Terça-feira, 20 de julho de 2021 - 10h22
Será
realizado entre os dias 26 a 30 de julho do corrente o VI Encontro
Universitário Internacional sobre Linguagem, Cultura e Sociedade. O Encontro é
promovido pelo Departamento Acadêmico de Ciências da Linguagem-DACL, do Campus
Jorge Vassilakis, da Fundação Universidade Federal de Rondônia (Guajará-Mirim)
e está sendo organizado pelas Professoras Mestres Rosa Maria de Lima Ribeiro e
Janine Félix da Silva. O objetivo do evento é discutir os diferentes modos de
ver a língua, objeto de estudo da linguística, bem como as diferentes vertentes
de estudo da linguagem (linguística e literatura), com trabalhos nas linhas de
pesquisa indigenista, africanista, amazônica, também voltados para a aplicação
pedagógica, constantes no CEPLA: Centro de Pesquisas Linguísticas da Amazônia,
do DACL.
É com
enorme prazer que anuncio estar previsto para o evento em tela o lançamento do
livro “Pequena história colonial e narrativas orais do povo moré da Bolívia”
escrito pela prof. dra. Geralda de Lima Vitor Angenot e por mim. Digo enorme
prazer em razão das circunstâncias que envolveram a produção desse trabalho.
Passo aqui a palavra à dra Geralda Angenot:
“Em
1994 uma equipe de pesquisadores dirigidos por Jean-Pierre Angenot, professor
titular recém-chegado em Guajará-mirim, vindo da Universidade Federal de Santa
Catarina para trabalhar na Universidade Federal de Rondônia, iniciou um estudo
sobre as línguas da família linguística txapacura e criou um grupo de pesquisa
assim como o CEPLA-Centro de Estudos e Pesquisas Linguística da Amazônia. Neste
momento inicial da pesquisa havia dúvidas se ainda existiam falantes da língua
moré. [...] Nesse momento, apresentaram um ancião quase cego pela catarata
chamado Towa Saé Paray, conhecido como dom Manuel e que era considerado na
comunidade como o detentor da memória coletiva da língua e da cultura moré. Ele
era uma pessoa educada, extremamente respeitosa, de uma grande inteligência,
qualidades a que se somava um fantástico e extenso conhecimento de sua cultura.
Tinha muita energia, estava sempre no seu ritmo tranquilo, mas bem-disposto,
sempre fazendo alguma coisa, apesar de ter uma saúde pulmonar frágil em
decorrência de uma tuberculose. Towa Saé Paray veio morar em Guajará-Mirim
(Brasil), na fronteira com Guayaramerin (Bolívia). [...] Possuía grande amor,
respeito e nostalgia das práticas de suas tradições e via a importância de
documentar suas memórias. A sua luta interior consistia em, por um lado, buscar
meios para registrar a sua língua, contos e histórias do seu povo. Acreditava
ser a atitude certa e insistia para contribuir, compartilhando seus
conhecimentos, o que fazia com muito prazer e paciência. De outro lado, a luta
com seus ancestrais em seus sonhos, que para Towa não eram sonhos e sim
realidade. Ele contava que seus antepassados vinham a noite irritados e
brigavam com ele, eles o questionavam e o derrubavam da cama. E eles
perguntavam: -“O que fazes aqui? Por que ensina nossos segredos a esses
brancos? Eles são nossos inimigos. Volte para Monte Azul”. E ele respondia que
não poderia morrer e levar consigo toda cultura tradicional do grupo moré. Que
tinha o dever de passar aos jovens moré, ou a outros que desejassem aprender.
Via-se um conflito interno entre cumprir sua missão como ancião moré de
repassar os conhecimentos recebidos de seus ancestrais e a desobediência a seus
ancestrais que vinham lhe visitar à noite.
Então, foi a pedido de Towa
que começamos a registrar essas narrativas de mitos, contos, lendas, relatos de
vida, etc. Pois não havia, naquele momento, um projeto para trabalhar a
literatura oral moré, apenas registrávamos pensando em documentar e guardar a
memória tradicional do povo moré.”
O indígena moré da Bolívia Towa Saé Paray (dom Manuel) e o linguista belgo-brasileiro Jean-Pierre Angenot, fotografia 1994.
