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Sandra Castiel

De mãos dadas


De mãos dadas - Gente de Opinião

O mundo em que nasci não é este que Deus está me permitindo ver e viver. 

Em um mundo analógico, as mudanças eram lentas; as crianças obedeciam às rígidas regras impostas pelos pais, e essas regras eram elos da mesma corrente: os pais transmitiam aos filhos os valores que receberam de seus pais; estes, por sua vez, faziam o mesmo e assim seguia a vida. Acho bonitinho, mas há que se considerar as transformações das sociedades.   

Minha juventude teve um pouco de ousadia, graças a Deus; não muita, porque eu carregava na cabeça um HD com as recomendações da mamãe, do papai, das irmãs, dos vizinhos, das amigas, das colegas, dos professores etc., etc. – Sabe a teoria de Bakhtin, “Em tudo ouço vozes?”, - era mais ou menos isto, no que diz respeito a comportamento, de forma potencializada.

Tornei-me adulta e seletiva: muitas regras caíram (com todo respeito) e, em vez de precisarem de um HD, passaram a caber em um pen drive

Devo admitir que, como pessoa que veio de um outro mundo, eu estranhava alguns novos conceitos; um deles era o de dois homens namorando.

Certa noite, perdi o sono e abri a janela do quarto, às três horas da madrugada. Morava no Rio, em Copacabana, à época, um paraíso; podia-se até caminhar nas ruas sem medo. 

Da janela do meu quarto, no quinto andar, avistei na rua vazia a silhueta de duas pessoas: eram dois homens (ambos de meia idade), andavam em silêncio sob o luar, caminhando devagar, lado a lado, como se aproveitassem a liberdade daquele momento: estavam de mãos dadas. As mãos não se soltaram, até onde meus olhos puderam segui- los; havia algo de mágico entre aqueles homens, um precisava d’outro, pude sentir essa energia.

Fiquei comovida.  Àquela madrugada longínqua, aprendi que o amor não obedece regras. 

Achei lindo.  

Sandra Castiel sandracastiell@gmail.com 

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