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Sandra Castiel

Palácio Presidente Vargas: A Decadência e o Abandono - Por Sandra Castiel



Nasci em Porto Velho. Sou filha de pioneiros, pessoas que aqui chegaram na década de 1940. Meus pais participavam ativamente da vida política do então Território Federal do Guaporé. Naquela época os governadores eram indicados por pessoas ligadas ao Território, pessoas que possuíam bom relacionamento com o poder na capital federal, normalmente quem indicava era o deputado federal.

Cada vez que chegava um novo governador ao Território, a sociedade de Porto Velho estremecia de tanta expectativa; o mesmo ocorria em Guajará Mirim; só existiam esses dois municípios, as demais localidades eram distritos.Palácio Presidente Vargas: A Decadência e o Abandono - Por Sandra Castiel - Gente de Opinião

A posse de cada novo governador era uma festa: o Palácio do Governo engalanava-se; a população comparecia em peso: banda de música, representantes militares, alunos uniformizados, representações de várias entidades, enfim, era um evento marcante e significativo para todos. Muitos e muitos homens idealistas passaram seus dias naquela importante edificação; estamos falando de um prédio monumental e de rica importância histórica.

Idealizado pelo engenheiro civil Joaquim de Araújo Lima, que governou o Território Federal do Guaporé no período de 1948 a 1951, o projeto desta importante edificação (a maior no Território) ficou a cargo do engenheiro civil e arquiteto José Otino de Freitas, pioneiro de Porto Velho, nome de maior expressão na arquitetura e engenharia das obras históricas realizadas nesta terra. A construção ficou sob a responsabilidade da empresa do engenheiro civil Belmiro Galloti, que trouxe de Manaus, além de engenheiros, técnicos e operários devidamente qualificados para a realização do empreendimento, caminhões e os necessários maquinários para executar obra de tão grande porte. De estilo neoclássico (estilo presente nos palácios dos grandes estados do país), muito em voga à época, o Palácio Presidente Vargas possuía originalmente 1 460 metros quadrados. Apesar de ser o idealizador daquela majestosa obra e de haver lançado a pedra fundamental, em 13 de Setembro de 1948, Joaquim de Araújo Lima não acompanhou a construção em decorrência de sua exoneração.

Em 1951, o Governador Petrônio Barcelos (1951/1952) exigiu da empresa Galloti a conclusão da obra e ali instalou a administração governamental, como fora o objetivo do ex-Governador Joaquim de Araújo Lima. Na sequência, vários nomes ilustres, no melhor sentido da palavra (e outros nem tanto), ocuparam o Palácio Presidente Vargas. Todos fizeram história.

Jesus Bulamarque Hosanah (1952/1953)

Ênio dos Santos Pinheiro (1953/1954)

Paulo Nunes Leal (1954/1955)

José Ribamar de Miranda (1955/1956)

(este foi nomeado governador do Território Federal do Guaporé e exonerado quando a denominação do Território mudara para Território Federal de Rondônia, em 1956)

Jaime Araújo dos Santos (1956/1958)

Paulo Nunes Leal (1958/1961)

Abelardo Alvarenga Mafra (1961/1961)

Ênio dos Santos Pinheiro (1961/1962)

Wadih Darwich Zacarias (1962/1963)

Ari Marcos da Silva (1963/1963)

Paulo Eugênio Pinto Guedes (1963/1964)

Abelardo Alvarenga Mafra (1964/1964)

José Manuel Lutz da Cunha e Menezes (1964/1965)

João Carlos dos Santos Mader (1965/1967)

Flávio de Assunpção Cardoso (1967/1967)

José Campedelli (1967/1969)

João Carlos Marques Henriques (1969/1972)

Theodorico Gahyva (1972/1974)

João Carlos Marques Henriques (1974/1975)

Humberto da Silva Guedes (1975/1979)

Jorge Teixeira de Oliveira (1979/1981)

A partir de 1981, o Estado de Rondônia teve oito governadores (até os dias atuais). Destes, apenas dois não ocuparam o Palácio Presidente Vargas.

