Segunda-feira, 24 de julho de 2023 - 18h34
Bagé, 24.07.2023
XXX
A Conquista de um Canhão
Ainda uma vez voltamos ao combate de 3 de novembro de 1867,
para nós fonte perene de onde dimanou a jorros a audácia, o valor e o heroísmo
do Exército Nacional.
Aquele arrojado assalto, que se tornou imediatamente
Batalha, porque nele intervieram todas as armas, todas as Forças de cada campo
e todos os utensílios e acessórios bélicos, é também fonte inesgotável de
episódios gloriosos e sem número, porque nele existiu e tomou parte, desde o
Tenente-General Comandante, até a paupérrima, humilde e fraca mulher do
soldado.
Naquela arena encontrou-se muito
cadáver feminino entre os despojos mortais da vitória. Semelhante luta deixou
muito homem viúvo, ao contrário do que ordinariamente se observa nas guerras em
que a viuvez e sempre partilha do lado feminil. [...] (PIMENTEL)
XLV
Uma Abordagem
Houve e há ainda quem empreste a Francisco Solano López
qualidades militares que o elevam a General, na legítima acepção desta palavra.
Estes inventores de reputações,
porém, eram aqueles que mais longe estavam de compreendê-las, não só por lhes
faltarem qualidades para juízes, como porque nunca
viram um
acampamento
senão pelas descrições dos livros e jornais.
A estes guerreiros platônicos, a que pitorescamente
chamávamos “generais de botequins”, a
estes “discursadores
de boulevards”,
que como certos navegadores só aprendem a conhecer a Barra depois de perdido o
navio, opomos, não só a opinião de todos os chefes da Aliança, como a daqueles
que de perto lhe apreciaram os atos, até que um houve um Ministro Americano –
que o declarou fora da lei da humanidade, e também a narração seguinte que copiamos
fielmente da Ordem do Dia n° 231, do General brasileiro Duque de Caxias.
Verá por aí, o leitor, a vesânia ([1]),
a preocupação constante de nunca modificar sequer plano algum que houvesse
concebido em sua exaltada pretensão a General quando dava uma ordem de combate,
qualquer que ela fosse.
Uma vez preconcebido seu Plano
de Batalha, não havia poder humano que o modificasse mais. Inútil seria,
pois, a mais salutar ponderação que lhe sugerisse o chefe encarregado dela,
disto resultava que dispondo de Forças obedientes e bravas, de chefes de
notória e, digamos mesmo, de audaciosa bravura.
Em nenhuma conta tinha essas
excelentes qualidades de seu valoroso exército, e por isso nunca conseguiu,
apesar desses bons elementos, obter a mais insignificante vitória, a não ser a
da repulsa de Curupaiti, devido só e unicamente à enérgica direção do seu
General Diaz.
Eis o trecho da Ordem do Dia:
O Marechal Comandante-Chefe manda
fazer público às Forças de seu comando que uma brilhante vitória foi alcançada
pelo encouraçado “Barroso” e monitor
“Rio Grande” ancorados em Taí,
pertencente à valente divisão avançada. Sua denodada Guarnição repeliu e
destroçou completamente uma Força Paraguaia, que pelas 11 horas e meia da
noite de 9 do corrente [julho de 1868] ousara abordar aqueles navios. Por um
paraguaio, prisioneiro no combate, foi revelado a S. Exª o Sr. Marquês ([2])
que em S. Fernando, onde López tem seu acampamento, havia-se organizado um
Corpo de 260 praças, de gente escolhida de terra e mar, fazendo instruí-los nos
exercícios de abordagem, com o propósito inabalável de apossar-se dos nossos
encouraçados e que, tendo esse corpo atingido a exigida instrução, fora mandado
passar para o Chaco no dia 9, conduzindo em carretas 20 canoas, a fim de dar um
golpe-de-mão sobre o monitor “Rio Grande”,
que López presumia ser o único fundeado na foz do rio Vermelho.
O comandante dessa expedição,
porém, reconhecendo que em vez de um existiam dois encouraçados fundeados não
no lugar indicado, mas sim nas proximidades de nossas baterias de Taí, participou
a López, ponderando-lhe que julgava impossível a empresa da abordagem, mas que
teve em contestação que cumprisse a ordem, investisse contra os dois navios e
os aprisionasse! ([3])
Efetivamente, pelas onze e meia da noite de 9, vinte canoas
carregadas de gente cercaram de improviso o “Barroso”. Com o brado de – Inimigo!
