Quarta-feira, 10 de maio de 2023 - 11h12
Bagé, 10.05.2023
Alguns cronistas e historiadores, de todas as eras, se preocupam
em atrelar os relatos dos eventos históricos às suas convicções ideológicas,
ressaltar o heroísmo das tropas nacionais, a pusilanimidade dos adversários ou
ainda a autopromoção pessoal comprometendo, com isso, a veracidade dos
acontecimentos.
Depois de apresentarmos a Retirada da Laguna, segundo Taunay,
vamos repercutir a versão paraguaia em que a mídia, sob a égide de um atroz e
onipotente “Déspota Nada Esclarecido”
([1])
forjava os fatos, transformando derrotas em vitórias, manipulando o números de
mortos e prisioneiros nos embates sempre a seu favor e apontando as crueldades
promovidas pelos seus cruéis sequazes como se tivessem sido promovidas pelos
brasileiros.
O crédulo e ignaro povo paraguaio ainda considera como seu maior herói o facinoroso ditador Francisco Solano López que há 150 anos invadiu o Brasil e deflagrou a Guerra do Paraguai (dezembro de 1864 a março de 1870).
Solano López foi convertido ao longo dos anos em uma espécie de
religião cívica, um culto disparatado embora tenha deixado como herança apenas
a derrota e a humilhação. O Paraguai foi destroçado, perdeu partes do seu
território para a Tríplice Aliança e a maioria dos historiadores estimam que ¾
de sua população tenha perecido em combate, de fome ou doenças nos cinco anos
do conflito.
Origem do Conflito
O Paraguai mantinha estreitas relações comerciais com o
Uruguai, pois dependia do seu porto em Montevidéu ao mesmo tempo que
considerava o Brasil e a Argentina como imperialistas. Quando, em outubro de
1864, o Brasil invadiu o Uruguai para afastar do poder o setor “Blanco” radical, estes convenceram o
Solano López de que os brasileiros iriam atentar, mais tarde, contra sua
soberania. O resultado da guerra de curta duração (6 meses) atendia aos
interesses brasileiros e argentinos, porém, Solano López interveio apoiando os
Blancos. Como D Pedro II ignorasse seus protestos o Marechal tomou duas
decisões radicais:
‒ Em
novembro, apreendeu o nau brasileira Marquês de Olinda, que navegava no Rio
Paraguai, nas proximidades de Assunção, rumo a Cuiabá;
‒ Em
dezembro, determinou que o Exército Paraguaio atacasse a Província do Mato
Grosso.
Em abril de
1865, as tropas paraguaias invadem a Província de Corrientes, na Argentina e,
em maio, o Brasil, a Argentina e o Uruguai formam uma coalizão – a Tríplice
Aliança, com o intento de derrubar Solano López.
O Marechal
consegue alcançar algumas vitórias no início da Guerra, mas, em seguida, sofre
uma série de derrotas, vendo-se obrigado, finalmente, a convocar até crianças e
idosos às armas.
As tropas
brasileiras ocuparam Assunção, em janeiro de 1869, e em março de 1870, o “Marechal” foi encontrado nas
Cordilheiras do norte do país e morto na Batalha de Cerro Corá.
A lembrança que
os paraguaios de antanho guardaram de Solano López foi a de um “Déspota Não Esclarecido” que mergulhou o
Paraguai numa desastrosa guerra. Os ditadores paraguaios que o sucederam
construíram, uma nova imagem, a de um valoroso comandante que pelejou
bravamente para defender os interesses de seus compatriotas com o sacrifício de
sua própria vida.
Apesar de se tornar um país democrático em 1989, o culto a López permanece e o povo paraguaio continua acreditando que a independência de seu país estava sendo ameaçada pelo Brasil e pela Argentina.
Taunay lembra
na sua obra que o Tenente João Batista Marques da Cruz achou um exemplar do
Jornal “El Semanario n° 690” em
Curupaití que fazemos questão de reproduzir para ilustrar o que acima
reportamos:
À amizade do nosso infeliz companheiro de armas Marques da Cruz, devemos
este número do jornal paraguaio “O Semanário” de Assunção, achado por ele nas
linhas de Curupaití, em maio de 1868, pouco tempo antes de sua morte, e que
para nos é de mui grande valia, como testemunho contraditório.
Esse espelho tão fiel na sucessão dos fatos quão mentiroso em suas
apreciações, mostra claramente a exatidão de nossa narrativa e a natureza
terrível dos perigos em que se achou a coluna brasileira.
(TAUNAY, 1874)
El Semanario n° 690
Asunción, Paraguay – Sábado, 13.07.1867
La Invasión del Norte
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