Jorge Teixeira de Oliveira (1981/1985)

Angelo Angelin (1985/1987)

Jerônimo Garcia de Santana (1987/ 1991) ----------Não ocupou o Palácio

Osvaldo Piana Filho (1991/1994)

Valdir Raupp de Matos (1995/1998)

José de Abreu Bianco (1999/2002)

Ivo Narciso Cassol (2003/ 2006)

Confúcio Aires de Moura

Ao longo do tempo, a população aprendeu a cultivar um sentimento de respeito e até certo sentimento de “posse” com relação ao Palácio Presidente Vargas: era o lugar de onde partiam as decisões que afetariam a vida da população, pois ali ficava o governador. Portanto, local histórico, imponente e da maior importância às pessoas que nasceram aqui ou para cá vieram desenvolver o seu trabalho, abraçaram este rincão como seu e respeitaram a cultura local; enfim, pessoas que têm compromisso com esta terra.

Lamentavelmente, o que temos assistido há algumas décadas é o inverso deste princípio: Rondônia tornou-se uma espécie de terra de ninguém, ou seja, os políticos são eleitos e não têm o menor interesse em estabelecer uma conexão com os valores da terra, com a cultura da terra, com o patrimônio histórico da terra; usam e abusam do poder que exercem para desqualificar, desrespeitar e demonstrar o profundo descaso para com a nossa história, para com a nossa cultura e tudo mais que faz parte de nosso passado, de nossa memória e de tudo que prezamos; sequer as datas de criação e instalação do estado são lembradas devidamente. Isto é inadmissível e inaceitável! Pessoas que desconhecem completamente o passado de Rondônia são nomeadas para cargos importantes no serviço público; uma vez ali, fazem o que é mais conveniente para se manter no cargo, ou seja: nada que resgate, nada que demonstre respeito, nada que preserve, minimamente que seja, nosso patrimônio histórico.

Ponho-me a pensar nas nossas tradicionais edificações: o Fórum Rui Barbosa, edifício neoclássico de rica história, não existe mais, simplesmente demoliram! Houve um tempo em que pintaram o Palácio Presidente Vargas de azul colonial! Uma arquitetura neoclássica pintada como se fosse herança do Brasil colônia! Alguém precisa dizer a essas autoridades que a capital do estado não lhes pertence, pertence sim à população, ao país. Como imprimir cor da preferência seja lá de quem for às edificações históricas, como se estas fossem de propriedade privada ou partidária? Isto demonstra a mais completa ignorância no trato com a coisa pública!

Nas grandes capitais do País, as edificações históricas são mantidas, de acordo com sua arquitetura original: valoriza-se a importância da memória contida ali entre as paredes centenárias e há um cuidado primoroso com documentos que atravessam o tempo. No Rio de Janeiro o Palácio do Governo é mantido há séculos!

Em passado recente, tiraram do Palácio Presidente Vargas sua função e construíram luxuosas instalações para abrigar a estrutura governamental; anunciaram que o Palácio seria doravante um museu. Já vimos este filme! Já tomamos conhecimento de acervos doados amorosamente a pretensos museus que se acabaram em meio ao descaso, mofo e falta de manutenção. Ponho-me a pensar que se o antigo Porto Velho Hotel (edificação do mesmo estilo do Palácio Presidente Vargas) houvesse sido entregue ao estado, fatalmente estaria pichado, servindo de valhacouto para usuários de drogas, até tombar em ruínas. Felizmente a Universidade Federal de Rondônia assumiu aquele prédio e dele faz bom uso.

Infelizmente nosso Palácio Presidente Vargas não teve a mesma sorte; não é segredo para ninguém que usuários de drogas estão ali diariamente: não há manutenção, não há divulgação do acervo abrigado pelo prédio; pelo andar da carruagem, sabemos ou intuímos, pela experiência, o fim dessa história, o fim de uma edificação belíssima e de rica memória, edificação que orgulha os rondonienses. Cabe-nos protestar!

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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