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Hiram Reis e Silva

Terceira Margem – Parte DLVI - Jornada Pantaneira - A Mídia Pretérita e a Expedição Parte II


Terceira Margem – Parte DLVI - Jornada Pantaneira  - A Mídia Pretérita e a Expedição Parte II - Gente de Opinião

Bagé, 06.03.2023

Diário de S. Paulo, n° 555

São Paulo, SP – Domingo, 23.06.1867

Gazetilha – Mato Grosso

Mato Grosso. ‒ Publicamos em seguida uma parte oficial do Ten Cel em comissão, Antônio Enéas Gustavo Galvão, de data de 20 de abril, sobre a tomada do Posto Militar do Machorra:

CÓPIA. ‒ Quartel do comando do Batalhão 17° de Voluntários da Pátria, acampamento no do Posto Militar do Machorra, 20 de abril de 1867.

Ilm° e Exm° Sr.

Ordenando-me V. Exª que dê uma parte circunstan­ciada da tomada do Posto Militar do denominado Machorra, pelo Batalhão 17° de Voluntários da Pátria de meu comando, que fazia a vanguarda hoje das forças, cumpre-me comunicar a V. Exª que, às 16h30, a vanguarda fazendo-me sinal do inimigo de cavalaria, recebi comunicação do Tenente João Baptista de Souza Vianna que comandara o apoio da mesma vanguarda, de ter avistado no Banco direito uma partida de cavalaria, a qual em pouco tempo se tornou visível para todo o Batalhão, e pela marcha contra o flanco que fazia, parecia querer atacar a vanguarda. Então mandando ordem para que ela marchasse bem junta do Batalhão, ao qual deveria reunir-se no caso de Força superior à que pudesse conter, mandei tocar avançar e um quarto de hora depois o mato estreitando-se apresentava um desfiladeiro no fundo do qual avistamos um córrego, fazendo alto ao Batalhão.

Determinei, então, à guarda avançada que a explorasse, e tendo esta atravessado fazendo fogo de atiradores nos cavaleiros que ousarão se apresentar nos clarões do mesmo, avancei com o Batalhão achando-me em uma vasta campina.

Continuando minha a marcha em colunas de grandes divisões à meia distância, pouco tempo depois o Capitão Enoch Baptista de Figueiredo, Comandante da vanguarda, comunicou-me que no mencionado ponto que já se avistava, distinguia-se em linha de Batalha 60 cavaleiros, mais ou menos.

Determinei que continuasse a avançar, observando a passagem do Córrego e a mata que o bordava ([1]), rompendo de novo o fogo de atiradores em alguns cavaleiros que observavam o Batalhão de mais perto, e retirando-se mandei avançar o Batalhão a marche-marche atravessando o Córrego.

Nesta ocasião observamos que a Força que se achava em linha de Batalha retirava-se a galope sendo de crer que fossem tocando a cavalhada que tinham, pela grande poeira que na frente deles se distinguia. Este ponto ocupando uma pequena elevação, apenas visível em muito pequena distância pelo mato que corta o Córrego, compõe-se de duas linhas paralelas de grandes casas, podendo dar abrigo a 400 praças.

Além disto um curtume, uma grande oficina de correeiros, dois grandes currais e plantações de mandioca, feijão, milho, canas e fumo como tudo deveria ser observado por V. Exª que instantes depois com seu Estado-Maior apresentou-se.

Achavam-se presentes na ocasião da entrada do posto, os Srs. Tenente-coronel Chefe da Comissão de Engenheiros Juvêncio Manoel Cabral de Menezes, que vinha com ordem de V. Exª para que eu não me alongasse, 1° Ten Catão Augusto dos Santos Rocha e 2° Ten Alfredo d’Escragnolle Taunay, membros da referida Comissão, os quais colocando-se ao lado da vanguarda, entusiástica e corajosamente davam vivas ao Batalhão.

Faltaria também a um dever se não manifestasse à V. Exª o bom comportamento que tiveram o Capitão Enoch Baptista de Figueiredo, Tenente João Baptista de Souza Viana, e Alferes ajudante Joaquim Cândido de Vasconcelos, pela firmeza com que se houveram, este na transmissão de ordens, e aqueles no serviço de vanguarda.

Ignorando eles a força com que repentinamente teriam de se encontrar pelas emboscadas que o mato oferecia.

É o que me cumpre comunicar à V. Exª.

Deus guarde à V. Exª – Ilm° e Exm° Sr. Coronel Carlos de Moraes Camisão, Comandante em Chefe destas Forças em Operações.

