Quarta-feira, 17 de maio de 2023 - 06h10
Bagé, 17.05.2023
II
Em 16 de
outubro de 1862 assumiu a presidência da República. Entrava nos planos da
acentuação de sua autoridade ante o mundo civilizado uma grande Guerra. O
Império do Brasil tinha a hegemonia da América do Sul. O Brasil era pois o
inimigo, natural.
Desde os primeiros dias do seu Governo a preocupação da
Guerra o dominou; mandou desde logo construir na Europa 3 encouraçados e
adquirir 50 canhões modernos. Tudo serviria de pretexto.
O “ultimatum” do plenipotenciário brasileiro, Conselheiro Saraiva, ao
Governo da República Oriental do Uruguai motivou do Governo do Marechal López o
protesto de 30.08.1864. Estava lançada a luva, e a 12.11.1864, deu-se o
apresamento, no porto de Assunção, do “Marquês
de Olinda” a cujo bordo seguia o Coronel Carneiro de Campos, novo
Presidente do Mato Grosso que morreu prisioneiro tendo sofrido as mais duras
provações.
Após esse ato de hostilidade
que nenhum princípio autorizava, o Marechal rompeu as relações diplomáticas
com o Império, com fundamento na ocupação por forças imperiais da cidade do
Mello capital do Departamento Oriental de Cerro-Largo, conforme reza a nota do
Ministro de Estrangeiros D. José Bérges ao Sr. Vianna de Lima, plenipotenciário
do Brasil.
Dois dias antes, 10.11.1864,
López havia reunido no acampamento do Cerro Leon os notáveis de Assunção,
entre os quais figuravam os personagens mais importantes da hierarquia civil,
militar o eclesiástica, e submetera à consideração da assembleia, pela última
vez, a grave questão do momento.
Pela undécima vez a seleta
reunião manifestara unanimemente a afirmação de que a Guerra era necessária e
imprescindível.
De entre todos, um homem apenas
conservara-se reservado e silencioso, sem proferir uma palavra, se bem que
houvesse aderido à resolução final da assembleia.
Esse homem era o Ministro das
Relações Exteriores, D. José Bérges, ilustrado cidadão e o personagem de mais
respeito e competência nos negócios do Estado; era dotado de apreciáveis
qualidades pessoais que lhe haviam granjeado a maior consideração no conceito
de todos.
Esse homem ilustre que não se deixara arrastar pela vertigem
sanguinolenta que transviava todos os espíritos nessa época sombria de sua
terra, calava, profundamente comovido, no fundo da alma desolada de patriota, a
certeza do desastrado insucesso da temerária empresa em que a nação ia ser
caprichosa e cegamente empenhada.
D. José Bérges havia sido
plenipotenciário no Rio de Janeiro e conhecia perfeitamente os extraordinários
recursos de que poderia dispor o Império na eventualidade de um conflito
internacional, e não duvidava do resultado inevitável da campanha.
Calou, porém, dentro do peito
tudo o que o conhecimento real das coisas lhe ditava; conhecia tão bem a
tenebrosa situação histórica da sua terra que compreendia que a manifestação
sincera do seu pensamento, a externação franca de seu conselho privaria por
certo a nação de serviços que ele estoicamente considerava que lhe seriam
muito precisos no período difícil em que ela ia entrar, para que os fosse
comprometer sem proveito opondo-se a uma resolução a que fatalmente arrastaria
a desvairada exaltação dos ânimos.
López porém, conhecia o modo
de pensar do seu ilustre Ministro.
E é curioso saber-se agora que
no correr da campanha o ditador processou e fuzilou todos os principais
funcionários que lhe aconselharam a declaração da Guerra e cujos nomes guardava
cuidadosamente em uma lista, não excluindo mesmo seus dois irmãos e cunhados e
o que é mais, o próprio D. José Bérges.
Dissolvida a reunião, López
até alta noite indeciso e preocupado passeou, completamente só pelos sombrios
corredores do Quartel General. Nessas longas horas de tenebrosa meditação a
cabeça febril do Presidente deveria ter sido teatro de uma luta
desesperadamente travada entre a razão serena, calma e vidente e a ambição
impetuosa, sôfrega e desvairada.
Uma circunstância ocasional
determinou talvez a resolução desastrada de López.
A madrugada o veio surpreender
na terrível insônia. O clarim da casa da ordem ressoou estridente e musical,
levando os acordes matutinos ao dormido acampamento. Logo outros clarins
responderam, e outros e outros ainda, e os tambores vieram juntar ao concerto
original o acompanhamento monótono dos seus rufos marciais.
Em pouco, no meio dessa música
desencontrada, que sucedeu ao longo silêncio mortal daquela noite sem fim, o
Corpo de Exército formava-se em frente à casa em que, ignorado, velava o
Presidente e as fanfarras marciais estrugiram em meio dos vivas e aclamações
entusiásticas levantados ao General e que se foram repetindo, como o
desdobramento de um eco fantástico, de Divisão em Divisão, de Corpo em Corpo,
às derradeiras linhas dos últimos Batalhões.
López, nesse momento conteve
com as mãos ambas no peito o coração palpitante. O inesperado espetáculo
acabava de lhe transviar a exaltação ambiciosa. A Guerra estava resolvida. (LANGGAARD
MENESES) (Continua...)
Bibliografia
LANGGAARD MENESES, Rodrigo Octavio de. Homens e Coisas do Paraguai – Solano López e José
Diaz – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Revista Brasileira – Sociedade Revista
Brasileira – Segundo Ano – Tomo VI, 1896.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
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