Domingo, 22 de janeiro de 2012 - 13h46
Ouvi falar a primeira vez sobre a Mãe do Corpo há mais de trinta anos, mas certamente as caboclas da Amazônia sempre conheceram essa senhora e aprenderam a lidar com suas manhas.
Quando dei à luz meu filho, em Porto Velho, fui passar uns dias na casa de minha mãe, no bairro Caiari, pois ali, dizia ela, eu não precisaria preocupar-me com os afazeres domésticos e assim dedicar-me inteiramente aos cuidados com a criança recém-nascida.
Em casa de minha mãe trabalhava, há cerca de vinte anos, Jaci, uma cabocla beiradeira que tinha uns sessenta anos de idade. Era uma pessoa de poucas palavras, mas quando ouvia algum queixume de doença, tratava logo de ensinar um remédio à base de ervas, todas da floresta amazônica, é claro, pois nascera e crescera no meio delas.
Um dia, estávamos na sala de jantar, quando me queixei de um incômodo persistente na região do abdômen, ora do lado esquerdo, ora do lado direito. Era uma sensação estranha, como se o bebê ainda estivesse no ventre. Ao ouvir o relato, Jaci chamou-me até a cozinha e diagnosticou: - O que a senhora sente é a Mãe do Corpo; ela está procurando a criança e não vai sossegar enquanto a senhora não fizer o remédio certo para que ela se acalme.
Achei a observação inusitada e interessante. Aprendi a respeitar o conhecimento da gente que vive na mata amazônica, um conhecimento que é adquirido da natureza, do Cosmos e de seus mistérios. Realmente a sensação era a de que havia algo que me percorria o abdômen. Então deixei que Jaci se encarregasse de resolver a situação. Antes, porém, quis saber mais sobre a Mãe do Corpo.
Filha de parteira, contou-me a cabocla que sua mãe conhecia tudo sobre esse assunto. A mãe corria o Beiradão inteiro, subindo e descendo o Madeira, de canoa, atendendo aos inúmeros chamados que recebia. Fazia o parto e, para evitar que a Mãe do Corpo se manifestasse na barriga da mulher que dera à luz, colocava imediatamente sobre o ventre da parturiente a placenta, enquanto proferia palavras de consolo para a Mãe do Corpo: - Mãe, não fica com raiva não, teu filho tá aqui ó, juntinho de ti. Sente ele, Mãe, bem quentinho na tua barriga, e vai descansar sossegada.
Feito isso, enterrava a placenta e em seguida passava azeite de andiroba sobre o ventre da parturiente, finalizando, assim, o procedimento. Só então podia ir embora tranquila.
No meu caso, dizia ela, uma providência teria que ser tomada imediatamente para acalmar a Mãe do Corpo, uma vez que os médicos jogaram fora a placenta. Que eu tirasse toda a roupa do bebê, recém-nascido, e o colocasse deitado sobre meu ventre nu, deixando que a minha pele e a dele ficassem juntas por meia hora pelo menos.
De cócoras, aos pés da cama em que me fizera reclinar, ela conduziu uma espécie de ritual. Repetiu para a Mãe do Corpo as tais palavras de consolo, como se estivesse conversando com uma entidade. Depois, lambuzou meu abdômen com o abençoado azeite de andiroba.
Após esse dia, nunca mais senti aqueles estranhos sintomas. Vai ver a Mãe do Corpo deve ter mesmo descansado...
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