[Assignado] Antônio Enéas Gustavo Galvão, Tenente-Coronel em Comissão, Comandante. (DSP N° 555)

Jornal do Comércio, n° 213

Rio de Janeiro, RJ – Sexta-feira, 28.07.1867

Gazetilha

Sob o título – Expedição do Mato Grosso ‒ O Correio Paulistano diz o seguinte:

As notícias mais minuciosas que pudemos colher do último desastre ocorrido à Expedição comandada pelo bravo Coronel Camisão, são as seguintes:

Sendo impossível às Forças Brasileiras que haviam ocupado o ponto denominado Bela Vista, abando­nado pelos paraguaios, permanecer ali por falta de víveres, e não encontrando amparo na estrada e Forte de Nioaque, quando se retiraram daquelas paragens foram atacadas pelos paraguaios, que as perseguiram com fuzilaria e artilharia.

A retirada, assim feita debaixo do fogo inimigo, começou no dia 8 de maio, continuando até o dia 11.

Neste último dia, achando-se as forças brasileiras nos campos do “Apa”, resolveram fazer frente ao inimigo, e deu-se então um renhido combate, no qual perderam os paraguaios 70 e tantos homens, e a nossa gente algumas praças do 17° Corpo de Voluntários, que era o que se, achava na frente, e recebeu o choque de toda a cavalaria inimiga. Depois deste encontro, o Coronel Camisão deliberou aban­donar a estrada de Miranda e seguir em direção de uma fazenda, onde, segundo informações de um prático ([2]), devia-se encontrar recursos, ao mesmo passo que se encurtava a viagem. Isto, porém, não aconteceu, como delineara o prático, mal informado.

Devendo gastar neste trajeto apenas 6 dias, a Expedição fez a viagem em 22, sofrendo a perse­guição encarniçada do inimigo, e ainda a fome e o terrível flagelo da cólera ([3]), que a dizimava desastrosamente.

No dia 29 do maio faleceram, vítimas da epidemia, o Comandante das forças Coronel Carlos de Moraes Camisão e o imediato, Tenente-Coronel Juvêncio Manoel Cabral de Menezes. Os oficias Tenentes Taunay e Alferes João Mineiro, que trazem infor­mações de tais ocorrências, deixaram a Expedição no dia 17 de junho, ficando as Forças sob o comando do bravo Major José Thomaz Gonçalves e acampadas na margem esquerda do Aquidauana, onde haviam chegado no dia 11.

Através de tantas e tão aflitivas adversidades, era notável a resignação, sangue-frio e união que mostravam soldados a oficiais.

Consta que entre os muitos mortos lamenta-se a perda do Tenente Fernando Antônio de Araújo Moniz [Paulista] e a do único sacerdote que ainda existia na Expedição, o qual, acompanhando um comboio de víveres, pereceu desastradamente às mãos dos paraguaios. Não se imagine o que sofreu a Expedição, e o que deve estar sofrendo: fome, frio, marchas forçadas, constantes ataques e surpresas dos inimigos, e sobretudo isto o terrível mal da cólera, com as circunstâncias de não haver remédios para os enfermos, ficando os facultativos ([4]) de braços cruzados. Por mais de uma vez viu-se a Expedição constrangida a deixar no caminho os seus doentes e moribundos, por não ter meios de transporte! Houve casos de enlouquecerem soldados em razão do desespero que lhes causavam os sofrimentos! (JC N° 213)

Bibliografia

 

DSP, N° 555. Mato Grosso – Brasil ‒ São Paulo, SP – Diário de S. Paulo, n° 555, 23.06.1867.

 

JC, n° 213. Gazetilha ‒ Brasil – Rio de Janeiro, RJ ‒ Jornal do Comércio, n° 213, 28.07.1867.

 

Solicito Publicação

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

 

Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

E-mail: hiramrsilva@gmail.com.



[1]    Mata que o bordava: vegetação ciliar. (Hiram Reis)

[2]    Prático: Guia Lopes. (Hiram Reis)

[3]    Cólera (Cholera-morbus): infecção intestinal aguda causada pelo Vibrio cholerae, bactéria capaz de produzir uma enterotoxina que causa diarreia. O Vibrio cholerae penetra no organismo humano por ingestão de água ou de alimentos contaminados e se conseguir vencer a acidez do estômago, alcança o intestino delgado onde o meio é alcalino, mul­tiplicando-se intensamente. (CIVES)

[4]    Facultativos: profissionais que exercem a medicina. (Hiram Reis)

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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