Sexta-feira, 2 de dezembro de 2022 - 06h05
Bagé, 02.12.2022
Élisée Reclus, 1900
Da mesma sorte que o Rio Negro, o Branco – antigo Parima tem
por principal nascente um afluente muito mais longo do que o Rio como tal
considerado, porque segue o eixo do vale e percorre a região de passagem entre
as duas vertentes. O Uraricoera, verdadeiro Rio Branco pela extensão e pela
massa d’águas, nasce num Alto Vale granítico da Serra Parima, ao Sul do Machiati,
e, correndo de Oeste para Leste, junta-se, após um curso de 600 quilômetros
pelo menos, com o Rio Tacutu, o qual recebe os arroios do Roraima, os do
Cairrit e a famosa corrente de Pirara que continua para o lado do Essequibo
pelo Rupununi, na Guiana Inglesa. O Mau, também chamado Ireng, afluente do
Tacutu, é famoso pelas suas cachoeiras: uma delas, a Corona, de 50 metros de
altura, é celebrada, com as quedas do Roraima e de Kaieteur, as savanas, depois
penetram nos desfiladeiros da cadeia de granito de maciços desiguais que o
Uaupés e o Rio Negro têm de atravessar na região de sua confluência. O Rio
Branco desce também por uma escala de cachoeiras, impedindo qualquer
comunicação por canoas entre a parte baixa e a parte alta do Rio. (RECLUS)
Castilhos Goycochêa, 1943
Em 1879, foi enviada ao Extremo
Norte para estudar e fazer a demarcação da fronteira do Brasil com a Venezuela
uma comissão, sob a chefia do Tenente-coronel Francisco Xavier Lopes Araújo, a
qual verificou que as nascentes do Rio Cotingo estão no Monte Roraima. Em
princípios do século atual mandou o governo inglês, para precisar os limites da
sua Guiana com a Venezuela, procurar as nascentes desse Rio Cotingo, tendo
confirmado, ponto por ponto as coordenadas encontradas pela Comissão Brasileira
de 1984, tornando-se assim o Monte Roraima o ponto de convergência do Brasil,
Venezuela e Guiana Inglesa. Em 1938 seguiu para esse ponto a Comissão Mista
Brasileiro-britânico-venezuelana, tendo verificado as coordenadas geográficas
obtidas pelas anteriores expedições e aí levantado o marco lindeiro dos três
países.
O estudo do resto da fronteira
com a Venezuela fora iniciado pela expedição mista, brasileiro-venezuelana,
nesse ano de 1879, em obediência ao Tratado de 04.05.1839, fazendo os estudos
geográficos necessários e demarcando a fronteira desde as cabeceiras do Memachi
até o Cerro Cupi e fixando os primeiros marcos. Esses estudos foram continuados
em 1912 a 1915 pela Comissão chefiada pelo Ten-cel Manuel Luís de Melo Nunes.
(GOYCOCHÊA)
Jornal do Comércio, n° 63
Rio de Janeiro, RJ – Terça-feira, 18.12.1962
Gazetilha
Território de Roraima
Por proposta do Deputado Valério
Magalhães, representante do Território de Rio Branco, votou o Congresso
Nacional a mudança do nome dessa unidade administrativa para Roraima. As razões
do projeto eram facilmente compreensíveis; evitar a confusão com a capital do
então Território, hoje Estado do Acre, que também é Rio Branco, em justa
homenagem ao grande Chanceler que para o Brasil resolveu várias e importantes
questões de limites, entre as quais a do Acre, com a Bolívia e o Peru. Entretanto, aquela denominação
havia sido dada, em 1943, em lembrança
do maior dos Rios da região, o Branco, principal
afluente do Negro, que nada tem a ver
com o pequeno Rio Branco, afluente do Paraguai, que deu o título nobiliárquico
ao Visconde do Rio Branco, depois passado ao filho Barão.