Os fatos acima apresentados transcorreram por volta de 1994.
Há alguns anos atrás a professora Geralda Angenot pediu-se que realizasse um
estudo da trajetória histórica do povo moré, para que os leitores das histórias
de Towa Saé Paray pudessem melhor situar os contos. Então, o trabalho que ora publicamos
é composto de duas partes. A primeira consiste em um estudo sobre a história do
contato dos grupos morés, ou itenez, com a sociedade colonial. O nosso objetivo
foi fornecer ao leitor uma perspectiva histórica da dinâmica secular do contato
desses grupos com o Mundo Colonial, que é socialmente diferente do Mundo Nativo
e que se institui e inicia a expandir-se com a conquista europeia. Tal contato
foi realizado ao longo dos séculos de colonização espanhola na região de Mojos
e Chiquitos. O grupo moré, ao qual pertencia o nosso informante, foi contatado
nos anos de 1930 e submetido inicialmente à administração de um agente do
Estado Nacional Boliviano. Desse contato, graves consequências advieram, de uma
maneira geral com a perda de grande parte do seu modo de viver originário,
costumes e língua.
A segunda parte apresenta as Narrativas orais do povo moré:
mitos, contos, lendas e relatos. Da experiência de décadas em contato com o
colonizador, restaram os resquícios de elementos de sua cultura tradicional,
ainda existentes na memória de alguns de seus membros mais velhos. Vale dizer,
memórias dos seus contos e lendas tradicionais, embora já muito misturados e
“contaminados” pela experiência neocolonial, assim como aquilo que restou de
sua língua original.
Por fim, devo dizer que fico feliz em lançar mais esse
trabalho, duplamente feliz. Primeiro porque é sempre motivo de alegria
compartilhar com o público em geral nossas pesquisas. Segundo por ter ajudado a
realizar o sonho do sr. Towa Saé Paray. Esse livro, constitui-se em mais uma
tentativa de legar à posteridade moré e boliviana, podemos mesmo dizer humana,
porque sempre há algo de universal no particular dos povos, alguns fragmentos
da memória de seu povo nas lembranças de Towa Saé Paray ou dom Manuel. É
também um tributo à sua memória de luta e persistência.
Por fim, brindamos ao leitor com uma das histórias contadas pelo nosso narrador, e publicadas no livro, que trata de como o seu grupo conheceu o trabalho de extração da borracha silvestre.
∞ 3.18. ∞ História de samaa ‘ipwik [samaː ʔipwik˺] : o machadinho para tirar leite da seringa
Antes não existia faca para tirar leite da
seringa, existia só um machadinho que se chamava tom kuti pa ‘ipwik [tom˺ kxuti pa ʔipwik˺] e
o trabalho com a seringa chamava-se pwɨt
kuti pa ‘ipwik [pwɨt˺ kxuti pa ʔipwic˺].
Os morés não sabiam trabalhar na seringa, mas
um dia tiveram que aprender, pois o patrão Leigue queria que cada homem moré
entregasse para ele a cada quinze dias 100 kg de goma de seringa. E se não
entregasse ficaria sem comida. Sendo que a comida era muito ruim como comida para
porcos.
Apesar de que nas terras morés havia muitas
manchas de seringueiras, eles jamais haviam trabalhado com isso, trabalhavam
apenas com a roça, pesca e caça. E ainda mais, com suas machadinhas para colher
seringa não rendia o trabalho nos seringais.
Foram mandados cinco seringueiros para
ensinarem aos moré a tirar leite de seringa e lhes deram facas apropriadas. Aí,
com as facas apropriadas e sabendo como se fazia o trabalho começou a render.
Os velhos e as mulheres trabalhavam na roça e
os homens iam para os seringais.
O dinheiro desses trabalhos os morés jamais
viram.
Um homem chamado Branco Florentino que se casou com uma índia moré se desentendeu com Leigue e o denunciou em Santa Cruz. O que aconteceu dessa denuncia ninguém sabe.
Para aquisição de exemplares em Guajará-Mirim é
só entrar em contato com os organizadores do evento.
Em Porto Velho e demais localidades:
livrosrondoniana@gmail.com
O ensaio que segue foi elaborado para ser apresentado na cerimônia de abertura do Seminário Integrado de Ensino e Pesquisa e a Semana de História –
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