Segunda-feira, 26 de dezembro de 2022 - 07h10
Bagé, 26.12.2022
O
Liberal, n° 22.237
Belém, PA – 08 de Março de 1989
A ponta
de um Iceberg no
Trópico Úmido da Amazônia
O Deputado Gerson Peres pronunciou, na Câmara dos
Deputados, um discurso em que analisa a potencialidade hidrelétrica da região
amazônica e defende a construção da segunda fase da usina de Tucuruí, assim
como o início das obras da usina de Belo Monte. Eis na íntegra o
pronunciamento:
Penso poder interpretar aqui o
pensamento de milhares de amazônidas. Por isso, ocupo hoje, à tarde a tribuna
desta Casa para deixar marcadas algumas posições com relação ao que vem
ocorrendo naquela grande área. Gostaríamos de merecer a especial atenção dos
nobres colegas do Legislativo, pois, ao que parece, no trópico úmido da
Amazônia brasileira começa a aparecer a ponta de um grande iceberg. [...]
Em recente artigo que escrevi, publicado no dia 25 de
fevereiro, pág. 11 do JB, alertei que a usina de Kararaô, hoje Belo Monte, em
atenção às tribos indígenas do Xingu, postergará pelo menos oito usinas
nucleares.
Àquela altura, sentíamos no ar que a massificação pela
imprensa das “preocupações” internacionais com a terra em que nascemos, transcendia
a prática utilizada pelos países desenvolvidos no sentido de, de alguma
maneira, cercear o desenvolvimento da Amazônia. Aqueles que, como eu, lutaram
pelos direitos dos índios, são as testemunhas que ora invocamos para provar
que não nos move outra atitude que não seja a da preservação do território
indígena e de sua cultura.
Mas a Nação é surpreendida com a sugestão de um
ecologista italiano e de um parlamentar inglês de que deveríamos abandonar a
construção da usina de Belo Monte pela construção de usinas nucleares.
Neste mesmo dia o professor Lutzemberger – ganhador do
prêmio alternativo ao Nobel da Ecologia – aparece nos milhões de televisores
brasileiros informando à Nação de que muitos estrangeiros estariam dispostos a
contribuir para a preservação da Amazônia, adquirindo grandes espaços de sua
floresta.
Assim, caros colegas, em meio a um calor de 38°C
começava a aparecer a ponta de um enorme iceberg, gelado e
frio como a mente daqueles que olham para
o nosso País com a ganância dos que não querem parar de receber US$ 10 bilhões anuais de juros da nossa dívida externa.
Imaginem que até mesmo um heroico ecologista gaúcho,
com a permissão dos nobres colegas do Rio Grande do Sul, teve o desplante de ir
a Santarém denunciar que a Eletronorte teria jogado exatas 18 gramas de dioxina
no lado de Tucuruí e que as crianças do Baixo Tocantins, a partir daí,
nasceriam deformadas.
Disse isto nesta Casa, há anos, desta
mesma tribuna. Sem qualquer outra explicação esse arauto da preservação
ambiental trocou a dioxina pelo agente laranja e apareceu com seu vistoso
chapéu de soldado mercenário das savanas africanas, na reluzente tela do Globo
Repórter, tentando provar o que nunca ocorreu. Hoje, a sociedade é testemunha
de quão vis e vãs foram essas acusações, que visavam a impedir a construção da
maior hidrelétrica do País. Àquela época, como hoje, desta tribuna, cumpro o
inalienável dever, como amazônida, de alertar esta Casa. [...]
Quando da sua construção, nos recordamos
bem, a Eletronorte foi atacada sem piedade e contra ela assacaram toda sorte de
acusações. Os jornais e televisões de todo o mundo davam guarida a um
sem-número de leviandades que não só denegriram a imagem do País como colocaram
em xeque a capacidade da engenharia brasileira, mas, sobretudo, deixaram em
pânico a população da nossa querida Belém. [...]