Aprovado o projeto, subiu à
aprovação presidencial, mas o Presidente da República, deixando passar o prazo
constitucionalmente fixado para sua sanção ou veto, devolveu-o ao Senado, ao
que se diz por divergirem, a respeito os seus correligionários. Em
consequência sancionou-o o Sr. Rui Palmeira, então na presidência do Senado, e
assim, depois de Guaporé que passou a Rondônia, temos mais urna mudança de nome
de Território: Rio Branco passou a ser Roraima.
[...] pelo menos um dos muitos assessores do Presidente da
República deveria conhecer; é que Monte Roraima
não é nome usado na região dos limites do
Brasil com a Guiana Britânica, e sim “Roraimã”,
conforme apurou a Comissão Mista Brasileira-Britânica, fixadora dessa fronteira, e consta de seu Relatório de 1939.
Consequentemente, por falta do veto promulgada a errônea lei, temos agora um Território Federal com o nome oficialmente
errado em País no qual a ciência geográfica está bem adiantada, mas em que a
vasta assessoria presidencial não se ocupa de temas
culturais
que são, entretanto, de tanta importância para o renome do País. (JC, N° 63)
Jornal do Brasil, n° 55
Rio de Janeiro, RJ – Sexta-feira, 08.03.1963
Roraima a mãe das Águas
Brasil pra seu Governo
[Nonnato Masson]
Por uma lei do Congresso
Nacional, promulgada a 13.12.1962, o Território Federal do Rio Branco, criado a
13.09.1943, com terras desmembradas da parte Setentrional do Estudo do
Amazonas, passou a denominar-se Território de Roraima.
O fato não teve qualquer
repercussão na vida nacional. Os brotos continuaram, despreocupados, nas
areias da Praia do Arpoador; os seringueiros, na Amazônia, mal tomaram
conhecimento do fato; as crianças não deixaram as suas peladas para receber
lições de Roraima; os trabalhadores do Brasil permaneceram firmes, nas
assembleias dos seus sindicatos, tratando das próximas greves; os choferes de
lotação continuaram fazendo misérias no trânsito carioca; Julião prosseguiu
falando mal do Brasil; Celso Furtado, dizendo que o subdesenvolvimento vai
acabar; Brizola, pregando a revolução; os pescadores, apesar dos pesares,
pecando, tranquilos, as suas lagostas, e outra guerra, a do samba, sendo
travada entre as escolas sobre a autenticidade dos Acadêmicos do Salgueiro na
apresentação do seu enredo de carnaval, e etc. etc. etc. Eita País maravilhoso
que muda de regime, torna a mudar, bota mais uma estrela na Bandeira, transforma
Território Federal em Estado, muda nome de Território, descobre novos
acidentes geográficos, enfim, altera a sua Geografia e a sua História, e
ninguém se dá por achado!
O que é Roraima?
Mas, afinal, o que é Roraima,
que já agora dá nome a um pedaço do Brasil?
Para os índios da Amazônia,
Roraima significa a mãe das águas. Na Geografia do Brasil, Roraima é um monte.
Fica na Cordilheira de Paracaimã, que faz parte do Maciço das Guianas.
Tem também o nome de Roraimã.
O Monte Roraima assinala o
encontro das fronteiras Brasil-Venezuela, Brasil-Guiana Inglesa e
Venezuela-Guiana Inglesa.
E o extremo-sul de um grupo de
maciços que se enfileiram ao longo da linha geodésica divisória da Venezuela
com a Guiana Inglesa, desde o Vale do Rio Cameirã, numa extensão de trinta
quilômetros e que fazem a separação das águas que correm para o Orenoco das que
vão para o Rio Mazaruni.
