Domingo, 24 de abril de 2016 - 10h46
No outono da vida, fase atual de minha existência sobre a terra, redescobri o quanto é maravilhoso observar a natureza. Aliás, sempre gostei da proximidade da natureza: bichos, plantas árvores, coisas assim. Mas agora, percebo em mim um ser absolutamente contemplativo das coisas de Deus; talvez isso ocorra pela calma que nos chega com a idade, afinal, não há mais pressa, não há mais correrias, idas e vindas ao trabalho, uma profissão a ser exercida com excelência, uma carreira a ser conquistada e disputada nos embates da vida. Então, no pequeno espaço que constitui o quintal de minha casa, cultivei palmo a palmo uma fruteira ou uma planta, e isso faz o paraíso dos pássaros, minha atual paixão: passo longos momentos a contemplar o ir e vir dos pássaros, quanta beleza! Nada me deixa tão feliz como apreciá-los... Em torno de cinco horas da manhã, o bem-te-vi, soberano, saúda o amanhecer e a liberdade com seu canto inconfundível; logo é seguido por sanhaçus, peitos-roxos, pipiras, mandarins e tantos outros que se achegam ao meu quintal, para minha felicidade.
Para garantir-lhes o conforto, tratei de fazer e espalhar no quintal e no jardim casas de passarinhos, as quais mantenho sempre abastecidas de comida: numas, frutas frescas; noutras, alpistes e sementes: é uma festa! Banquetes de pardais e rolinhas, todos livres, ninhos de sanhaçus pelos quatro cantos do quintal!
No meio do dia, espreito-lhes os hábitos, o que fazem com o sol a pino? Então percebo que não fazem nada, apenas deixam-se estar; pousam à sombra das bananeiras, ou à sombra de um coqueiro, e ali permanecem. Isso me faz lembrar o que Jesus disse a respeito dos pássaros, quando tentava ensinar alguma coisa aos homens; era algo mais ou menos assim: “Olhai os pássaros do céu! Eles voam livremente, sem se preocupar com o que vão comer amanhã!”
Ponho-me a pensar na liberdade e na inocência dos pássaros, que simplesmente vivem, e na angústia humana que é a consciência da finitude, no outono da vida: medo de doenças, de hospitais, medo de perder as pessoas que a gente ama, essas coisas. Então decidi que não quero pensar mais nisso, nem angustiar-me pela consciência de que todos partiremos cedo ou tarde; não! Quero exercitar a liberdade dos pássaros, apenas deixar-me estar nesta vida, à sombra de uma palmeira ou de um pé de jabuticaba: afinal, o outono é uma estação tão bela e fecunda! Viva o outono da vida!
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