Como é público e notório nesta Casa,
apoiei, defendi e subscrevi a emenda do nobre senador Jarbas Passarinho, meu
colega do PDS, que hoje se constitui no Capítulo VIII de nossa Carta Magna. Nem
por isso posso deixar de lamentar o desrespeito com que se houveram alguns
representantes presentes ao 1° Encontro dos Povos Indígenas do Xingu em
Altamira com a Eletronorte, na pessoa de um dos seus diretores.
A democracia pressupõe que todos têm
direitos iguais e tanto é assim que o artigo 231, parágrafo 3° da nova
Constituição, remete ao Congresso a decisão pelo aproveitamento de recursos
hídricos, ouvidas as comunidades afetadas.
Portanto, o paradoxo da borduna em uma
das mãos e de uma câmera Super VHS na outra, ainda não disponível nas melhores
redes do País, que foram reveladas pelos noticiários das televisões
brasileiras, não deve surpreender ninguém.
Este verdadeiro “imbróglio” na cultura
dos povos indígenas é o sinal mais cristalino de que, queiramos ou não, todo
ser humano procura seu bem-estar, seu conforto e seu aprimoramento cultural.
[...] Hoje, enceradeiras, rádios, geladeiras, televisores e toda a gama de
eletrodomésticos disponível são encontrados em qualquer lar indígena [...]
E isso é pecado? Os 310 Waimiri e
Atroari, que vivem à beira da BR-174, hoje estão afastados da mesma cerca de 50
km, têm sua reserva de 2.400.000 ha demarcados pela Eletronorte, convênio de 25
anos de integral assistência e navegam pelo Pitinga em barcos de alumínio com
motor de popa de 35 HP. E para demonstrar sua satisfação pela forma com que
agora são tratados pela Eletronorte expulsaram de sua aldeia os Sr. e Srª Emídio
Schwade do CIMI, que por eles nada fizeram.
Srs. Deputados, os jornais brasileiros
acabam de divulgar que o Sr. Bush, sob o manto da ecologia de aluguel, proibiu
que o Japão nos emprestasse dólares para a conclusão da BR-364. Nas boas
intenções ecológicas do Sr. Bush está encoberto outro iceberg que é o acesso
pelo Brasil ao Pacífico via o Peru. Como é do conhecimento desta Casa, a BR-364
atravessa os Estados do Mato Grosso, Rondônia e Acre, todos com imenso
potencial agrícola e com possibilidade de pelo menos duas safras anuais. [...]
Mas aqueles que gozam do privilégio de
receber, só no Governo Sarney, US$ 52 bilhões – metade de nossa dívida externa,
só de juros – fazem de tudo para não perder esse privilégio. A utilização de
inocentes úteis sempre foi expediente utilizado por aqueles que pretendem
continuar a nos dominar. [...] O que não podemos admitir é que interesses
inconfessáveis continuem a manipular nossos índios e a boa-fé da sociedade
brasileira. [...]
A civilização dos nossos dias depende
tanto da energia elétrica quanto do ar, da água e do alimento. Sem ela, não nos
será possível minimizar as disparidades odiosas da distribuição da renda
nacional. Sem ela a comunicação inexiste, posto que nos será impossível
usufruir de sua instantaneidade e diversificação. [...] (O LIBERAL, N° 22.237)
Bibliografia
O Liberal, n° 22.237. A ponta de um Iceberg no Trópico Úmido da Amazônia – Brasil – Belém,
PA – O Liberal, n° 22.237, 08.03.1989.
(*)
Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas,
Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do
Sul (1989)
Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre
(CMPA);
Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx);
Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério
Militar – RS (IDMM – RS);
Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando
Militar do Sul (CMS)
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira
(SAMBRAS);
Membro da Academia de História Militar Terrestre do
Brasil – RS (AHIMTB – RS);
Membro do Instituto de História e Tradições do Rio
Grande do Sul (IHTRGS – RS);
Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia
(ACLER – RO)
Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio
Grande do Sul (AMLERS)
Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra (ADESG).
Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
Bagé, 20.12.2024 Continuando engarupado na memória: Tribuna da Imprensa n° 3.184, Rio, RJSexta-feira, 25.10.1963 Sindicâncias do Sequestro dão e
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H