A Muralha do Brasil
Levanta-se o Roraima numa monumental muralha oitocentos
metros acima do seu pedestal e de diábase ([1]) de
2.712 metros sobre o nível do mar, no ponto exato em que foi chamado o marco
trinacional de fronteira [Brasil-Venezuela-Guiana Inglesa]. O alto Roraima,
segundo a Geografia, forma uma colossal mesa de arenito de cerca de quarenta
quilômetros quadrados. Vista de longe, a chapada dá a impressão de uma planície
empedrada e cheia de Lagos, Córregos e pântanos. É, porém, uma enorme
superfície revolta coberta de blocos de arenito de grandes dimensões, de montes
de vinte a trinta metros que se erguem por toda a parte, com aspectos bizarros,
por efeito do vento e da chuva, dando a ideia de edifícios monumentais
arquitetados pela imaginação de um Oscar Niemeyer (???) ou de um Le Corbusier ([2]).
Palhoças do Monte
Várias quedas de água se
precipitam do alto do Roraima e se encontrara, abaixo para formar a Rio
Cotingo. As chamadas escadas do Roraima são habitadas pelas gentes do
Território, em palhoças como a que Ilustra esta página. Entre as raras
Expedições e alpinistas que já escalaram o Roraima alinham-se o viajante inglês
Everard Thuru, em 1884; o geólogo H. I. Perkins, Guelch e senhora, em 1894; a
Comissão de Limites Guiana Inglesa-Venezuela; as Expedições do General Rondon,
de Inspeção de Fronteiras, e a de Mr. Tate, em 1927, e ainda as Comissões
Demarcadoras de Limites do Brasil com a Venezuela e com a Guiana Inglesa, em
1931, e a que recentemente descobriu naquelas bandas o Pico da Neblina.
Foi, mas não é
Até 1932, o Monte Roraima era
considerado o ponto mais Setentrional do Brasil. Nesse ano, porém, após um
levantamento topográfico do divisor de águas dos Rios Branco [que dava nome ao
Território] e Mazaruni, cedeu lugar ao Monte Caburaí, que lhe fica mais 32’, à
Leste e 4’ ao Norte. O Roraima é cercado de montes e serras por todos os lados
Ueiassipu, Apocaila, Iacontipu, Apacaima, Marina, Upaima, Acurima, Aromatipu,
Caburaí, e Serras do Sol, Uaraí, Maribá, Morcego, Piaçuí e Poreiuaca.
A Altura do Roraima
O pico do Roraima, com 2.875 m
de altitude, é o segundo do Brasil. E o ponto culminante da Cordilheira de
Paracaimã. Prolonga-se a série do Roraima formando um platô arenítico, que
toma vários nomes. Sua cumeada é sensivelmente horizontal [como se vê na foto]
e recortada apenas pelos agentes erosivos, e termina, bruscamente, em
colossais e imponentes muralhas rochosas. É de formação, segundo os geólogos,
talvez paleozoica, ou possivelmente triássica. Os sinais que estão no alto da
página são desenhos rupestres, dos muitos que se encontram nas escarpas do Monte
Roraima, que agora, como nome de Território Federal, está definitivamente
integrado na Geografia do Brasil. (JB, N° 55)
Academia Brasileira de Ciências, Vol. 44,
n° 1
Rio de Janeiro, RJ – 1972
Considerações Concernentes à Constituição
Tectônica do Escudo das Guianas com Especial Referência à Formação Roraima
A Formação Roraima
No centro do Escudo das Guianas
elevam-se as montanhas Pacaraima, formadas de arenitos e conglomerados tabulares não
metamorfizados, de idade proterozóica-inferior, constituindo uma
sucessão de platôs cobertos por floresta, sobressaindo cumes isolados como o
Ayangauana [1.900 m] e Roraima [2.770 m]. Os arenitos quartzíticos, quartzitos,
conglomerados, folhelhos e jaspe da Formação Roraima constituem uma sucessão
tabular, notavelmente não perturbada, com espessura de cerca de 2.400 m, que,
julgando-se por seus testemunhos, parece ter coberto perto de 1.200.000 km2
no centro do Escudo das Guianas.
