnou o civismo, a honradez, de par com o mais
acrisolado amor à comunidade.
Para não mais nos alongarmos, aqui
concluiremos este ligeiro esboço biográfico, mas, antes de fazê-lo, rogamos aos
nossos patrícios que, em honra aos manes ([8])
dos nossos maiores não deixem cair no olvido a memória gloriosa desse
benemérito brasileiro, por tantos títulos digno do nosso afeto e da mais
religiosa veneração.
J. Barbosa de Faria (RIHMT N° 25)
(José Victorino da Silva Azevedo)
Às armas, nobres paulistas!
Às armas! – Fora a indolência!
Às armas! – Filhos da terra
Que deu berço à independência!
Não ouvis o nobre grito
Dos bravos, que tem inscrito
Seus nomes no chão da glória?
Às armas, povo paulista!
Sem valor não se conquista
O nome que diz – Vitória! ...
Em Cerro-largo n’outrora,
Outrora em Monte Caseros
Que fostes, bem o mostrastes
Da Pátria filhos sinceros!
Irmãos valentes vos chamam,
Os vossos brios proclamam,
Lembram Buenos e Andrades,
Lembram o grito, soltado
Nesse Ipiranga afamado
Paládio das liberdades! ...
Paissandu curvada a fronte
Soltou gritos derradeiros,
Ouvindo o rugir dos bravos
Dos valentes brasileiros!
E em breve a voz do canhão,
Montevideo, Assunção,
Dos Gomes terão a sorte:
Que este povo brasileiro,
Tem por seu facho o Cruzeiro,
Tem por virtude o ser forte!
Que importa vil paraguaio
Em número mui superior,
Quase à traição, por enquanto
Ser de Coimbra o senhor?
Por ventura foi façanha
Tão vigorosa e tamanha
SEREM TANTOS de uma vez,
CONTRA POUCOS, que em três dias
Praticaram galhardias,
E sem recursos talvez? ...
Não! Não cabe ao invasor
Nem glória, nem alto brado,
NEM RENDIDO, NEM VENCIDO
Foi o VALENTE PUNHADO!
Retirou, mas não vencido!
[Que o brasileiro aguerrido
Em ser covarde não timbra]
Mas para em breve, com glória,
Ter certeza da vitória
Reconquistando Coimbra! [...]
Avante, povo de bravos!
Somente da honra escravos
Procurar da Pátria a glória!
Quem da Pátria o bem cobiça,
Tem por seu norte a justiça,
Tem por certeza a vitória!
Homens e
mulheres na Guerra do Paraguai
(Joseph
& Maurício Eskenazi Pernidji)
López galopa só. Tem a perseguição de toda a tropa imperial às suas costas.
No seu vocabulário, desde 1864, não existe a palavra rendição. Patas da
cavalaria às dúzias, seus ginetes cercam o tirano.
Seu baio atingido cai no barro do Aquibadan.
López, sois prisioneiros do Exército Imperial. Entregai-vos, que vos
garantimos a vida ‒ grita um Tenente. Os olhos de Lopez cintilam de ódio.
Coberto de barro, sujo, esfarrapado, dispara um tiro em direção ao Tenente.
Nunca aceitaria ordens de comando estrangeiro.
O Cabo Francisco Lacerda, de
apelido Chico Diabo, numa carga, atropela o corpo de Lopez com a lança,
perfurando-lhe o baixo-ventre. Seu rosto retorce-se de agonia. Por todos os
lados, cavalos e uniformes imperiais. O corpo afunda na água barrenta. Com
grande esforço, ergue-se e desembainha a espada. Ameaça simbolicamente os
inimigos. O sangue escorre pela boca e narinas.
‒ Muero com mi pátria! Exclama em agonia.
Bibliografia
JOURDAN, Emílio Carlos. História das Campanhas do Uruguai, Mato
Grosso e Paraguai – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Imprensa Nacional Volume
2 [1864-1865], 1893
RIHMG N° 25. Traços Biográficos do General de Divisão
João de Oliveira Mello – Brasil – Cuiabá, MT – Revista do Instituto
Histórico de Mato Grosso n° 25, Tomos XLV a XLVIII, 1941/42.
SOUZA CALDAS, Antonio
Pereira de. Poesias Sacras e Profanas
– França – Paris – Officina de P. N. ROUGERON, 1821.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] Poesias Sacras e Profanas do Reverendo Antonio Pereira de Souza
Caldas, 1821 – Poesias – Cantata II – A Immortalidade da Alma – Recitativo 1.
(Hiram Reis)
[2] Acrisolar:
aperfeiçoar. (Hiram Reis)
[3] Sufragam:
aprovam. (Hiram Reis)
[4] Haurir:
colher. (Hiram Reis)
[5] Tentâmen: intento.
(Hiram Reis)
[6] Trabalharam
aquelas dedicadas patriotas toda a noite, conseguindo preparar 6.000 cartuchos
para a defesa do dia 28. (JOURDAN, 1893)
[7] Obvia-la:
evita-la. (Hiram Reis)
[8] Aos manes: às
memórias dos antepassados. (Hiram Reis)
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H