A postos! – dado pelo oficial de quarto ([4]),
seu intrépido comandante, o Sr. Capitão-de-Fragata Arthur Silveira da Motta,
dispondo a Guarnição de modo a rechaçar o inimigo, mandou romper o fogo de
fuzilaria das portinholas das baterias e da parte superior da casamata, e
metralhá-lo depois que ele teve a audácia de pisar o convés de seu navio,
produzindo grande estrago e desordem entre eles, de modo que nenhum efeito
resultou das granadas de mão, foguetes à Congrève ([5])
, materiais asfixiantes e inflamáveis, com que vinham armados, e lançavam
pelas escotilhas. Quando saía o comandante da casamata para a tolda,
acompanhado do bravo Capitão-Tenente Etchebarne, alguns oficiais e marinheiros
acabavam de destroçar os últimos paraguaios, que se agarravam às canoas
emborcadas; alguns outros, desprendendo-se do costado do navio em uma chalana e
na canoa do comandante, vogaram para o monitor “Rio Grande”, que então já seguia avante, aproximando-se do “Barroso”.
Foi neste momento que se travou uma
desesperada luta entre um grupo de paraguaios, que chegou a abordar o monitor,
e o seu bravo comandante, o Capitão-Tenente Antônio Joaquim, que imprudentemente
saíra ao convés com algumas praças, a fim de repelir a abordagem, do que
resultou ser morto, sendo inúteis os esforços que fez a Guarnição para
encontrar o seu cadáver, tendo sido, entretanto, também aí heroicamente
rechaçada a abordagem com grande perda do inimigo.
Quase simultaneamente o Sr. Brigadeiro João Manoel Menna
Barreto, deu as suas acertadas providências, mandando estender em linha o 40°
Corpo de Voluntários sobre a margem do rio, para, com os seus fogos e os da
metralha dos canhões do Forte, auxiliar os vapores atacados e completar a destruição
do inimigo, tendo sido prisioneiros quatro Tenentes, um Alferes e dezenove
Soldados que escaparam dos navios e procuravam a fuga por terra, asseverando o
mesmo senhor Brigadeiro que poucos seriam os que tiveram a sorte de se salvar.
A não se darem a morte do Capitão-Tenente Antônio Joaquim e
o ferimento grave do Capitão-Tenente Etchebarne, seria a vitória mais completa
que se poderia ambicionar, pois que, excetuando-se estes dois casos, apenas
temos fora de combate dez praças feridas. O grande número de mortos,
prisioneiros, muitas granadas de mão, foguetes à Congrève, matérias inflamáveis
e asfixiantes, espadas, lanças, carabinas, revólveres, remos, croques e doze
canoas, porque, das vinte, seis foram destruídas e apenas duas levadas pelo
inimigo águas abaixo para o Timbó, são os troféus da vitória conquistados pela
Esquadra, que tem sabido sustentar o posto de honra que tão dignamente ocupa.
Segue-se o louvor do Chefe ao
Capitão-de-Fragata Silveira da Motta, ao Capitão-Tenente Etchebarne e ao 2°
Tenente Simplício Gonçalves de Oliveira, que na luta assumiu a direção do “Rio Grande” por morte de Antônio
Joaquim. Tudo isto pareceria fabuloso, se não fora verdadeiro!
O Marechal López mandou atacar dois encouraçados, enviando
contra eles apenas 260 homens em 20 canoas, sujeitos, além disso, ao fogo de
uma forte bateria situada na barranca de Taí e sustentado por cerca de 4.000
homens de infantaria, que por sua vez garantiam a segurança dos navios. Eis o
general que os ignorantes inventaram! (PIMENTEL) (Continua...)
Bibliografia
PIMENTEL,
Joaquim Silvério de Azevedo. Episódios
Militares – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Editor Tipografia a Vapor A. dos
Santos, 1887.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira
(SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] Vesânia: loucura. (Hiram Reis)
[2] Marquês: então Marquês de Caxias, comandante-Chefe. (PIMENTEL)
[3] Como se
dispunha tão facilmente das vidas alheias! É este o caráter de todos os
tiranos. (PIMENTEL)
[4] Quarto:
serviço. (Hiram
Reis)
[5] Foguetes à
Congrève: foguetes incendiários. (Hiram Reis)
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