A idade desta Formação tem sido diferentemente estimada como
do Pré-Cambriano tardio, Paleozóico, Triássico e Cretáceo. É, sem dúvida, mais
jovem que 2.000 m.a. ([3]) posto
que sobrepõe os “Younger Granitos”, e
mais antiga que os espessos “sills de
dolerito”, e diques do “Younger Basic
Intrusive Group”. Datações radiométricas nestes últimos, incluindo um “sill” no topo da sucessão, e em mica dos
“hornfels” de contato, forneceram uma
idade em torno de 1.700 m.a. [...] (LOCZY)
O Estado de Mato Grosso, n° 6.639
Mato Grosso, MT – Quarta-feira, 26.09.1973
Roraima não tem Rota Fácil Para Escalada
LONDRES – Não
há uma rota fácil para o “mundo perdido”
do Monte Roraima, segundo o montanhista britânico Don Whillans, depois de
consultas com membros de uma equipe de reconhecimento que esteve explorando a
floresta em volta do misterioso platô, que fica num ponto onde se encontram as
fronteiras do Brasil, Venezuela e Guiana. O reconhecimento foi feito numa
preparação do assalto ao Roraima que deverá ser feito em outubro por uma
Expedição britânica-guianense e da qual o Sr. Don é um dos líderes. A BBC vai
enviar uma equipe filmadora para juntar-se à Expedição, que está sendo
patrocinada pelo jornal londrino “Observer”.
Os expedicionários usarão um novo arnês ([4]) de segurança
para montanhista criado pelo Sr. Whillans para o Himalaia. [...] O líder da
Expedição ao Monte Roraima é o botânico guianense Adrian Thompson, que fez a
viagem de reconhecimento com John Streetly um montanhista britânico que vive em
Trinidad. O grupo se reunirá em Georgetown no início de outubro. O Monte
Roraima inspirou Conan Doyle ao escrever “O
Mundo Perdido”. Quase 3.000 m acima do nível do mar, ele surge da floresta
como uma fortaleza, com penhascos verticais de 600 m de altura. Até agora,
poucas pessoas atingiram o seu topo e não foram trazidos espécimes ou amostras
do local, que se acredita seja extremamente rico em vida animal e vegetal.
[BNS] (OEMG, n° 6.639)
Bibliografia
GOYCOCHÊA, Castilhos. Fronteiras e Fronteiros – Brasil – São Paulo, SP – Companhia
Editora Nacional, 1943.
JB, N° 55. Roraima
a mãe das Águas - Brasil pra seu Governo [Nonnato Masson] – Brasil – Rio de
Janeiro, RJ – Jornal do Brasil, n° 55, 08.03.1963.
JC, N° 63. Gazetilha
- Território de Roraima – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Jornal do Comércio,
n° 63, 18.12.1962.
LOCZY. Considerações
Concernentes à Constituição Tectônica do Escudo das Guianas com Especial
Referência à Formação Roraima – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Academia
Brasileira de Ciências, Vol. 44, n° 1, 1972.
OEMG, n° 6.639. Roraima
não tem Rota Fácil Para Escalada – Brasil – Mato Grosso, MT – O Estado de
Mato Grosso n° 6.639, 26.09.1973.
(*)
Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas,
Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia
Brasileira (SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] Diábase: rocha magmática maciça, granulosa, de cor escura. (Hiram
Reis)
[2] O autor, mais propriamente, deveria ter citado, ao contemplar
aqueles monumentos naturais, forjados pelas mãos inspiradas do Grande Arquiteto
do Universo, o arquiteto espanhol Antoni Gaudí i Cornet ou o uruguaio Carlos
Paéz Vilaró, dignos representantes da arquitetura orgânica. A igreja da Sagrada
Família, e as Casa Batlló e Milá de Gaudi e a Casapueblo, de Vilaró, situada
nas proximidades de Punta del Este, no Sul do Uruguai, são mostras contundentes
do quanto alguns raros arquitetos são capazes de aproximar suas criações da
natureza retratando suas formas harmoniosas. (Hiram Reis)
[3] 2.000 m.a: 2.000 milhões de anos ou 2 bilhões de anos. (Hiram
Reis)
[4] Arnês: espécie de cinto de segurança para a escalada. (Hiram Reis)
Galeria de Imagens
* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H