Sexta-feira, 26 de maio de 2023 - 07h06
Bagé, 26.05.2023
VI
Depois da funesta ação de
Curupaití, quatro meses decorreram sem que nenhum novo ataque fosse tentado de
parte a parte. Apenas a Esquadra Brasileira não cessava os formidáveis
bombardeios, tendo havido dias em que laçou mais de quatro mil projetis sobre
as fortificações paraguaias. O Gen Diaz costumava galhofar desse fogo contínuo,
e, apregoando a inocuidade do divertimento dos brasileiros, afrontava, sentado
nas muralhas das fortificações bombardeadas, a chuva das granadas que caiam por
toda a parte e que ele dizia inofensivas e imprestáveis mesmo para dar lume ao
seu cigarro.
Na manhã de 20.01.1867, em
companhia de alguns ajudantes embarcou o arrogante oficial em uma pequena canoa
e foi pescar no Rio Paraguai nas proximidades de Curupaití que a esquadra
bombardeava. Logo que a canoa foi vista, de bordo de um dos navios brasileiros
rebentou a fumarada de tiro e um projétil enorme explodiu sobre a embarcação
que espedaçou, ferindo gravemente a dois oficiais e arrojando Diaz no meio da
corrente. Salvo pelo seu ordenança José Cuti, foi o General, tendo na perna
direita grave ferimento, levado à sua barraca. López, logo que teve ciência do
desastrado sucesso, fez cercar o amigo de todos os cuidados médicos,
entregando-o ao Dr. Skiner, o melhor cirurgião do país, que procedeu à
amputação da perna ferida.
Logo que se tornou possível foi
Diaz trasladado em carruagem para o Quartel General, em Passo Pucú, onde foi
tratado com especial atenção, aos olhos de López que velava horas inteiras
junto do seu leito.
Duas semanas se passaram na
alternativa da esperança e da dúvida. Ao fim desse tempo porém, graves sintomas
sobrevieram e a morte tornou-se inevitável.
Aos 7 de fevereiro, pediu o
moribundo que o deixassem só com o fiel Cuti, que ainda lhe não havia
abandonado a cabeceira um só instante. Ao velho ordenança comunicou suas
disposições de última vontade, recomendando que no caixão fúnebre colocasse, no
lugar próprio, a perna amputada que havia sido convenientemente embalsamada.
Dadas todas as instruções ao
caboclo, pediu que o vestisse todo com a farda de General e logo que foi
satisfeito esse desejo mandou chamar o Marechal. López compareceu imediatamente
e, alguns minutos depois, Diaz expirava, tendo comunicado ao seu amigo e senhor
que ordenara ao Sargento Cuti que depois dos seus funerais lhe fizesse entrega
da espada que ele ainda trazia à cinta. Havia sido presente de López, após a
batalha de Corrales e ele a tinha desembainhado em 2 e 24 de maio, em Sauce, em
Curupaití. Era tudo o que possuía.
Seu último desejo foi despedir-se do Exército que devia
desfilar ante seu corpo, logo em seguida à sua morte. López porém, contrariou
essa póstuma vontade, com o intuito, talvez, de ocultar o desaparecimento do
prestimoso guerreiro, como sistematicamente costumava fazer em relação aos
mais notáveis sucessos da Campanha.
Às duas horas da madrugada, foi o corpo do General transportado
a ombro até Humaitá, seguindo pelo Rio para Assunção, onde lhe foram feitos os
mais solenes e opulentos funerais que jamais se realizaram naquela terra. Nem
igual os haviam tido o ditador Francia e o presidente Carlos Antonio López.
Conta-se que as Forças Aliadas quando entraram triunfantes
em Assunção, após cinco anos de um pelejar sem tréguas, entregaram-se aos mais
condenáveis excessos, não respeitando mesmo o sagrado retiro em que repousam
os mortos.
O mausoléu que recolhia o corpo do legendário caudilho foi
porém, religiosamente respeitado. A soldadesca embriagada pela vitória, na sua
infrene ([1])
destruição, não ousou tocar no sarcófago do valente inimigo. Posteriormente
porém, esse monumento fúnebre que havia merecido o respeito de adversários
triunfadores, foi profanado irreverentemente pelo próprio governo do Paraguai.
D. Candido Barreiro, quando Presidente, fez abrir o mausoléu
sagrado e nele colocou, junto ao corpo do morto batalhador, o cadáver de
Francisco Lino Cabriza, um sicofanta ([2])...
Rodrigo Octavio (LANGGAARD
MENESES)
Bibliografia
LANGGAARD MENESES, Rodrigo Octavio de. Homens e Coisas do Paraguai – Solano López e José
Diaz – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Revista Brasileira – Sociedade Revista
Brasileira – Segundo Ano – Tomo VI, 1896.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de
Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor
e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Terceira Margem – Parte DXCI
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